Opinião

O mau cheiro da revolta árabe

 

Que os povos do Magrebe e do Médio Oriente sofrem há décadas a repressão das ditaduras que lhes foram impostas, pouca gente tem dúvidas. Mas como surgiram estas revoltas que se lhes opõem de forma tão generalizada? De geração espontânea? No tempo em que nós e os coelhos nascíamos com olhos fechados, era possível acreditar neste milagre da multiplicação das boas vontades e do súbito alvor democrático, como se, por magia, todos acordássemos ao mesmo tempo e na mesma almofada. Hoje, tudo tem uma explicação mais terrena e mais objectiva; ficaram para trás a coincidência e outros fenómenos inexplicáveis. Cheira demasiado a petróleo para a CIA, a MOSSAD e outras alcateias não terem tido o faro activo em toda aquela zona. Os Americanos do norte e o seu nobilizado presidente saltaram do quintal para a rua e brincam com o fogo em quintal alheio. Com ou sem Obama, os EU continuam a ser os EU. Desenganem-se aqueles que sonham que a estratégia mudou só porque o presidente americano come hamburgers no meio da rua. Nada de inédito. Afinal, fizeram o mesmo em Portugal, em Abril de 74, no lado oposto e na Europa de leste nos anos oitenta, com outro cheiro. Depois da viciação da guerra civil Líbia, como se se tratasse dum jogo de play station, colocam este lindo serviço nas mãos da Europa adulterada que, submissa, finge não aceitar, desejosa também de molhar a sopa, ao cheiro do petróleo.

É claro que tudo é legal, democrático e devidamente avalizado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, o que significa o mesmo que ter uma maçã podre mas com o selo de garantia.

Os meios de comunicação, especialmente as televisões, fazem-nos chegar imagens dos avanços e recuos de uns e de outros. É curioso que só os "rebeldes" e a aviação invasora matam, com precisão cirúrgica, soldados de Tripoli, excepto a chacina recente. Estes, em contrapartida, por mais pontaria que tenham, fazem diariamente autênticas chacinas entre a população civil, a que os repórteres acrescentam mulheres e crianças. Mulheres e crianças que fugiram e já não habitam nas grandes cidades, dizem na notícia seguinte. Na mouche!

É neste quadro que se movimenta o polícia do mundo e como polícia actua indiscriminadamente na rua, na praça nos lugares mais humildes e já mais no conselho de administração duma empresa corrupta, cujos administradores levam à miséria dezenas ou centenas de trabalhadores.

E nós, atentos espectadores, bombardeados, por enquanto, apenas com (más) notícias, estamos tranquilos porque a guerra é longe, felizmente. Chegará o dia em que, como diz o poema de Brecht, Agora estão-me levando/
Mas já é tarde. /Como eu não me importei com ninguém/Ninguém se importa comigo.

Depois? Depois, tudo ficará como até aqui, as democracias emergentes voltarão a ter o aval norte-americano e Israel ficará eternamente agradecido ao seu incondicional amigo e capaz de reforçar a sua política expansionista naquela zona do globo. A menos que, cheira-me, os povos árabes tomem verdadeiramente o destino em suas próprias mãos e promovam de vez a paz, o bem-estar social e o progresso de tão martirizados seres humanos.

 
 
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