Editorial
O amanhã pode ser hoje
Num curioso texto escrito em 1939, e
dado à estampa por Harol Benjamin no já ido ano de 1977, relata-se
a história de uma tribo pré-histórica que decidiu introduzir a
educação sistemática para as suas crianças. O currículo fora
elaborado especificamente para ir ao encontro de necessidades
particulares de sobrevivência no meio local e, por isso, incluía
matérias como "Afugentar o Tigre de Dentes de Sabre com o
Fogo".
Porém, o clima da região mudou e os tigres de dentes de sabre
morreram. Em sua substituição surgiram "Grandes Ursos Ferozes" que
não tinham medo do fogo e não se deixavam caçar ou afugentar com a
velha técnica aprendida na escola: a técnica de "Afugentar o Tigre
de Dentes de Sabre com o Fogo".
A comunidade estava agora numa situação muito difícil. Não havia
carne para a alimentação nem qualquer segurança contra a morte que
se passeava pelos caminhos de dia e de noite. Tinham de fazer,
imediatamente, uma adaptação a esta preocupante situação se não
quisessem caminhar para a sua própria extinção. Felizmente na tribo
ainda havia homens de cepa...
A partir daí, um deles, com o estômago colado às costas, quedou-se
pensativamente junto ao fogo no intuito de inventar novas destrezas
que pudessem ser divulgadas a partir da escola.
Todavia, sem perceber muito bem porquê, as tentativas de mudar o
currículo, por parte desse membro mais "esclarecido" da tribo, por
forma a adaptá-lo às novas necessidades de sobrevivência,
encontravam firme resistência por parte do conselho dos mais velhos
e, supostamente, mais sábios, que defendiam a "intemporalidade da
educação e dos conteúdos curriculares" ministrados pela
escola.
E por mais que esse membro inovador da tribo, enquanto os outros se
atafulhavam de comida e dormiam, ganhasse o hábito de se levantar
mais cedo e de pensar junto do fogo, de pouco lhe valia esse
esforço que o levava a tentar mudar as mentalidades e o currículo,
para que a tribo voltasse aos bons e velhos tempos da
abundância.
Mesmo assim, pouco a pouco, foi elaborando um novo currículo,
adaptado às novas circunstâncias. Só que, a partir desse instante,
a partir da descoberta desse progresso, a partir do momento em que
iniciou a sua divulgação tornou--se, face aos olhos dos mais
conservadores... num homem muito perigoso!
Metáfora preciosa, o texto de Harold Benjamin obriga-nos a relançar
a reflexão sobre os obstáculos que se deparam e a que estão
sujeitos todos aqueles que tentem enveredar pelos caminhos da
inovação e da renovação, que outros não são, aliás, os que todos
deveríamos tentar percorrer no decurso da nossa vida
profissional.
E, ao salientar o papel das "minorias" na renovação dos processos e
dos procedimentos educativos, e o modo como as "maiorias" suspeitam
das suas propostas e inibem as suas práticas é, em nosso entender,
um modo relevante de relançar o debate sobre o eterno renascer do
novo e a necessidade da permanente adaptação e da mudança.