Bocas do Galinheiro
Robert Redford: One Man Show
Várias vezes usamos esta coluna para lembrar
grandes actores. Quase sempre a propósito da sua morte recente.
Hoje não vai ser esse o tom. Hoje reservamos espaço para falar de
uma das lendas vivas da sétima arte: Robert Redford. Vem tal a
propósito da recente passagem do actor por Cannes e da apresentação
do último filme que protagonizou, aliás, em que é o único: "All is
Lost".
A propósito respigamos aqui o que
João Lopes escreveu no DN sobre a fita:
"A provar que alguns filmes mais ou
menos "secundarizados" poderiam estar na corrida para a Palma de
Ouro, foi um título extracompetição a destacar-se na programação de
quarta-feira. Chama-se All Is Lost e trata-se da nova realização de
J. C. Chandor, cineasta que se estreou há apenas dois anos com
Margin Call- O Dia Antes do Fim, um filme sobre a crise económica
de 2008. O mínimo que se pode dizer de All Is Lost (à letra: "Está
Tudo Perdido") é que não é todos os dias que deparamos com um filme
cujo elenco tem apenas... um nome! É ele Robert Redford (76 anos),
por certo num dos desafios mais radicais de toda a sua longa e
brilhante carreira", para acrescentar que "Redford interpreta uma
personagem de que nada sabemos, a não ser aquilo que deduzimos da
cena de abertura: anda sozinho, algures no alto-mar, e o seu barco
foi abalroado por um contentor à deriva. A partir daí, entramos
numa espantosa odisseia de sobrevivência que Chandor encena também
como uma tragédia da mais pura solidão. All Is Lost resulta de uma
complexa e sofisticada produção, já que, como se pode imaginar, não
é simples encenar uma experiência deste género tendo como cenário
único a grandeza do oceano." E, a finalizar "em todo o caso, não se
pode dizer que seja um filme de ostentação técnica. Bem pelo
contrário: Chandor concentra-se na representação de Redford,
emprestando ao seu filme uma subtil e contagiante dimensão humana
(quase irónica, já que as palavras ditas pela personagem se contam
pelos dedos de uma mão). Rezam as crónicas que o projeto teve a sua
origem no encontro de Chandor e Redford no Festival de Sundance
(criado por Redford), precisamente em 2011, quando O Dia Antes do
Fim aí foi apresentado. Num tempo de tantas aventuras de
"super-heróis" e efeitos especiais, All Is Lost distingue-se pelo
seu gosto muito clássico da aventura."
Pela forma como a sua interpretação
e ele próprio foram recebidos e ovacionados em Cannes, resta-nos
esperar lá para Outubro, data da estreia nos Estados Unidos, pela
chegada desta grande interpretação a Portugal.
Segundo consta, uma das suas
melhores, o que não nos espanta, tantas e tão grandes foram as
passagens de Redford pelo grande écran. Mas é obra, concentrar em
si todas as emoções, numa situação extrema de desespero e
sobrevivência em alto mar, como a que enfrenta desta vez. E, agora,
começávamos a elencar os portentosas fitas que protagonizou, cujo
fim não conseguiríamos alcançar nesta limitada coluna. Mas
escolhemos algumas. Desde logo uma ao lado de outro monstro da
sétima arte, de que já aqui falámos, Paul Newman, "Butch Cassidy
and the Sundeance Kid" (Dois Homens e um Destino, 1969), de o papel
que o guindou para o estrelato, depois de fugazes aparições em
filmes de menor êxito (estreou-se no cinema em "War Hunt", de Denis
Sanders, 1962, ambientado na Guerra da Coreia) e nalgumas séries
televisivas, reincidindo ambos em "The Sting" (A Golpada, 1973),
ambos de George Roy Hill.
Ao lado de outro grande actor,
felizmente dos ainda vivos, Dustin Hoffman, dá vida ao jornalista
do Washington Post, Bob Woodward que, juntamente com o seu colega
Carl Bernstein, iniciaram uma investigação jornalística sobre
aquele que ficou conhecido pelo Caso Watergate, um episódio,
aparentemente menor, de espionagem dos republicanos no
quartel-general dos democratas nas eleições presidenciais de 1972,
investigação que levou à queda do presidente Richard Nixon. Afinal
o peixe era graúdo e o filme de Alan J. Pakula "All the President's
Men (Os Homens do Presidente, 1972), esteve à altura da trama. Em
1965 aparece ao lado de Natalie Wood em "Inside Daisy Clover" (O
Estranho Mundo de Daisy Clover), de Robert Mulligan, voltando os
dois a contracenar sob a direcção de Sydney Pollack, realizador com
o qual fez sete filmes, em "This Property Is Condemned" (Flor à
Beira do Pântano).
Aliás as companhias femininas são
uma constante nos filmes de Redford, desde logo Jane Fonda, com
quem partilhou cenário em "Barefoot in the Park" (Descalços no
Parque,1967), de Gene Saks, "The Chase" (Perseguição Impiedosa ,
1966), de Arthur Penn e "The Electric Horseman"(O Cowboy
Eléctrico,1979), de Sydney Pollack, e mais recentemente Meryl
Streep, de novo sob a batuta de Pollack em "Out of Africa" (África
Minha, 1985) e mais recentemente, numa realização sua, "Lions for
Lambs" (Peões em Jogo, 2007). Noutro filme de Pollack, "Jeremiah
Johnson" (As Brancas Montanhas da Morte, 1972), assinou, para mim,
uma das suas melhores interpretações, fruto também da grande
cumplicidade entre os dois. Aliás Robert Redford também usou a sua
experiência e sensibilidade para se envolver na realização, com
destaque para, "Ordinary People" (Gente Vulgar,1980) que lhe valeu,
logo na estreia o Oscar, como melhor filme e melhor realizador!
Aliás com "Quiz Show", de 1974, um filme à volta dos concursos
televisivos e a batota por trás deles, voltou a ser nomeado para
melhor realizador.
Destaque para os seus últimos
filmes, reflexo da sua faceta de activista político e
cinematográfico, por detrás do Festival de Sundance, pilar do
cinema independente, como "The Conspirator" (A Conspiradora, 2010),
à volta de Mary Surratt, a única mulher presa a seguir ao atentado
que vitimou Lincoln, e "The Company You Keep" (Regra de Silêncio,
2012), ou a história de um antigo activista cuja identidade é
descoberta por um jornalista.
Resumir a carreira de Robert
Redford, já sabíamos, era tarefa difícil. Confirmou-se.
Até à próxima e bons filmes!