Bocas do Galinheiro
Michael Kidd, acima de tudo um Coreógrafo
Michael Kidd tem o seu lugar na história
do cinema como um dos grandes coreógrafos. Principalmente pelas
novas conceções do bailado no cinema, essencialmente através de uma
ligação estreita entre a dança e a ginástica, de que resultaram
números vigorosos e enérgicos, mas plenos de harmonia e beleza em
filmes e números como o da construção do celeiro, Barnrousing
Ballet, seguramente o mais famoso do filme "Seven Brides for Seven
Brothers" (Sete Noivas para Sete Irmãos, 1954), de Stanley Donen,
Crafgame Number, de "Guys and Dolls" (Eles e Elas, 1955), de Joseph
L. Mankiewicz, com Marlon Brando, Jean Simmons e Frank Sinatra, um
elenco de luxo, ou Footsteps on Broadway, do mesmo filme, que Kidd
considerou a sua obra prima e o filme onde teve mais poder, talvez
devido ao facto de ser o primeiro musical de Mankiewicz, ao
contrário de outros, Donen, por exemplo, com quem teve algumas
dificuldades de relacionamento, porque Kidd achava que não deveria
haver números de dança nas "Sete Noivas…", mas depois de ter
assinado o contrato, Donen ter-lhe-á dito, uma vez que já contamos
contigo, haverá dança, ao que Kidd respondeu que nunca se sentira
tão atraiçoado por um amigo. Nem mais.
Por estas e por outras, é claro que
Kidd ligou o seu nome aos melhores musicais. Para além dos já
citados, podemos lembrar "The Band Wagon" (A Roda da Fortuna,
1953), de Vincente Minelli, ele que se estreou a coreografar para o
cinema em 1952 em "Where's Charley", de David Butler, tendo ainda
no seu activo filmes como "Knock on Wood" (Que o Diabo Seja Surdo,
1954), de Melvin Frank e Norman Panama, bem como "Hello Dolly", de
1969, realizado por Gene Kelly ou "Star", 1968, de Robert Wise.
Nascido em 1915 em Brooklyn, Nova
Iorque, Michael Kidd, de seu verdadeiro nome Milton Greenwald,
estreou-se na Broadway em 1947 coreografando "Finian's Rainbow" que
lhe valeu o primeiro de cinco Tony que ganhou. Foi também ator e
bailarino em "It's Always Fair Weather", (Dançando nas Nuvens,
1955), de Gene Kelly e Stanley Donen, onde aparece numa memorável
cena de dança com Kelly e Dan Dailey, em que os três têm tampas de
caixotes de lixo atadas aos pés.
"Merry Andrew" (Viva o Palhaço,
1958), foi o único filme que dirigiu. O filme foi um falhanço e só
esporadicamente voltou a colaborar com o cinema, tendo continuado a
sua gloriosa carreira de coreógrafo no teatro e no ballet, Mas será
que "Merry Andrew" foi assim tão mau? Pensamos que não. É evidente
que não ocupa um lugar de destaque na história do musical. Como
outros em que entrou, é um filme que vale essencialmente pela
presença de Danny Kaye, actor de múltiplos atributos e que nem
sempre mereceu as honras da crítica mas que teve papéis de grande
nível, alguns inolvidáveis, como em "Christian Andersen", 1952, de
Charles Vidor, um biopic sobre o grande escritor dinamarquês, "The
Court Jester" (O Bobo da Corte, 1955), de Melvin Frank e Norman
Panama, "A Song is Born", (O Professor de Música, 1948), de Howard
Hawks, "On The Riviera" (Escândalos na Riviera, 1951), de Walter
Lang, bem como "Wonder Man (O Super Homem, 1945), de Bruce
Humberstone, onde inicia o papel arquétipo da sua carreira, o
desdobramento de personagens, que vai até ao Bobo da Corte e que
passa pelo super "The Secret Life of Walter Mitty" (O Homem das
Sete Vidas, 1947), de Norman Z. McLeod, talvez o melhor filme de
Danny Kaye.
Em "Merry Andrew" ele é o professor
e arqueólogo bem disposto e com métodos pedagógicos avançados,
cujos exemplos se dão bem com uma boa canção ou uma bela dança,
antípodas do conservadorismo da escola e do director, por acaso o
seu pai, até que um dia uma escavação o leva ao contacto com o
circo onde, por circunstâncias do acaso, se vê obrigado a dançar, a
cantar, a fazer rir, afinal aquilo de que ele gostava mesmo. E,
last but not the least, encontra o amor, o verdadeiro, de romance,
com a belíssima Pier Angeli, a actriz italiana descoberta por
Léonide Moguy com quem faz "Amanhã Será Tarde", de 1950 e "Amanhã
Será Outro Dia", em 1951. Nascida em 1932, Anna Maria Pierangeli
parte para Hollywood onde é rebatizada Pier Angeli. Lançada em 1951
com "Teresa", de Fred Zinnemann, a história de uma jovem italiana
que se apaixona e casa com um soldado americano durante a guerra. O
seu idílio com James Dean será mais lembrado do que os filmes em
que participou como "Marcado pelo Ódio" (1956), de Robert Wise,
excelente fita sobre o universo do boxe onde contracena com Paul
Newman, ou "Sodoma e Gamorra" (1962), de Robert Aldrich. Nos anos
60 do século passado ainda apareceu nalgumas produções
internacionais de grande mediocridade, vindo a morrer em 1971, com
uma overdose de barbitúricos, em Berverley Hills, um trágico fim,
comparado com a alegria que alardeou em "Merry Andrew". Vistas bem
as coisas, o filme de Michael Kidd vale acima de tudo pelos atores,
ela, e principalmente Danny Kaye, intérprete de luxo num filme que
sem ele teria bem menos importância. Quanto ao realizador, será
para sempre um dos grandes coreógrafos do grande écran.
Até à próxima e bons filmes!