Opinião

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Para onde vamos?

João de Sousa TeixeiraAbandonaram a casa e os haveres a conselho do anjo que lhes falou dos perigos de ali ficarem. Aquele que era sábio por conta doutro, que tudo sabia da verdade e da mentira e podia dispor dos homens e das coisas, porque em verdade estava escrito e era também esse o seu desejo, apontou-lhes uma zona de conforto, fora dali; tão longe que não causassem moléstia e a génese pudesse enfim ser acautelada per omnia secula seculorum e, como já se disse, estava escrito, o que fazia toda a diferença.

Fizeram-se ao caminho. O anjo não mais se importou com o seu itinerário. Tinha o mandato para cumprir e isso era tudo. O importante agora era que se afastassem o mais possível, fizessem pela vida e, se acaso fosse pródiga a labuta, poderiam então regressar abastados, servidos de criados e arautos que ao mundo dessem notícia do sucesso da diáspora.

Longe demais para aqui dar fé, outros havia com o mesmo destino, escorraçados do seu lugar de nascimento, para cumprirem os desígnios consagrados no que estava escrito. Mais se soube que houve os que, como cães, haveriam de regressar e lamber os pés ao dono. Mas eram cães, não mais que isso. Não há história por esse lado da zoologia.

Na Terra, que o céu era testemunha, os tempos eram de abundância e rapina para os poderosos e de penúria para os povos. Por isso, onde fossem encontrar duas paredes erguidas seria a sua casa e assim lhe chamariam para que outros atrás não viessem reclamar a posse miserável do lugar.

Passaram anos e dias de profecias e outras vozes efémeras. O tempo de ouro, incenso e mirra foi naquela quadra, dizem que por efabulação e critérios de aliciamento, a que os tempos modernos haveriam de chamar ordenado mínimo ou outro qualquer eufemismo.

Em todas as efemérides haveriam os povos de ter tal notícia como um massacre, como um número premiado em sorteio que sai apenas aos outros, nunca se conhecendo o sujeito de tal sorte ou perverso milagre.

Naquele tempo, tudo seria cumprido conforme as leis da trindade que as impunha, sem apelo nem sombra de dúvida, mesmo que esta existisse, porque era assim que deveria ser, qual mandamento sagrado e, como repetidamente se vem anunciando, estava escrito.

Foi por isso na dependência de outros exploradores e de outras línguas da mesma exploração, que do estábulo frio e estrangeiro foram integrar a força de trabalho que, como a tantos outros, de conforto não foi jamais e do futuro prometido só a memória dos jejuns, a crença em que melhores dias estariam para chegar e a morte prematura.

Estava escrito, repito, mas mais depressa se rasga um texto ignaro, que uma palavra sã adoce tanta desventura.

 
 
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