Opinião

“Pedagogia (a)crítica no Superior” (XVIII)
Do CTeSP ao doutoramento

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«o professor universitário é uma espécie de fóssil, um bruto que estacou, firme como rocha, nos conhecimentos enfardelados, à pressa, para o exame de doutoramento.»
(Vergílio Ferreira, O Caminho Fica Longe)
Este ano, o Prof.S. viu a carga horária aumentar nos CTeSP (que acrónimo mais desconchavado, verdadeiramente impronunciável!) leccionando duas turmas de 1º ano dos ditos cursos técnicos superiores profissionais. A criação (polémica) destes cursos, 'recuperando' a ideia do «ensino superior de curta duração» (como era denominado em 1977), teve a ver com dois objectivos estratégicos dos últimos Governos: (i) aumentar, num ápice, o número de jovens no ensino superior melhorando os nossos baixos índices de formação nesse nível de ensino (a Estratégia Europa 2020 exige que, pelo menos, 40% de adultos entre os 30 e 34 anos tenham completado o ensino superior ou equivalente); e, ao mesmo tempo, (ii) salvar as instituições politécnicas do colapso (em especial as do interior) por falta de candidatos no concurso geral de acesso (bem notório na 1ª fase de colocações). A rede do nosso Sistema de Ensino Superior (SES) encontra-se profundamente dissimétrica e, mais grave ainda, sofre de 'abastecimento' a montante: (1) a demografia do país, uma das mais envelhecidas do mundo, é preocupante (em 2015, os saldos natural e migratório continuaram negativos: 23.011 e 10.481 respectivamente); (2) as quebras no ensino secundário são escandalosas, como o revela um recente estudo da DGEEC, em especial da parte dos alunos que frequentam os cursos profissionais (dos 22.845 que o terminaram só 16% se matricularam no superior!) Muitos institutos politécnicos (seguindo a lógica da tutela) enveredaram por este tipo de formação curta (dois anos com o 4º semestre dedicado em exclusivo ao estágio) pensando que iriam acolher 'clientes' dessas populações mas, neste ano lectivo, os matriculados nos CTeSP rondam os 7400. Estes cursos sofrem de um triplo 'pecado original': a) não conferem grau (podia-se ter recuperado a denominação 'bacharelato') e são percepcionados como uma via transitória (para a licenciatura) e não terminal (entrada no mercado de trabalho); b) facilitação no acesso, ao possibilitar a matrícula a alunos sem o 12º ano concluído (as últimas alterações legais apontam para um acréscimo de exigência na entrada); c) acentuou, e de que maneira, a diferenciação entre universidade e politécnico.
A Declaração de Bolonha, de 1999, pretendeu «uniformizar o sistema de ensino superior» no espaço comum europeu. Ficar cada vez mais igual aos outros era na época (como hoje) um objectivo central, também no domínio educativo. Tal documento provocaria um enorme abanão em toda a estrutura do SES. Os quatro graus académicos - bacharel, licenciado, mestre e doutor (depois de, em 1986, ter acabado com o ensino médio, a LBSE, na segunda revisão em 2005, enterrara de vez o bacharelato) - passaram a ser organizados em dois ciclos. Assistiu-se então a uma azáfama de reengenharia curricular e a generalidade dos cursos encolheu em anos (na prática, o bacharelato transformou-se em licenciatura com a redução de cinco para três anos), aligeirou-se a formação e a exigência (mestrados houve realizados num único ano incluindo a elaboração já não da tese mas de um 'relatório de estágio').
O então ministro da educação Augusto Santos Silva (de volta, agora como nº 2 do Governo) justificou as mudanças «pela necessidade que Portugal tem de generalizar o acesso a mestrados e doutoramentos como uma qualificação natural» (DN, 26/4/01, p. 23). E assim, os Presidentes dos Conselhos Gerais e dos Institutos Politécnicos - depois dos balões de ensaio do Instituto Universitário de Viseu (que chegou a originar o 'dia de luto', em 14 de Março 2001) e da 'Universidade Politécnica' que o IP de Castelo Branco chegou a propor - preparam-se agora para o duplo embate, aproveitando o (débil) contexto da 'geringonça': reivindicam a possibilidade de outorgar o grau de doutor e reclamam a denominação 'atractiva' (University of Applied Science), livrando-se, de vez, dessa excludente designação (Politécnico) que tem, segundo eles, limitado o crescimento e a concorrência, em pé de igualdade, com o outro subsector do ensino superior. A sequência lógica desta pretensão, de acordo com o divertido Inimigo Público (9/12/16, p. 4) é óbvia: «Tunas académicas dos politécnicos que exigem chamar-se 'universidades' querem passar-se a chamar-se 'orquestras sinfónicas'».
Não queimem etapas! A história de vida das escolas politécnicas não tem mais de três décadas; ou seja, vai ainda na meninice institucional, em particular nos domínios da investigação, produção editorial e internacionalização.

 

Luís Souta
(Este texto está redigido segundo a “antiga” e identitária ortografia)
luis.souta@ese.ips.pt
 
 
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