Políticas para o ensino superior no interior do país
Não há ensino superior a mais
"As instituições de ensino superior do interior do
país constituem uma enorme oportunidade". As palavras são do
Secretário de Estado do Ensino Superior, José Ferreira Gomes. O
governante falava durante o debate promovido pelo Sindicato
Nacional de Ensino Superior (SNESup), em Castelo Branco, numa
iniciativa onde intervieram os responsáveis pelos politécnicos e
universidades do interior do país, organizada pelo docente João
Leitão, e que foi moderada pelo diretor do Ensino Magazine, João
Carrega.
José Ferreira Gomes voltou a
salientar a importância do novo ciclo "de dois anos", os chamados
Cursos Técnicos Superiores Profissionais (aos quais os institutos
politécnicos já demonstraram a sua discordância). "Só 35 por cento
dos alunos que termina o ensino secundário é que entra no superior.
Temos que nos preocupar em aumentar o número de jovens para
entrarem nas instituições, para isso temos que garantir que a
diferenciação da oferta aumente. É nesse quadro que estamos a
propor o novo ciclo de dois anos, o qual existe na maioria dos
países europeus e e em estados americanos", explicou.
José Ferreira Gomes falava depois
de ouvir António Vicente (Presidente do SNESup) - o qual entregou
um documento com propostas claras ao Governo-, e Carlos Maia,
presidente do Instituto Politécnico de Castelo Branco, que lembrou
"estar-se a assistir a uma litoralização do ensino superior", dando
como exemplo que 53% das vagas está em Lisboa, Porto e Coimbra.
"Estamos a falar de equidade e coesão territorial", disse Carlos
Maia, acrescentando que se tem verificado uma desvalorização do
ensino superior: "os jovens acham que não é uma mais valia tirar um
curso superior".
A intervenção do
presidente do IPCB acabaria por ser reforçada quer pelo
vice-presidente da Câmara de Castelo Branco, Arnaldo Brás, que
sublinhou a questão da regulação das vagas, quer pelos presidentes
dos intituitos politécnicos de Portalegre (Joaquim Mourato) e de
Bragança (Sobrinho Teixeira).
"O ensino superior no interior
representa apenas 17% das vagas e 16% do total do Orçamento do
Ensino Superior", disse Joaquim Mourato, que é também o presidente
do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos.
"30% dos 4.689 cursos estão concentrados em 3% do território
nacional (distrito de Lisboa). Para além disso, quase metade dos
4.689 cursos encontram-se nos distritos de Lisboa e Porto
(concentrados em 5,6% do território nacional)", acrescentou.
Joaquim Mourato lembrou ainda que
"o impacto direto destas instituições nas respetivas regiões varia
entre os 27 e 171 milhões de euros. O seu peso médio no PIB varia
entre os 5% e os 11% da região onde estão inseridas. São
responsáveis pelo emprego de mais de 12% da população ativa dos
concelhos. Por cada euro investido pelo Estado no financiamento
destas instituições, existe um retorno médio de 4,22 euros, podendo
atingir o máximo de 8,07 euros".
Para os intervenientes não há "ensino superior a
mais". Sobrinho Teixeira colocou o dedo na ferida, ao referir que
"dá a sensação que somos um cargo para o país", destacando depois
os estudos da OCDE e a EUA sobre o ensino superior em Portugal.
"Nós (Portugal) nunca valorizamos esses estudos, parece que se quer
arranjar um que sirva", acrescentou, para depois se mostrar contra
as fusões de instituições, defendendo isso sim as parcerias, como
as que o seu politécnico tem com a Universidade de Trás-os-Montes e
Alto Douro.
A questão das vagas de acesso foi
também abordada pela maioria dos intervenientes. O Secretário de
Estado lembrou que há pessoas que lhe dizem que "se tirarem 5 a 10
por cento das vagas em Lisboa e Porto faria toda a diferença para a
instituições do interior. Mas estamos numa democracia e a maioria
dos candidatos ao ensino superior escolhe o litoral, e nem sempre a
mobilidade é bem acolhida pelas famílias". No entender de José
Ferreira Gomes, "o regime administrativo de controlo de vagas não
tem grande futuro. Surge-nos então a questão, qual é a alternativa?
há que atrair os jovens para estas regiões e dizer-lhes que há uma
oportunidade. Aquilo em que estamos a trabalhar é criar um
incentivo financeiro para os alunos virem estudar para o interior
do país, onde as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento das
Regiões têm uma palavra a dizer".
Democratizar
o ensino
O ex-secretário de Estado da Educação, Valter Lemos,
lembrou que a criação das universidades e politécnicos tiveram a
razão de democratizar o ensino e foram também uma política de
território. Sobre a questão das vagas, Valter Lemos referiu que "se
a política de ensino superior for apenas a de mercado, sem a
regulação do estado, todas as instituições de ensino superior do
interior vão fechar", acrescentando que "quando dá jeito usam-se os
instrumentos de regulação, quando não dá, não se usam. No litoral
foram criadas mais quatro mil vagas, e no interior diminuiram-se
200", disse. Valter Lemos voltou a frisar que o desaparecimento de
instituições de ensino superior não traz nenhuma mais valia. Isto
não quer dizer que não se façam parcerias". Sobre os cursos de dois
anos, Valter Lemos disse não "dislumbrar nenhuma diferença, a não
ser um semestre a mais, e a entrada ser aberta a alunos com o 11º
ano". No entender daquele docente da ESE de Castelo Branco, "estes
cursos não podem caraterizar o subsistema de ensino politécnico. Se
assim for, vamos de mal a pior".
Pedro Saraiva, da
CCDRC, lembrou que as "instituições de ensino superior deveriam ter
na sua agenda a promoção ou o apoio ao aparecimento de empresas
gazela", as quais são fundamentais para a promoção do emprego e do
desenvolvimento. Aquele responsável salientou o facto de Portugal
"ter uma rede equilibrada de ensino superior".
João Canavilhas (vice-reitor da
UBI), apresentou como sugestões a "coesão territorial, os apoios à
mobilidade e os incentivos à criação de emprego, bem como os
estímulos à cooperação regional", enquanto que o vice-reitor de
Évora, Cancela D'Abreu, falou de quatro eixos que considera
importantes para o ensino superior no interior do país: "qualidade,
exigência, comunicação e atratividade". Também de Évora, Manuel
José Lopes, da Escola de Enfermagem S. João de Deus, abordou a
questão da investigação e a falta de apoios que se sentem na
área.
Numa visão autárquica, Armindo
Jacinto falou do território "do interior como um espaço de
oportunidades", criticando o facto de Portugal não ter conseguido a
coesão económica e social, e de ser gerido com base em números. O
autarca que em Idanha-a-Nova tem a Escola Superior de Gestão do
IPCB tem defendido o desenvolvimento do interior do país, e na área
da educação concretizou alguns projetos com a Universidade de
Berkeley, da Califórnia, os quais envolveram também a Escola
Superior de Gestão.