Fernanda Serrano
«O público português é o melhor do mundo»
É uma das atrizes mais cotadas do
panorama artístico nacional e regressa aos palcos com a peça «40 e
então». Fernanda Serrano na primeira pessoa.
Está de volta aos palcos com a peça «40 e então», na
companhia da Ana Brito e Cunha e Maria Henrique, desta feita no
Casino de Lisboa, até 8 de março. Para quem ainda não viu, de que
fala este espectáculo com textos, entre outros, de Ana Bola e
Helena Sacadura Cabral?
São várias autoras, todas
elas muitíssimo diferenciadas entre si, abordando um tema tão comum
e transversal como é a idade, sob perspetivas
totalmente diferentes, tornando este espectáculo
despretensioso, sério, elegante e muito feminino, com pitadas de
humor, sarcasmo e emotividade, todas ao rubro.
Esta peça está em cena dez anos depois do sucesso de
«Confissões das mulheres de 30», protagonizado pelas mesmas
atrizes. Visto que alguns textos das peças também são vossos, de
alguma forma estes espectáculos funcionam como uma espécie de auto
biografia de quem as representa?
Sim, claro que para além da
nossa interpretação, colocamos nesses textos, algo que tem a ver
com a nossa perspetiva sobre esta década, dentro das tão diferentes
vivências de cada uma de nós.
A reedição desta peça em Lisboa surge depois de uma
digressão que fez pelo país, o que revela o sucesso alcançado.
Sente que os portugueses estão cada vez mais recetivos à
cultura?
Sinto. Aliás, sentimos. Em
cada cidade que passamos, sentimos um público sempre ávido de
receber espectáculos, intervenção e diversão. O público português é
e sempre será o melhor público do Mundo.
Como atriz tem no seu currículo participações no
teatro, no cinema e em telenovelas. Sente-se mais à vontade no
palco ou perante as câmaras de televisão?
Em todas estas áreas. Todas
têm registos absolutamente diferentes entre si e são desafios
diferentes para um ator/atriz. Gosto muito de fazer cinema, adoro a
adrenalina do teatro e da resposta imediata do público e estou como
peixe na água no registo da televisão, para a qual estou
formatadíssima para a rapidez e efemeridade. São áreas todas elas
confortáveis para mim, mas feitas alternadamente. Ao mesmo tempo,
torna-se um desgaste brutal e quanto a mim desnecessário, pois o
usufruto nunca será o mesmo, pela parte do ator.
A ficção portuguesa deu um salto extraordinário em
especial com a aposta na TVI, gerando grandes audiências e dando
emprego a muitos atores, jovens e menos jovens. A crise tem
prejudicado essa aposta?
A crise tem prejudicado esta
aposta, o país e o Mundo, sobretudo a Europa. São ciclos. Que têm
um princípio e um fim. O durante é a parte dura. Eu no entanto,
fui-me readaptando como qualquer português, na minha vida e na
minha profissão. Temos de ser constantemente bons críticos, atores,
gestores e estrategas. E ter uma capacidade de auto-crítica e
alguma dose de coragem interventiva inerente em cada desafio, cada
passo, cada trabalho.
A indústria de novelas portuguesas pode equiparar-se,
não em dimensão, mas em qualidade, à fábrica de novelas que há
décadas existe na TV Globo brasileira?
Embora nos faltem, ainda,
muitos dos elementos já existentes naquela indústria colossal que é
a máquina da Globo, creio que temos tido um percurso mais rápido
que eles. Mas em termos de produção, decors, figurino e argumento,
ainda nos falta calcorrear algum caminho. Eles têm 30 anos de
avanço, mas nós encurtámos cerca de metade deste tempo. Gostaria
que resgatássemos o romance, a nossa história e cultura de forma
mais vincada. Temos tanto ainda para fazer. Tenho tantas ideias por
concretizar, falta-me tempo para tal.
A maternidade dos seus três filhos, o Pedro, a Laura
e a Maria, fê-la interromper por algum tempo a sua atividade
profissional. Como consegue conciliar a assistência familiar com a
exigente vida profissional, com muitas horas de
filmagens?
Tendo desde sempre presente
que a minha família está e estará sempre em primeiro lugar. Para
poder ser uma atriz feliz, tenho antes de ser uma mãe feliz. E
conciliando os horários rigorosos e tão extensos de trabalho, com
uma excelente organização e ajudas familiares. Sem isto seria
impraticável trabalhar ao ritmo imposto e que eu gosto.
Ao
nível educativo, que valores procura incutir-lhes no dia a
dia?
Que têm de ser indivíduos
trabalhadores, conscientes das suas tarefas, da partilha, do
respeito, da harmonia familiar, sem nunca esquecerem que têm e
devem divertir-se em todas as facetas do seu dia-a-dia. Que façam o
que estiver ao alcance de cada um deles, que torne a vida de cada
um e a nossa mais feliz. Faço sempre sentir a minha presença em
quase todos os momentos e que estarei sempre cá para tudo o que
precisarem. Quero sempre sentir que sou uma mãe muito presente e
atenta. Foi o que sempre tive na minha infância, adolescência e
continuo a ter. É fundamental para o nosso equilíbrio.
Se algum deles seguir a carreira da mãe vai ter os
seus conselhos e estímulo?
Claro que sim. Quero
sobretudo que façam o que gostam, como eu tive essa oportunidade. É
maravilhoso poder trabalhar no que nos faz feliz.
A sua luta contra um cancro de mama emocionou a
sociedade portuguesa. No seguimento dos tratamentos a que se
submeteu, soube-se que tinha uma gravidez de elevado risco. No
livro «Também há finais felizes» revela ter sido vítima de
negligência médica. Quis com o seu testemunho, devido
à sua exposição mediática, dizer que é possível vencer as
adversidades?
Quis antes de qualquer outra
coisa, alertar a sociedade, para os possíveis (que os há
infelizmente), erros médicos, negligências, graves, que nos podem
custar a vida. E que se tivermos dúvidas, devemos fazer de tudo,
para as substituir por certezas. Estas sim, são para resolver. As
anteriores, não nos levam a lado nenhum. Penso que temos de ter
discernimento, confiança, coragem, aliados a uma boa dose de sorte.
E isto, para tudo na vida. Com tudo isto, é possível vencer as
adversidades. Algumas.
Nuno Dias da Silva
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