Nuno Sá premiado em dois concursos mundiais de fotografia
Nadando com tubarões
O desejo de viver em contacto com o mar
levou Nuno Sá até aos Açores. Especialista em fotografia
subaquática, no seu primeiro mergulho com tubarões azuis conseguiu
imagens premiadas em dois dos mais reputados concursos mundiais de
fotografia de Natureza: o Wildlife Photographer of the Year e o
Natures Best Photography. A fotografia é o seu contributo para a
conservação ambiental. Escolhe temas a precisar de relações
públicas, como os tubarões e passa mensagens fortes em relação a
espécies ameaçadas de extinção, ou espécies em declínio de
população. Em entrevista ao Ensino Magazine, defende que só o
conhecimento pode trazer valorização a um Património subaquático de
grande riqueza e biodiversidade, como é o do mar português e
lamenta que esta crise tenha chegado na pior altura possível,
quando o interesse das pessoas se voltava de novo para as questões
ambientais.
Ganhou
Prémios em dois dos mais prestigiados concursos internacionais de
fotografia o Wildlife Photographer of The Year e o Natures Best
Photography, com fotografias do tubarão azul, captadas ao largo dos
mares dos Açores. Os tubarões trouxeram-me sorte em 2011?
Os tubarões, neste último ano e
meio, têm tido uma importância enorme na minha carreira. Mesmo
antes dos tubarões azuis já tinha ganho alguns prémios com imagens
de tubarões-frade e de jamantas, que também é um peixe cartilagíneo
- um elasmobrânquio - são da mesma família. Cada vez mais tenho
ganho esse interesse pelos tubarões. No próximo Verão ainda queria
tentar nadar com outra espécie que temos aqui nos Açores.
Como foram
tiradas essas fotografias?
Ambas as
imagens foram curiosamente tiradas no mesmo mergulho e no mesmo
dia, com poucos minutos de diferença, no meu primeiro mergulho com
tubarões azuis. Já alguns anos que andava aqui, nos Açores, a
tentar mergulhar com tubarões azuis. Encontrava-os em alto mar
quando fazia as minhas saídas para fotografar cetáceos, mas eram
muito tímidos e não conseguia nadar com eles. Foi um mergulho feito
com pessoas do Departamento de Oceanografia e Pescas da
Universidade dos Açores. Estavam o ano passado com um projecto de
marcação de tubarões azuis, para perceber as suas rotas
migratórias. Fui com eles e tivemos um mergulho extraordinário.
Cinco ou seis tubarões azuis, condições óptimas, os tubarões super
curiosos. Desde aí nadar com tubarões azuis já se tornou uma
atracção turística nos Açores e este ano já tive a oportunidade de
mergulhar mais duas ou três vezes. Geralmente conseguir imagens que
sejam premiadas nestes concursos internacionais requer muito
trabalho e muita dedicação. Neste caso, foi no meu primeiro
mergulho com esta espécie e ambas as imagens tiradas no mesmo
mergulho.
Em 2008
tinha sido o primeiro português a ser distinguido no Wildlife
Photographer of the Year. O que significou esse Prémio?
Foi a minha rampa de lançamento.
Nessa altura estava a trabalhar como fotógrafo a tempo inteiro numa
editora em que se fazia fotografia turística e cultural. Quando
entrei para essa editora tinha negociado, à partida, para além do
mês de férias, um mês de licença sem vencimento e dedicava dois
meses por ano ao que gostava mesmo de fazer, que era a fotografia
de Natureza. Esses dois meses eram religiosamente guardados para me
dedicar à fotografia no mar. Em 2008 quando fui nomeado no Wildlife
Photographer of the Year, e quando se soube que era o primeiro
português alguma vez nomeado, trouxe algum burburinho na
comunicação social. Tive alguns convites para projectos
estrangeiros de fotografia de Natureza o que me permitiu dar o
passo para me tornar fotógrafo de natureza a tempo inteiro.
Trocou o
Continente pelos Açores e o curso de direito pela fotografia
subaquática. O que ditou essa mudança de rumo?
Não troquei o Direito pela fotografia,
troquei o Direito por viver uma vida em contacto com o mar. Só
tirei o meu primeiro curso de mergulho enquanto estava a estudar
Direito, tive um primeiro contacto com o mar um bocadinho tardio.
Desde aí, cada vez pensava mais nos segredos que o mar tinha e no
que gostaria de mergulhar pelo mundo fora. Quando acabei o curso já
tinha instalado na minha cabeça que estava na área errada. Queria
viver uma vida em contacto com o mar e vim para os Açores à procura
disso. Um mês depois de estar cá, por sorte, tinha entrado no curso
de Biologia Marinha da Universidade dos Açores, estava a trabalhar
numa empresa de observação de cetáceos e a ver as minhas primeiras
baleias e golfinhos. Nem sequer tinha uma máquina fotográfica nessa
altura da minha vida. Como estava a passar por aqueles momentos
únicos e para mim impensáveis, a ver as minhas primeiras baleias,
comprei uma máquina fotográfica para ir registando, mostrar aos
pais e aos amigos, para eles terem uma noção do que estava a ser
esta minha mudança de vida. E daí nasceu o vício da fotografia que
se leva cada vez mais a sério. Todos os meses punha dinheiro de
parte para comprar uma determinada lente, uma determinada máquina.
O interesse pela fotografia nasceu do interesse pelo mar.
Com a
actual crise económica as questões ambientais podem ser
esquecidas?
Sem dúvida, infelizmente. Nunca se
tinha falado tanto das questões ambientais, mesmo do aquecimento
global, como na altura que antecedeu esta crise que começou nos
Estados Unidos, com o mercado imobiliário. Finalmente voltava-se a
prestar muito mais atenção à nossa Natureza. É um facto que desde a
década de 70, 80 que a opinião pública se tem desligado das
questões ambientais. Aquela força toda que a Green Peace tinha
como, por exemplo, na década de 80 termos acabado com a pesca à
baleia é uma coisa que hoje em dia não conseguimos. Sabemos que
milhões de tubarões estão a ser mortos por causa do valor das suas
Barbatanas, para serem enviados para o Oriente para a sopa de
barbatana de tubarão e não há maneira de se conseguir tomar
decisões firmes em relação a isso, e em relação a inúmeras questões
ambientais, especialmente do nosso mar que está passar uma altura
crítica. É sempre difícil de equilibrar os interesses económicos e
os interesses ambientais. Numa altura de crise, os interesses
ambientais, muitas vezes, são minimizados e os interesses
económicos é que vingam. Esta crise veio na pior altura possível.
As pessoas voltavam a ter alguma consciencialização ambiental, mais
preocupação com o ambiente e a perceber que estávamos a chegar a
uma fase crítica em questões de aquecimento global, como sobrepesca
a nível mundial, poluição, etc.
Tem livros
publicados e colabora regularmente com várias publicações,
nomeadamente a National Geographic Portugal. A fotografia é também
o seu contributo para a conservação da Natureza?
Nos últimos anos, as minhas fotografias são temas
completamente dedicados à conservação ambiental. Já não faço muito
fotografia de ir para o mar e simplesmente fazer fotografia,
escolho temas com uma forte, mensagem de conservação e nisso é
muito importante a minha colaboração com a revista National
Geographic, Portugal. Posso propor temas forte e ir atrás de
objectivos específicos e mostrar uma mensagem forte em relação a
uma espécie. Todos os artigos da National Geographic que publiquei
em Portugal são sobre espécies em vias de extinção ou espécies
vulneráveis pelas categorias da Red List do IUCN (NE:União Mundial
de Conservação da Natureza), o barómetro do estado da população de
todas as espécies que existem no mundo. Temos em Portugal espécies
que estão em grave situação de declínio de populações e temos
também as espécies que têm uma importância enorme a nível mundial,
não só aqui nos Açores. Os Açores têm uma situação privilegiada no
meio do oceano, mas muitas das espécies oceânicas estão aqui de
passagem e são muito difíceis de proteger porque isto é só um ponto
da viagem deles; temos na Ria Formosa a maior população de cavalos
marinhos a nível mundial e está com um declínio, nos últimos
quatro, cinco anos, muito grande, cerca de 40% da população; e
temos na Madeira o mamífero marinho em maior perigo de extinção a
nível mundial, a foca-monge. Cada vez mais a minha fotografia é
virada para a conservação, para temas fortes e que precisam de
relações públicas.
A
fotografia marinha não tem muitos representantes em Portugal. Essa
situação pode alterar-se?
É uma actividade um pouco cara.
Para além do material fotográfico normal que envolve e representa
algum investimento, temos a parte subaquática de levar caixas,
tanques e flashes subaquáticos, bem como os mergulhos. Mas penso
que é por uma questão de desconhecimento. Em Portugal conhecemos
muito pouco do nosso património natural, e claro que a parte
subaquática é a parte mais difícil de se conhecer e que está menos
ao alcance. Passa por as pessoas acharem que mergulhar é na grande
barreira de Coral da Austrália, ou no mar vermelho, ou nas
Galápagos e não saberem que nós temos uma riqueza e uma diversidade
imensa nas nossas águas. Portugal, mesmo a nível internacional, tem
várias espécies marinhas interessantíssimas.
Quais são
as espécies marinhas que prefere fotografar?
Gosto especialmente de fotografar
espécies oceânicas. Espécies em alto mar, que têm grandes rotas
migratórias e que são muito difíceis, regra geral, de conseguir
fotografar. É ir para mar alto e ter a esperança de as encontrar.
Mas, quando temos essa sorte, são os melhores momentos que se podem
passar no mar. Baleias, tubarões, jamantas, tartarugas são os temas
que mais gosto apesar de representarem muito tempo em alto mar e
pouco tempo com a espécie em si. Por exemplo, para fotografar o
tubarão baleia, que é o maior peixe do mundo, e temos aqui nos
Açores, este Verão fiquei cerca de uma semana em alto-mar, todos os
dias, a procurá-los para conseguir estar vinte, a vinte e cinco
minutos, com um. Mas, quando finalmente estamos dentro de água com
estes animais os momentos são únicos. Ter o privilégio de estar em
alto-mar, com o azul profundo por baixo de nós, e com um animal com
10 ou 12 metros de comprimento, pacificamente ali à nossa volta e
muito curioso, é o que mais gosto de fazer. Apesar de ser a parte
que tenho mais dificuldade porque é a mais dispendiosa, requer
barcos e gasolinas durante muitos dias.
O World
Wildlife Foundation (WWF) convido-o a participar com uma fotografia
no calendário de 2012. Era um convite irrecusável?
Desde que comecei a tirar
fotografias e que o objectivo era mostrar as fotografias aos pais e
aos amigos, que o objectivo continua a ser o mesmo. É por isso que
têm sido muito importantes estes concursos internacionais de
fotografia de natureza, que são vistos por muitas pessoas, mas o
objectivo continua a ser o mesmo, simplesmente o público é muito
mais vasto.Este género de coisas como o calendário da WWF é uma
maneira de conseguir mostrar as imagens e cativar as pessoas para
espécies, com a maior eficiência possível. Chega aos quatro cantos
do mundo. No Wildlife Photographer of the Year as imagens ficam
expostas no museu de História Natural de Londres, durante seis
meses, e são visitadas por cerca de dois milhões e meio de pessoas,
e depois entram em digressão mundial. Tivemos recentemente os
resultados de 2010, no Museu de História Natural de Lisboa. O
Natures Best Photography as imagens ficam expostas no Smithsonian`s
em Washington e também são vistas por dois milhões e tal de
pessoas. Esse é o meu grande objectivo tentar entrar sempre nos
veículos que possam levar as imagens o mais longe possível.
É também
Portugal que é visto e ganha com as suas fotografias...
Portugal tem um património
subaquático incrível. Se conseguir esses sítios onde as imagens têm
o maior impacto possível, também vai chegar o interesse do lado de
fora, bem como dos próprios portugueses que podem dizer "se o que
temos cá é considerado bom a competir com os melhores destinos do
mundo para se fazer imagem, se calhar devemo-nos interessar e
valorizar mais". Primeiro tem de vir o conhecimento, depois pode
vir a valorização, a preocupação ambiental. Se as pessoas não sabem
que temos a maior população de cavalos marinhos do mundo na ria
Formosa, nem sequer vão ter preocupação em conservá-la. Tanto WWF
como Wildlife Photographer of the Year, a ideia é tentar pôr isto
nos sítios com a maior visibilidade possível, valorizar e envolver
as pessoas ao máximo.
Quais são
os projectos para o ano de 2012?
Em 2012 vou ficar mais aqui pelos
Açores. Vou dedicar um Verão inteiro àquilo que gosto mais de
fazer, as espécies oceânicas, mas muito mais por razões familiares.
Tenho uma filhota, estou a acompanhar os primeiros passos dela, e
não queria ausentar-me durante expedições muito longas. Vou ficar
mais pelos Açores, o que significa correr as ilhas todas. Os Açores
têm coisas fantásticas em cada uma das ilhas. Fotografar
tubarões-baleia para uma das ilha, tubarões azuis para outra, os
meros ou os naufrágios para outra, acabo por correr as ilhas todas.
Mas, tenho a hipótese de ir regularmente a casa o que é muito
bom.