Entrevista

Nuno Sá premiado em dois concursos mundiais de fotografia
Nadando com tubarões

1 - 2008_Wildlife Photographer of the Year_Highly_commended_cat_Animals_in_their_environment.JPGO desejo de viver em contacto com o mar levou Nuno Sá até aos Açores. Especialista em fotografia subaquática, no seu primeiro mergulho com tubarões azuis conseguiu imagens premiadas em dois dos mais reputados concursos mundiais de fotografia de Natureza: o Wildlife Photographer of the Year e o Natures Best Photography. A fotografia é o seu contributo para a conservação ambiental. Escolhe temas a precisar de relações públicas, como os tubarões e passa mensagens fortes em relação a espécies ameaçadas de extinção, ou espécies em declínio de população. Em entrevista ao Ensino Magazine, defende que só o conhecimento pode trazer valorização a um Património subaquático de grande riqueza e biodiversidade, como é o do mar português e lamenta que esta crise tenha chegado na pior altura possível, quando o interesse das pessoas se voltava de novo para as questões ambientais.

 

Ganhou Prémios em dois dos mais prestigiados concursos internacionais de fotografia o Wildlife Photographer of The Year e o Natures Best Photography, com fotografias do tubarão azul, captadas ao largo dos mares dos Açores. Os tubarões trouxeram-me sorte em 2011?

 

Os tubarões, neste último ano e meio, têm tido uma importância enorme na minha carreira. Mesmo antes dos tubarões azuis já tinha ganho alguns prémios com imagens de tubarões-frade e de jamantas, que também é um peixe cartilagíneo - um elasmobrânquio - são da mesma família. Cada vez mais tenho ganho esse interesse pelos tubarões. No próximo Verão ainda queria tentar nadar com outra espécie que temos aqui nos Açores.

 

Como foram tiradas essas fotografias?

 

Nuno Sa╠ü_Alta.JPGAmbas as imagens foram curiosamente tiradas no mesmo mergulho e no mesmo dia, com poucos minutos de diferença, no meu primeiro mergulho com tubarões azuis. Já alguns anos que andava aqui, nos Açores, a tentar mergulhar com tubarões azuis. Encontrava-os em alto mar quando fazia as minhas saídas para fotografar cetáceos, mas eram muito tímidos e não conseguia nadar com eles. Foi um mergulho feito com pessoas do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores. Estavam o ano passado com um projecto de marcação de tubarões azuis, para perceber as suas rotas migratórias. Fui com eles e tivemos um mergulho extraordinário. Cinco ou seis tubarões azuis, condições óptimas, os tubarões super curiosos. Desde aí nadar com tubarões azuis já se tornou uma atracção turística nos Açores e este ano já tive a oportunidade de mergulhar mais duas ou três vezes. Geralmente conseguir imagens que sejam premiadas nestes concursos internacionais requer muito trabalho e muita dedicação. Neste caso, foi no meu primeiro mergulho com esta espécie e ambas as imagens tiradas no mesmo mergulho.

 

Em 2008 tinha sido o primeiro português a ser distinguido no Wildlife Photographer of the Year. O que significou esse Prémio?

 

Foi a minha rampa de lançamento. Nessa altura estava a trabalhar como fotógrafo a tempo inteiro numa editora em que se fazia fotografia turística e cultural. Quando entrei para essa editora tinha negociado, à partida, para além do mês de férias, um mês de licença sem vencimento e dedicava dois meses por ano ao que gostava mesmo de fazer, que era a fotografia de Natureza. Esses dois meses eram religiosamente guardados para me dedicar à fotografia no mar. Em 2008 quando fui nomeado no Wildlife Photographer of the Year, e quando se soube que era o primeiro português alguma vez nomeado, trouxe algum burburinho na comunicação social. Tive alguns convites para projectos estrangeiros de fotografia de Natureza o que me permitiu dar o passo para me tornar fotógrafo de natureza a tempo inteiro.

 

Trocou o Continente pelos Açores e o curso de direito pela fotografia subaquática. O que ditou essa mudança de rumo?

 

3 - 2011_Natures best Photography_Tubara╠âo azul Vencedor categria Oceanos .JPGNão troquei o Direito pela fotografia, troquei o Direito por viver uma vida em contacto com o mar. Só tirei o meu primeiro curso de mergulho enquanto estava a estudar Direito, tive um primeiro contacto com o mar um bocadinho tardio. Desde aí, cada vez pensava mais nos segredos que o mar tinha e no que gostaria de mergulhar pelo mundo fora. Quando acabei o curso já tinha instalado na minha cabeça que estava na área errada. Queria viver uma vida em contacto com o mar e vim para os Açores à procura disso. Um mês depois de estar cá, por sorte, tinha entrado no curso de Biologia Marinha da Universidade dos Açores, estava a trabalhar numa empresa de observação de cetáceos e a ver as minhas primeiras baleias e golfinhos. Nem sequer tinha uma máquina fotográfica nessa altura da minha vida. Como estava a passar por aqueles momentos únicos e para mim impensáveis, a ver as minhas primeiras baleias, comprei uma máquina fotográfica para ir registando, mostrar aos pais e aos amigos, para eles terem uma noção do que estava a ser esta minha mudança de vida. E daí nasceu o vício da fotografia que se leva cada vez mais a sério. Todos os meses punha dinheiro de parte para comprar uma determinada lente, uma determinada máquina. O interesse pela fotografia nasceu do interesse pelo mar.

 



Com a actual crise económica as questões ambientais podem ser esquecidas?

 

Sem dúvida, infelizmente. Nunca se tinha falado tanto das questões ambientais, mesmo do aquecimento global, como na altura que antecedeu esta crise que começou nos Estados Unidos, com o mercado imobiliário. Finalmente voltava-se a prestar muito mais atenção à nossa Natureza. É um facto que desde a década de 70, 80 que a opinião pública se tem desligado das questões ambientais. Aquela força toda que a Green Peace tinha como, por exemplo, na década de 80 termos acabado com a pesca à baleia é uma coisa que hoje em dia não conseguimos. Sabemos que milhões de tubarões estão a ser mortos por causa do valor das suas Barbatanas, para serem enviados para o Oriente para a sopa de barbatana de tubarão e não há maneira de se conseguir tomar decisões firmes em relação a isso, e em relação a inúmeras questões ambientais, especialmente do nosso mar que está passar uma altura crítica. É sempre difícil de equilibrar os interesses económicos e os interesses ambientais. Numa altura de crise, os interesses ambientais, muitas vezes, são minimizados e os interesses económicos é que vingam. Esta crise veio na pior altura possível. As pessoas voltavam a ter alguma consciencialização ambiental, mais preocupação com o ambiente e a perceber que estávamos a chegar a uma fase crítica em questões de aquecimento global, como sobrepesca a nível mundial, poluição, etc.

 



Tem livros publicados e colabora regularmente com várias publicações, nomeadamente a National Geographic Portugal. A fotografia é também o seu contributo para a conservação da Natureza?

 



2011_Asferico_Tubara╠âo_frade.JPGNos últimos anos, as minhas fotografias são temas completamente dedicados à conservação ambiental. Já não faço muito fotografia de ir para o mar e simplesmente fazer fotografia, escolho temas com uma forte, mensagem de conservação e nisso é muito importante a minha colaboração com a revista National Geographic, Portugal. Posso propor temas forte e ir atrás de objectivos específicos e mostrar uma mensagem forte em relação a uma espécie. Todos os artigos da National Geographic que publiquei em Portugal são sobre espécies em vias de extinção ou espécies vulneráveis pelas categorias da Red List do IUCN (NE:União Mundial de Conservação da Natureza), o barómetro do estado da população de todas as espécies que existem no mundo. Temos em Portugal espécies que estão em grave situação de declínio de populações e temos também as espécies que têm uma importância enorme a nível mundial, não só aqui nos Açores. Os Açores têm uma situação privilegiada no meio do oceano, mas muitas das espécies oceânicas estão aqui de passagem e são muito difíceis de proteger porque isto é só um ponto da viagem deles; temos na Ria Formosa a maior população de cavalos marinhos a nível mundial e está com um declínio, nos últimos quatro, cinco anos, muito grande, cerca de 40% da população; e temos na Madeira o mamífero marinho em maior perigo de extinção a nível mundial, a foca-monge. Cada vez mais a minha fotografia é virada para a conservação, para temas fortes e que precisam de relações públicas.

 



A fotografia marinha não tem muitos representantes em Portugal. Essa situação pode alterar-se?

 

É uma actividade um pouco cara. Para além do material fotográfico normal que envolve e representa algum investimento, temos a parte subaquática de levar caixas, tanques e flashes subaquáticos, bem como os mergulhos. Mas penso que é por uma questão de desconhecimento. Em Portugal conhecemos muito pouco do nosso património natural, e claro que a parte subaquática é a parte mais difícil de se conhecer e que está menos ao alcance. Passa por as pessoas acharem que mergulhar é na grande barreira de Coral da Austrália, ou no mar vermelho, ou nas Galápagos e não saberem que nós temos uma riqueza e uma diversidade imensa nas nossas águas. Portugal, mesmo a nível internacional, tem várias espécies marinhas interessantíssimas.

 



Quais são as espécies marinhas que prefere fotografar?

 

Gosto especialmente de fotografar espécies oceânicas. Espécies em alto mar, que têm grandes rotas migratórias e que são muito difíceis, regra geral, de conseguir fotografar. É ir para mar alto e ter a esperança de as encontrar. Mas, quando temos essa sorte, são os melhores momentos que se podem passar no mar. Baleias, tubarões, jamantas, tartarugas são os temas que mais gosto apesar de representarem muito tempo em alto mar e pouco tempo com a espécie em si. Por exemplo, para fotografar o tubarão baleia, que é o maior peixe do mundo, e temos aqui nos Açores, este Verão fiquei cerca de uma semana em alto-mar, todos os dias, a procurá-los para conseguir estar vinte, a vinte e cinco minutos, com um. Mas, quando finalmente estamos dentro de água com estes animais os momentos são únicos. Ter o privilégio de estar em alto-mar, com o azul profundo por baixo de nós, e com um animal com 10 ou 12 metros de comprimento, pacificamente ali à nossa volta e muito curioso, é o que mais gosto de fazer. Apesar de ser a parte que tenho mais dificuldade porque é a mais dispendiosa, requer barcos e gasolinas durante muitos dias.

 



O World Wildlife Foundation (WWF) convido-o a participar com uma fotografia no calendário de 2012. Era um convite irrecusável?

 

Desde que comecei a tirar fotografias e que o objectivo era mostrar as fotografias aos pais e aos amigos, que o objectivo continua a ser o mesmo. É por isso que têm sido muito importantes estes concursos internacionais de fotografia de natureza, que são vistos por muitas pessoas, mas o objectivo continua a ser o mesmo, simplesmente o público é muito mais vasto.Este género de coisas como o calendário da WWF é uma maneira de conseguir mostrar as imagens e cativar as pessoas para espécies, com a maior eficiência possível. Chega aos quatro cantos do mundo. No Wildlife Photographer of the Year as imagens ficam expostas no museu de História Natural de Londres, durante seis meses, e são visitadas por cerca de dois milhões e meio de pessoas, e depois entram em digressão mundial. Tivemos recentemente os resultados de 2010, no Museu de História Natural de Lisboa. O Natures Best Photography as imagens ficam expostas no Smithsonian`s em Washington e também são vistas por dois milhões e tal de pessoas. Esse é o meu grande objectivo tentar entrar sempre nos veículos que possam levar as imagens o mais longe possível.

 



É também Portugal que é visto e ganha com as suas fotografias...

 

Portugal tem um património subaquático incrível. Se conseguir esses sítios onde as imagens têm o maior impacto possível, também vai chegar o interesse do lado de fora, bem como dos próprios portugueses que podem dizer "se o que temos cá é considerado bom a competir com os melhores destinos do mundo para se fazer imagem, se calhar devemo-nos interessar e valorizar mais". Primeiro tem de vir o conhecimento, depois pode vir a valorização, a preocupação ambiental. Se as pessoas não sabem que temos a maior população de cavalos marinhos do mundo na ria Formosa, nem sequer vão ter preocupação em conservá-la. Tanto WWF como Wildlife Photographer of the Year, a ideia é tentar pôr isto nos sítios com a maior visibilidade possível, valorizar e envolver as pessoas ao máximo.

 



Quais são os projectos para o ano de 2012?

 

Em 2012 vou ficar mais aqui pelos Açores. Vou dedicar um Verão inteiro àquilo que gosto mais de fazer, as espécies oceânicas, mas muito mais por razões familiares. Tenho uma filhota, estou a acompanhar os primeiros passos dela, e não queria ausentar-me durante expedições muito longas. Vou ficar mais pelos Açores, o que significa correr as ilhas todas. Os Açores têm coisas fantásticas em cada uma das ilhas. Fotografar tubarões-baleia para uma das ilha, tubarões azuis para outra, os meros ou os naufrágios para outra, acabo por correr as ilhas todas. Mas, tenho a hipótese de ir regularmente a casa o que é muito bom.

 
 
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