Opinião

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Vida (triste) de professor?

Como pode alguém dizer isso se nós, professores, dançamos, cantamos, rimos, suspiramos, choramos, sonhamos, estamos, somos, desejamos, amamos, ensinamos, aprendemos…tal como qualquer outro ser humano?

Como se atrevem a dizer que somos tristes no modo como nos relacionamos com nosso ofício de educar? É bem verdade que todos os que trabalham em educação podem dizer que andamos entristecidos porque nos últimos tempos, têm predominado paixões tristes, forças reactivas, ressentimentos e, até mesmo, infelicidades. Todos podemos dizer que essa tristeza se tem tornado uma carga cada vez mais pesada já que, de todo o lado, as nossas acções educativas são julgadas, modificadas, medidas, limitadas, sem nos consultarem e, em alguns casos, aniquilando a vida pessoal e profissional.

É uma tristeza que se nos cola à pele e nos compele a criar uma imagem pobre, medíocre, indigente de nós mesmos. Tristeza que nos faz pensar o que já foi pensado, a dizer o já dito, a fazer o já feito, a ter cada vez menos ideias, menos amor à nossa profissão e a ficarmos presos (quase dependentes) à opinião dos outros, desenvolvendo uma profunda miopia para o que está à nossa frente, ao planeamento cuidado, ao estudo, ao aluno, ao colega, à escola, aos funcionários, à comunidade, a…nós mesmos! Não conseguimos escutar o que é interessante, excepcional, naquilo em que vivemos quotidianamente.

Também é verdade que, a tudo isto, tememos o desprezo dos colegas, se nos pusermos a inventar, a questionar, a problematizar o que é da ordem do consenso.

Então por que aceitamos trabalhar separados da nossa capacidade de criar, educar, gerar conhecimento e saber, da qual acreditávamos ser capazes? Por que não lutamos contra tudo o que ameaça a nossa vida criativa de educadores? Por que aceitamos chegar todos os dias à escola sempre vestidos com a pompa circunstanciada dos nossos valores estabelecidos, dos quais resulta mais tristeza? Por que não trabalhamos de maneira leve e despojada, livre e bem-humorada, que crie condições de possibilidade para fazer de nossa profissão uma obra artística?

Não nos pagam de modo justo? As condições de trabalho são péssimas? Os horários são um horror? A formação é limitada e limitadora? Tudo junto? Parece que alguém conseguiu que nos acostumássemos a falar de nossa profissão como de alguma coisa disfuncional, defeituosa, danificada, fora dos eixos. E que sempre seremos sensibilizados pelas promessas políticas de uma educação plena - como se ela pudesse, algum dia, existir! À conta disto há sempre um ou outro opinion maker que se atira com enorme ferocidade aos professores, como se de um bando de alucinados tresloucados de tratasse e que deles é a culpa de tudo o que vai de mal no mundo, no ensino, nos jovens, na economia.

É necessário perguntar: "O que é que nos faz felizes no nosso oficio de educar"? Ao respondermos eliminamos tudo o que é mágoa, acusação, culpa, muitas das nossas percepções correntes e vividas e desta forma passamos a ver, a perceber e a sentir, na nossa vida enquanto educadores, algo muito maior do que o vivido, do que o percebido, do que o sentido, para podermos desaprender o dado e o feito. Este é o melhor caminho para retomar, no tempo certo, o trajecto e a fé no bem-querer e bem-fazer.

Não se é triste por ser professor. Cada um de nós já atravessou sofrimentos inacreditáveis, tivemos vertigens, adoecemos, sentimo-nos sós (literalmente). Já fomos assombrados pelas inumeráveis gerações de professores que educaram e se entristeceram, que viveram de modo estéril e sem alegria, que sentiram o efeito do poder nefasto sobre eles, que os impediu de fazer o que queriam ou tinham capacidade para fazer. Talvez seja preciso seguir todos aqueles que, da sua condição de professores, fazem não um sacrifício a um poder que é sempre triste, que bloqueia a efectivação de suas potências, mas um cântico à vida e que, por isso, reinventam todos os gestos, fazem passar fluxos de novidades, atravessam os muros, deslocam os limites, transformam o ofício de educar em algo vivo e móvel, contínuo e dinâmico.

Professores que cintilam, vibram, viajam (mesmo permanecendo onde sempre estiveram) ao preencher e efectuar a potência de educar. Professores guerreiros, vitais, cósmicos, alegres, defensores do múltiplo, do futuro, do acaso, que, através das doenças do que foi vivido, aprenderam a viver em saúde na sua profissão. Com uma serenidade que serena a mortificação, tantas vezes reproduzida, eles amam o que há de mais vivo no que fazem, inclinam-se sobre a beleza de educar, abraçam a vida, fornecem exemplo de criação e da alegria de viver, pelas suas próprias vidas, mais do que pelos livros e palavras. Para muitos são professores estranhos, desadequados, impuros, infernais, inesperados. O que acontece é que eles são feitos apenas das intensidades de seus olhos, ouvidos e coração de artistas, de afectos alegres, de velocidades e lentidões de suas próprias existências de artistas, do inédito e do notável dos seus pensamentos de artistas. E, acima de tudo, do seu educar artístico, que é o que, felizmente, para todos nós, espanta todas as mortes em vida.

Ensinar, como todas as profissões que abordam a vida, só existe na sua essência se houver improvisação e criação, escuta, sensibilidade e bom senso, aceitação, argumentação, honestidade intelectual e plenitude de vida. Nunca com a falta de querer viver, com a apatia, com inaptidão, com a indiferença.

Jorge Almeida
(Escola Superior de Saúde Dr. Lopes Dias / Instituto Politécnico de Castelo Branco)
 
 
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