Suplemento

Constantino Rei, presidente do IPG, em entrevista
Politécnico da Guarda mostra a sua força

IMGP3982.JPGO Instituto Politécnico da Guarda tem um impacto de cerca de 40 milhões de euros na região em que está inserido. Constantino Rei, presidente da instituição, destaca a importância que o IPG tem no distrito e lembra a qualidade da oferta formativa existente.

Sobre a reordenação da rede de ensino superior e da oferta formativa, Constantino Rei é claro e diz que tem que haver coragem política para corrigir as assimetrias entre o litoral e o interior do país.

O presidente do IPG fala ainda do projecto de investigação Magic Key, desenvolvido no IPG, o qual deu origem a uma empresa e que já está a exportar soluções de apoio a pessoas com deficiência. De caminho diz concordar com o antigo ministro do Ensino Superior, Pedro Lynce: para ele Bolonha foi mesmo um fiasco!

Estão previstas novas ofertas formativas para o próximo ano lectivo?

Foram aprovados dois novos mestrados em Construções Civis e em Turismo e Tecnologias de Informação e Comunicação (este em parceria com a Universidade da Beira Interior), os quais poderão abrir no próximo ano. Além desses dois cursos, não apresentámos mais nenhuma proposta à Agência de Avaliação e Acreditação, quer ao nível das licenciaturas, quer dos mestrados.

A aposta do IPG vai no sentido de abrir novos mestrados, garantindo que os alunos possam aqui prosseguir os seus estudos?

Temos que perceber que o Processo de Bolonha fez com que os ciclos de formação sejam diferentes dos antigos. Ou seja, os mestrados surgem como uma consequência natural do próprio Processo de Bolonha. Por isso, queremos que nas áreas em que temos licenciaturas, os nossos alunos possam frequentar aqui os respectivos mestrados. Isto porque reconhecemos que as licenciaturas actuais podem ficar aquém daquilo que o mercado exige. Por isso, iremos continuar a apostar em mestrados profissionalizantes, nas áreas de formação inicial do IPG, sem colocarmos de parte a realização de outros mestrados que o mercado nos venha a exigir.

Abordou a questão do Processo de Bolonha. O antigo ministro do Ensino Superior, Pedro Lynce, considera que Bolonha foi um fiasco. Concorda com a ideia?

IMGP3995.JPGConcordo. Bolonha foi e é um fiasco. Foi aquilo que se suspeitou que visse a ser: uma forma encapotada de gastar menos dinheiro no ensino superior. Objectivamente Bolonha não foi mais que a redução dos ciclos de formação. Isto porque a implementação de novas metodologias acabaria por ser feita, com ou sem esse Processo, já que é essa a evolução normal das ciências, das disciplinas, dos métodos e da própria formação das pessoas. Significa isto, que excepção feita à normalização dos ciclos de estudo, não surgiram vantagens para o ensino superior português. Pelo contrário, Bolonha veio introduzir distorções, descriminação e equívocos à sociedade do tipo: um licenciado de três anos tem as mesmas competências que um licenciado de cinco?. Por outro lado veio permitir que algumas instituições atribuam equivalências automáticas.

E porque é que isso aconteceu?

Porque a implementação do Processo não foi devidamente planeada. Foi tudo feito depressa demais. O ministro quis mostrar trabalho, mas esqueceu-se que o trabalho é feito nas instituições e não nos gabinetes.

Voltando à oferta formativa do IPG. Os Cursos de especialização tecnológica (CET's) e a formação ao longo da vida são outras apostas para captar novos públicos?

O IPG, como outras instituições de ensino superior, tem que se socorrer de determinadas medidas e fazer um trabalho mais árduo para captar mais alunos. Com Bolonha, os alunos, em vez de estarem cinco anos nos cursos, passaram a estar três. Logo aí as instituições sentiram uma grande quebra no número de alunos. Por isso, os CET's, os mestrados, as pós-graduações e a formação ao longo da vida são ofertas a ter em conta, sem nunca desvirtuar o facto de sermos politécnico.

Esta questão leva-nos para uma outra, a da reorganização da rede do ensino superior. Esta é uma matéria que deve ser analisada com todo o cuidado...

Nos últimos anos foi-se formando uma opinião, junto dos decisores políticos, dos reitores e dos presidentes, sobre a importância do papel das instituições de ensino superior do interior do país. Por isso, tem que haver um cuidado especial a olhar para estas instituições. O caminho da reorganização não me parece que passe pelo encerramento de instituições. Isto não significa que não possa haver uma ou outra fusão, por exemplo de escolas, mas nunca juntando o politécnico A com o B, ou um politécnico com uma universidade. Esta parece ser uma hipótese que está afastada. Nesta fase o reordenamento vai ser feito pela oferta formativa.

Isso obriga uma atenção redobrada...

Obriga a um cuidado redobrado pois enquanto no reordenamento pela rede nós ficamos a saber aquilo que vai acontecer, pela oferta é mais difícil de perceber quais são os impactos. Temos que estar muito atentos nessa matéria. Devemos estar disponíveis para colaborar e contribuir para esse reordenamento desejável e necessário, mas devemos ter em conta algumas condições, a saber: tem que ser uma reorganização nacional e não apenas junto das instituições do interior; e tem que ser visto no conjunto dos dois subsistemas (é preciso saber se um determinado curso é de cariz universitário ou politécnico) - isto porque se fecharem os cursos com menos alunos, fecham os cursos dos politécnicos e aí encerram os politécnicos. Se queremos um país equilibrado, se queremos manter as instituições e as cidades, então há que deixar os discursos politicamente correctos e tomar as decisões que devem ser tomadas. É claro que isso irá prejudicar algumas instituições, pois, para as do interior crescerem, tem que haver um estancamento nas do litoral. Mas um país serve para isso e é para isso que pagamos impostos, de forma a tratar o país com justiça e igualdade.

Ou seja, nas instituições do litoral deveria haver um corte nas vagas de determinadas áreas?

O reordenamento deve ser feito de duas formas. A primeira passa por planear todo o processo a médio e longo prazo. Um processo que deve ser desenvolvido de forma articulada. Isso pode fazer com que, no prazo de dois a quatro anos, determinadas formações vão acabar em certas instituições para ficarem noutras - e aqui poderá surgir a especialização de instituições. Este é um processo que deve ter em conta a Agência de Avaliação e Acreditação, pois não se entenderia que o Governo viesse com medidas administrativas dizendo que este curso fecha porque só tem 10 alunos, e chegar-se à conclusão que essa oferta tem melhor qualidade que uma outra que tem 30.

O problema é que as instituições do interior não podem esperar por esse processo de médio e longo prazo. E é aqui que surge a segunda forma, a qual passa pelo controlo das vagas, no sentido de reduzir o seu número no litoral e nos grandes centros urbanos para que as instituições do interior possam acolher mais alunos. Se nós temos a capacidade instalada e instituições que têm salas de aula disponíveis, para que é que estamos a acumular 100 alunos numa sala e em auditórios nas faculdades? O Estado não se pode demitir da função de regulação do sistema e de olhar para Portugal como um todo.

E há coragem política para isso?

Se não houver, então demitam-se! Ser político é ter a coragem para tomar decisões em benefício do país. Naturalmente que haverá lóbis mais poderosos que os dos politécnicos do interior do país, mas temos a razão do nosso lado.

A importância do IPG na região é também vincada pelo investimento que gera...

O Politécnico da Guarda está a fazer um trabalho de investigação sobre o impacto que o IPG tem na região. Do ponto de vista económico, se tivermos em conta que por cada euro investido pelo Estado no IPG tem uma reprodução até cerca de três vezes na região, estamos a falar de cerca de 40 milhões de euros. Poderemos estar a falar em cerca de 10 por cento do PIB regional, o que é significativo para o desenvolvimento da região. Os Politécnicos do interior têm sido fundamentais para o desenvolvimento das regiões e são vitais para manter a sustentabilidade do interior.

A qualificação do corpo docente é outra preocupação do IPG. Qual o número de doutorados que prevê para os próximos anos?

Quando há pouco referi que têm que se tomar decisões, há que acrescentar que o factor qualidade deve ser tido em conta. E no IPG temos qualidade. Cerca de 27% do corpo docente está doutorado e dentro de dois anos teremos cerca de 50 por cento dos professores com esse grau.

Ao nível da investigação os politécnicos continuam a ter algumas dificuldades...

A investigação nos politécnicos tem alguns problemas que passam pelo facto dos seus professores concluírem os doutoramentos em universidades, sendo depois convidados a pertencerem a centros de investigação dessas universidades. Isto porque esses centros são financiados de acordo com o número de professores inscritos. Daí que os resultados das suas investigações fiquem associados a essas instituições. Por isso, ao nível da Politécnica - que reúne os politécnicos do centro do país, estamos a procurar sinergias para trabalharmos em conjunto, nesta área de forma a ganharmos massa crítica. A ideia passa por fazer o levantamento daquilo que já existe e que cada um tem, de forma a podermos avançar em conjunto nessa área.

Ainda assim apesar dessas dificuldades foi possível ao IPG transformar um projecto de investigação numa empresa de sucesso...

O projecto Magic Key é de facto um caso de sucesso. O projecto atingiu uma dimensão grande, que nos obrigou a dotá-lo de recursos humanos. Depois de alguma insistência junto do professor Luís Figueiredo, acabámos por criar a empresa. Além disso necessitávamos de procurar outras formas de financiamento, o que conseguimos através da aprovação de uma candidatura ao IAPMEI. Em quatro meses facturaram-se mais de 100 mil euros o que é significativo, pois estamos a falar de soluções destinadas a pessoas com deficiências (logo um mercado pequeno), as quais não visam o lucro imediato, mas sim desenvolvimento de novos produtos e investigação. Neste processo tivemos também o apoio da Fundação da Portugal Telecom. Toda esta dinâmica permitiu-nos também alcançar a internacionalização. Hoje temos produtos na Bélgica, Brasil, Espanha, Holanda e estamos em contactos com a Suíça. Em 2012 iremos exportar cerca de 60% do total dos produtos. Queremos que este projecto sirva de exemplo a outros que possam surgir.

Esta é outra forma de internacionalizar as instituições de ensino superior?

Provavelmente terá mais impacto este tipo de projectos do que a mobilidade de docentes e não docentes entre instituições. Hoje o IPG é citado noutros países devido a este projecto.

 
 
 
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