Constantino Rei, presidente do IPG, em entrevista
Politécnico da Guarda mostra a sua força
O Instituto Politécnico da Guarda tem um
impacto de cerca de 40 milhões de euros na região em que está
inserido. Constantino Rei, presidente da instituição, destaca a
importância que o IPG tem no distrito e lembra a qualidade da
oferta formativa existente.
Sobre a reordenação da rede de
ensino superior e da oferta formativa, Constantino Rei é claro e
diz que tem que haver coragem política para corrigir as assimetrias
entre o litoral e o interior do país.
O presidente do IPG fala ainda do
projecto de investigação Magic Key, desenvolvido no IPG, o qual deu
origem a uma empresa e que já está a exportar soluções de apoio a
pessoas com deficiência. De caminho diz concordar com o antigo
ministro do Ensino Superior, Pedro Lynce: para ele Bolonha foi
mesmo um fiasco!
Estão
previstas novas ofertas formativas para o próximo ano lectivo?
Foram aprovados dois novos
mestrados em Construções Civis e em Turismo e Tecnologias de
Informação e Comunicação (este em parceria com a Universidade da
Beira Interior), os quais poderão abrir no próximo ano. Além desses
dois cursos, não apresentámos mais nenhuma proposta à Agência de
Avaliação e Acreditação, quer ao nível das licenciaturas, quer dos
mestrados.
A aposta do
IPG vai no sentido de abrir novos mestrados, garantindo que os
alunos possam aqui prosseguir os seus estudos?
Temos que perceber que o Processo
de Bolonha fez com que os ciclos de formação sejam diferentes dos
antigos. Ou seja, os mestrados surgem como uma consequência natural
do próprio Processo de Bolonha. Por isso, queremos que nas áreas em
que temos licenciaturas, os nossos alunos possam frequentar aqui os
respectivos mestrados. Isto porque reconhecemos que as
licenciaturas actuais podem ficar aquém daquilo que o mercado
exige. Por isso, iremos continuar a apostar em mestrados
profissionalizantes, nas áreas de formação inicial do IPG, sem
colocarmos de parte a realização de outros mestrados que o mercado
nos venha a exigir.
Abordou a
questão do Processo de Bolonha. O antigo ministro do Ensino
Superior, Pedro Lynce, considera que Bolonha foi um fiasco.
Concorda com a ideia?
Concordo. Bolonha foi e é um fiasco. Foi
aquilo que se suspeitou que visse a ser: uma forma encapotada de
gastar menos dinheiro no ensino superior. Objectivamente Bolonha
não foi mais que a redução dos ciclos de formação. Isto porque a
implementação de novas metodologias acabaria por ser feita, com ou
sem esse Processo, já que é essa a evolução normal das ciências,
das disciplinas, dos métodos e da própria formação das pessoas.
Significa isto, que excepção feita à normalização dos ciclos de
estudo, não surgiram vantagens para o ensino superior português.
Pelo contrário, Bolonha veio introduzir distorções, descriminação e
equívocos à sociedade do tipo: um licenciado de três anos tem as
mesmas competências que um licenciado de cinco?. Por outro lado
veio permitir que algumas instituições atribuam equivalências
automáticas.
E porque é
que isso aconteceu?
Porque a implementação do Processo
não foi devidamente planeada. Foi tudo feito depressa demais. O
ministro quis mostrar trabalho, mas esqueceu-se que o trabalho é
feito nas instituições e não nos gabinetes.
Voltando à
oferta formativa do IPG. Os Cursos de especialização tecnológica
(CET's) e a formação ao longo da vida são outras apostas para
captar novos públicos?
O IPG, como outras instituições de
ensino superior, tem que se socorrer de determinadas medidas e
fazer um trabalho mais árduo para captar mais alunos. Com Bolonha,
os alunos, em vez de estarem cinco anos nos cursos, passaram a
estar três. Logo aí as instituições sentiram uma grande quebra no
número de alunos. Por isso, os CET's, os mestrados, as
pós-graduações e a formação ao longo da vida são ofertas a ter em
conta, sem nunca desvirtuar o facto de sermos politécnico.
Esta
questão leva-nos para uma outra, a da reorganização da rede do
ensino superior. Esta é uma matéria que deve ser analisada com todo
o cuidado...
Nos últimos anos foi-se formando
uma opinião, junto dos decisores políticos, dos reitores e dos
presidentes, sobre a importância do papel das instituições de
ensino superior do interior do país. Por isso, tem que haver um
cuidado especial a olhar para estas instituições. O caminho da
reorganização não me parece que passe pelo encerramento de
instituições. Isto não significa que não possa haver uma ou outra
fusão, por exemplo de escolas, mas nunca juntando o politécnico A
com o B, ou um politécnico com uma universidade. Esta parece ser
uma hipótese que está afastada. Nesta fase o reordenamento vai ser
feito pela oferta formativa.
Isso obriga
uma atenção redobrada...
Obriga a um cuidado redobrado pois
enquanto no reordenamento pela rede nós ficamos a saber aquilo que
vai acontecer, pela oferta é mais difícil de perceber quais são os
impactos. Temos que estar muito atentos nessa matéria. Devemos
estar disponíveis para colaborar e contribuir para esse
reordenamento desejável e necessário, mas devemos ter em conta
algumas condições, a saber: tem que ser uma reorganização nacional
e não apenas junto das instituições do interior; e tem que ser
visto no conjunto dos dois subsistemas (é preciso saber se um
determinado curso é de cariz universitário ou politécnico) - isto
porque se fecharem os cursos com menos alunos, fecham os cursos dos
politécnicos e aí encerram os politécnicos. Se queremos um país
equilibrado, se queremos manter as instituições e as cidades, então
há que deixar os discursos politicamente correctos e tomar as
decisões que devem ser tomadas. É claro que isso irá prejudicar
algumas instituições, pois, para as do interior crescerem, tem que
haver um estancamento nas do litoral. Mas um país serve para isso e
é para isso que pagamos impostos, de forma a tratar o país com
justiça e igualdade.
Ou seja,
nas instituições do litoral deveria haver um corte nas vagas de
determinadas áreas?
O reordenamento deve ser feito de
duas formas. A primeira passa por planear todo o processo a médio e
longo prazo. Um processo que deve ser desenvolvido de forma
articulada. Isso pode fazer com que, no prazo de dois a quatro
anos, determinadas formações vão acabar em certas instituições para
ficarem noutras - e aqui poderá surgir a especialização de
instituições. Este é um processo que deve ter em conta a Agência de
Avaliação e Acreditação, pois não se entenderia que o Governo
viesse com medidas administrativas dizendo que este curso fecha
porque só tem 10 alunos, e chegar-se à conclusão que essa oferta
tem melhor qualidade que uma outra que tem 30.
O problema é que as instituições do
interior não podem esperar por esse processo de médio e longo
prazo. E é aqui que surge a segunda forma, a qual passa pelo
controlo das vagas, no sentido de reduzir o seu número no litoral e
nos grandes centros urbanos para que as instituições do interior
possam acolher mais alunos. Se nós temos a capacidade instalada e
instituições que têm salas de aula disponíveis, para que é que
estamos a acumular 100 alunos numa sala e em auditórios nas
faculdades? O Estado não se pode demitir da função de regulação do
sistema e de olhar para Portugal como um todo.
E há
coragem política para isso?
Se não houver, então demitam-se!
Ser político é ter a coragem para tomar decisões em benefício do
país. Naturalmente que haverá lóbis mais poderosos que os dos
politécnicos do interior do país, mas temos a razão do nosso
lado.
A
importância do IPG na região é também vincada pelo investimento que
gera...
O Politécnico da Guarda está a
fazer um trabalho de investigação sobre o impacto que o IPG tem na
região. Do ponto de vista económico, se tivermos em conta que por
cada euro investido pelo Estado no IPG tem uma reprodução até cerca
de três vezes na região, estamos a falar de cerca de 40 milhões de
euros. Poderemos estar a falar em cerca de 10 por cento do PIB
regional, o que é significativo para o desenvolvimento da região.
Os Politécnicos do interior têm sido fundamentais para o
desenvolvimento das regiões e são vitais para manter a
sustentabilidade do interior.
A
qualificação do corpo docente é outra preocupação do IPG. Qual o
número de doutorados que prevê para os próximos anos?
Quando há pouco referi que têm que
se tomar decisões, há que acrescentar que o factor qualidade deve
ser tido em conta. E no IPG temos qualidade. Cerca de 27% do corpo
docente está doutorado e dentro de dois anos teremos cerca de 50
por cento dos professores com esse grau.
Ao nível da
investigação os politécnicos continuam a ter algumas
dificuldades...
A investigação nos politécnicos tem
alguns problemas que passam pelo facto dos seus professores
concluírem os doutoramentos em universidades, sendo depois
convidados a pertencerem a centros de investigação dessas
universidades. Isto porque esses centros são financiados de acordo
com o número de professores inscritos. Daí que os resultados das
suas investigações fiquem associados a essas instituições. Por
isso, ao nível da Politécnica - que reúne os politécnicos do centro
do país, estamos a procurar sinergias para trabalharmos em
conjunto, nesta área de forma a ganharmos massa crítica. A ideia
passa por fazer o levantamento daquilo que já existe e que cada um
tem, de forma a podermos avançar em conjunto nessa área.
Ainda assim
apesar dessas dificuldades foi possível ao IPG transformar um
projecto de investigação numa empresa de sucesso...
O projecto Magic Key é de facto um
caso de sucesso. O projecto atingiu uma dimensão grande, que nos
obrigou a dotá-lo de recursos humanos. Depois de alguma insistência
junto do professor Luís Figueiredo, acabámos por criar a empresa.
Além disso necessitávamos de procurar outras formas de
financiamento, o que conseguimos através da aprovação de uma
candidatura ao IAPMEI. Em quatro meses facturaram-se mais de 100
mil euros o que é significativo, pois estamos a falar de soluções
destinadas a pessoas com deficiências (logo um mercado pequeno), as
quais não visam o lucro imediato, mas sim desenvolvimento de novos
produtos e investigação. Neste processo tivemos também o apoio da
Fundação da Portugal Telecom. Toda esta dinâmica permitiu-nos
também alcançar a internacionalização. Hoje temos produtos na
Bélgica, Brasil, Espanha, Holanda e estamos em contactos com a
Suíça. Em 2012 iremos exportar cerca de 60% do total dos produtos.
Queremos que este projecto sirva de exemplo a outros que possam
surgir.
Esta é
outra forma de internacionalizar as instituições de ensino
superior?
Provavelmente terá mais impacto
este tipo de projectos do que a mobilidade de docentes e não
docentes entre instituições. Hoje o IPG é citado noutros países
devido a este projecto.