Suplemento

Constantino Rei, presidente do Instituto Politécnico da Guarda
Ensino superior deveria ser gratuito

DSCF1747.JPGConstatino Rei foi reconduzido para mais um mandato à frente do Instituto Politécnico da Guarda. Em entrevista ao Ensino Magazine refere os objetivos principais que tem para a instituição. Frontal, como é seu timbre, faz críticas ao sistema de vagas e ao modo como muitos alunos do ensino secundário ficam de fora do ensino superior. Refere ainda que o ensino superior deveria ser gratuito.

Tomou posse para mais um mandato, quais são as suas grandes prioridades para o Instituto Politécnico de Guarda?

Face ao que tem acontecido nos últimos anos, relativamente à redução do número de alunos, a nossa principal preocupação é estancar esse processo e invertê-lo, se for possível. Iremos desenvolver um conjunto de estratégias que têm esse objetivo e que pretendem captar mais alunos. Esta é uma prioridade fundamental. Depois há uma outra vertente, que passa por colocar o IPG ao serviço da cidade e da região. Ou seja, queremos colocar os nossos conhecimentos e investigação ao serviço das empresas e das organizações.

Neste momento há uma quantidade enorme de jovens que termina o ensino secundário e não se candidata ao ensino superior. Como é que se podem atrair esses jovens?

Fazendo aquilo que outros países já fizeram, tornando a educação pública gratuita. Mas para isso é preciso coragem política. Na Alemanha, por exemplo, o ensino público é gratuito. Esta não será a única questão, mas constatamos que o poder de compra de muitas famílias portuguesas reduziu drasticamente e não têm capacidade para suportar os custos. Se se quisessse atuar, acabando com as propinas, poderíamos ter mais alunos.

E os cursos superiores de curta duração, podem ser benéficos?

Eu e o próprio Conselho Coordenador dos Politécnicos temos mostrado algumas reservas a esta formação. Mas também nunca dissemos que não a queríamos. Aquilo que afirmamos é que não a queremos com este formato. Fomos ouvidos uma única vez sobre um projeto de Decreto Lei. O que aconteceu é que foi montada uma nova formação para os politécnicos contra os politécnicos, em vez de ser feita com os politécnicos. Isso, do ponto de vista político, é um pecado capital. Ainda assim conseguimos minimizar alguns dos efeitos negativos desta nova formação. Não faz sentido co-existirem com os Cursos de Especialização Tecnológica (deixam de ser ministrados nos politécnicos, mas mantêm-se nas escolas profissionais e centros de formação). Nós - politécnicos - demos um passo, na minha opinião errado, de avançar com alguns cursos a título experimental. O que temos que fazer é tirar partido do melhor que estes cursos possam ter.  Há vários aspetos que podemos potenciar.

É importante que os jovens tenham a noção que se forem para um CET e pretenderem ingressar no ensino superior, terão que fazer um exame, enquanto que se fizerem um curso de técnicos superiores profissionais alinhado com a instituição, o acesso é direto e terão direito a alguma creditação (equivalência de disciplinas).

O público a abranger é o mesmo...

É exatamente o mesmo. Esta oferta está alinhada para acolher os alunos dos cursos profissionais.

Recentemente o presidente do Conselho Nacional de Educação, David Justino, referiu que a especialização das instituições de ensino superior poderia ser um caminho para se manter a rede de oferta existente. É dessa opinião?

Posso concordar com o princípio. No entanto, não considero que esse seja o caminho. Isso só faria sentido se a especialização fosse generalizada em todo o país e a todas as instituições. Se a intenção for repensar todo o sistema de ensino superior português, criando núcleos de especialização nos diferentes locais, parece-me uma boa ideia. Mas tenho dúvidas que possa ter pernas para andar, pois isso iria mexer com as universidades e todos nós sabemos os lobis que representam.

No seu discurso criticou muito o atual sistema de vagas. O que é que deve ser feito?

Não podemos enterrar a cabeça na areia. Convivemos durante anos num regime  em que praticamente não existiam essas provas de ingresso ao ensino superior, e de repente passámos do 8 para o 80. O que se verifica é que há uma grande disparidade entre as notas obtidas nas provas de exame e as classificações internas do ensino secundário, num desvio que chega a atingir 3 e 4 valores. Isto demonstra que alguma coisa está mal no sistema. Não podemos afirmar se o problema é dos exames ou do ensino secundário. Mas se me perguntar se devemos confiar mais num sistema que avalia o aluno ao fim de 12 anos de escolaridade, ou num que avalia o estudante em duas horas de exame, respondo-lhe que  confio mais no sistema de 12 anos. Perante este cenário, em que há esta divergência, em que as notas das provas de ingresso são muito baixas, em que o grau de exigência das provas não se coaduna com o que é exigido no ensino secundário, nós temos que retirar alguma carga excessiva às provas de ingresso. Além disso, esta carga excessiva e o vício que temos em Portugal pelas notas e classificações, às vezes, pode levar a que as escolas inflacionem as classificações internas.

Será justo um aluno que no 10º, 11º e 12º anos teve média de 13 valores e que numa prova de valores teve 8,5 valores ser afastado sistema de ensino superior? E obrigá-lo a estar mais um ano em casa, com a família a pagar explicações para que no ano seguinte tente de novo a entrada? Nós não recuperávamos antes? Perante este problema, e estamos numa situação de emergência nacional, pois a falta de alunos já chegou às universidades, teremos que fazer alguma coisa. Como? Baixando a influência que os exames têm na nota de candidatura.

Essa é uma das variáveis, a outra está relacionada com o número de vagas no litoral e no interior do país?

Essa é uma guerra perdida, pelo menos com este governo. Pois se não quiseram resolver o problema em três anos, não é agora que o vão fazer. Mas aquilo que atrás referi é uma medida que pode ser implementada no próximo ano.

Ainda em relação às vagas, foi também reclamado para que o despacho das vagas fosse apresentado mais cedo às instituições...

Já há muitos anos que andamos a reclamar isso. Nós começamos a fazer a divulgação a partir de finais de fevereiro. Por isso, nessa altura precisamos de saber quais os cursos e o número de vagas que vamos abrir e temos disponíveis. Tenho esperança que isso irá acontecer este ano. No caso das vagas para o «estudante internacional» já existe o despacho, e penso que até março deveremos ter o despacho de vagas. Com a entrada de João Queirós para a Direção Geral de Ensino Superior, o qual tem conhecimento do que faz falta às instituições, estou convicto que haverá sensibilidade para isso.

O programa Mais Superior foi lançado este ano, mas além de ter sido regulamentado tarde de mais, os critérios também não foram ao encontro das instituições?

Foi um programa mal regulamentado. Os critérios foram perversos. O mérito deve ser valorizado, mas não o pode ser da forma generalista como aconteceu. Pois as bolsas foram atribuídos aos alunos que têm melhores classificações, quando nós temos que as atribuir no sentido de atrair alunos para cursos onde temos falta de alunos. Bastava que nos tivessem perguntado quais eram os cursos a que daríamos preferência. Obviamente que dentro de cada curso o mérito académico seria tido em conta. A grande maioria dos alunos que vai para medicina e para os cursos de saúde,  normalmente são oriundos de extratos sociais mais elevados, e foram os mais beneficiados.

E há abertura para isso ser mudado por parte do Secretário de Estado?

Sim, estou convencido que isso vai ser feito. Espero que venha a tempo da primeira fase. Esse é um instrumento importante. Quando vamos às escolas secundárias queremos dizer aos alunos que têm este programa.

No que respeita ao último objetivo da sua estratégia - colocar o instituto ao serviço das empresas e da região - o IPG é já uma referência, ao potenciar o aparecimento de uma empresa ligada às novas tecnologias...

Esse é o exemplo que nós gostaríamos de replicar. Não é fácil o convívio entre o empreendedorismo e o meio académico, a investigação e a prestação de serviços. Mas essa empresa é um exemplo de sucesso, na medida em que a empresa está em funcionamento há três anos, tem uma saúde financeira boa, embora o objetivo não seja ganhar lucro, mas sim desenvolver soluções tecnológicas para públicos alvos específicos a custos controlados. Falamos de soluções que sejam aceitáveis do lado do cliente. E se tivermos que prescindir do lucro fazêmo-lo. Outro aspeto importante é que o pacto social da empresa impede a distribuição de lucro entre sócios. Os lucros obtidos são para aplicar na investigação.

Como é que é possível gerir uma instituição sem conhecer a verba que é atribuída em Orçamento de Estado?

Faz-se uma gestão de mercearia. Vive-se o dia a dia. E isso é um pouco angustiante, pois temos o nosso plano de atividades, que gasta recursos. Infelizmente, do ponto de vista financeiro e da gestão orçamental das instituições e naquilo que são os grandes projetos andamos a navegar à vista. Em função das coisas que aparecem vamos reagindo. Planeamos, mas nunca sabemos se conseguimos implementar os nossos projetos.

Sou defensor da mudança do sistema de financiamento. O Governo deveria, numa base de lesgislatura, definir qual era a percentagem do PIB afeta à educação. As instituições teriam uma noção daquilo que poderia vir a receber. Se houvesse crescimento no PIB nós já sabíamos que haveria mais verbas, e se acontecesse o contrário saberíamos que haveria uma redução. Mas também devo dizer, que a gestão financeira é o aspeto que menos me preocupa, pois a gestão estrutural - como o número de alunos - é importantíssima. E porque temos uma estrutura de custos que depende pouco de nós, o Estado tem que assumir a sua responsabilidade. Por exemplo, nós reduzimos o número de docentes nos últimos dois anos, mas aumentámos a despesa em muito mais. E isso deveu-se ao regime transitório da carreira docente aprovado na Assembleia da República. Ou seja, tomei uma decisão de gestão em reduzir o número de docentes e em fechar as escolas nos períodos não letivos para não gastar energia e gás, e a despesa aumentou. Eu não deixarei de fazer o que tenho de fazer. Quando faltar o dinheiro, o Governo tem que cá colocar o dinheiro. Porque quem assumiu as responsabilidades e aumentou os descontos para a Caixa Geral de Aposentações e da ADSE foi a Assembleia de República e o Governo.

 
 
 
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