Suplemento

Constantino Rei, presidente do instituto politécnico da guarda em entrevista
Centro de excelência do setor automóvel nasce na Guarda

536282_382722465095590_1741197841_n.jpgO Instituto Politécnico da Guarda assinalou mais um aniversário com os olhos postos no futuro. Constantino Rei, o seu presidente, aproveitou a ocasião para anunciar o embrião de um centro de excelência ligado ao setor automóvel.
Em entrevista ao Ensino Magazine, aquele responsável fala desse e de outros objetivos da instituição e destaca ainda a apresentação, à UNESCO, da criação do geoparque da Serra da Estrela, a qual resultou de um desafio feito pelo IPG às autarquias da região.

Durante o aniversário do IPG foi anunciada a intenção de se criar na Guarda um centro de investigação para a indústria automóvel. Que passos já foram dados e de que forma é que esse centro pode ser diferenciado para o IPG e para a região?
Esta aposta surgiu de muitos contactos e de termos auscultado o cluster mais importante da região, o qual tem muitas empresas ligadas a esse setor. Um dos problemas que fomos ouvindo está relacionado com o recrutamento de quadros especializados. Desses contactos, em que também esteve envolvido o presidente da Câmara da Guarda, verificámos a dificuldade que as empresas têm para contratar, por exemplo, engenheiros mecânicos. Ou seja há uma grande carência de quadros. Aquilo que definimos como prioridade, nesta primeira fase, e que poderá avançar de uma forma mais rápida, foi o Instituto Politécnico da Guarda montar um curso de técnico superior profissional (TESP) organizado com as empresas. Isto é, uma formação que procura dar resposta às necessidades das empresas. Numa fase posterior, poderemos vir a dar resposta a outras necessidades, recuperando, por exemplo, a licenciatura em engenharia mecânica que o Politécnico da Guarda já teve.

Esse TESP pode avançar no próximo ano letivo?
Sim, esse é o objetivo. Até ao final de janeiro iremos apresentar a proposta à Direção Geral de Ensino Superior para abrir esse curso em 2018.

Para além dos TESP's e da licenciatura, esse centro poderá desenvolver também formações específicas de curta duração?
Hoje em dia nestas indústrias os desafios são muitos. Por exemplo, na área da soldadura a laser. Não há qualquer formação nessa área em Portugal. As empresas queixam-se que têm que enviar os seus colaboradores e técnicos para o estrangeiro para se qualificarem. Este exemplo é extensível a outras áreas. Por isso, temos que investir também em tecnologias, em processos e em estratégias de formação mais avançadas do que o tradicional.
Esta ideia é partilhada pela autarquia da Guarda, e desta forma surgiu a aposta de, a partir do Politécnico, se poder desenvolver um centro de excelência para a indústria automóvel, que é também um laboratório prático de suporte para apoio a todas estas empresas. Isto permitirá também alavancar outros projetos na área da investigação, desenvolvendo novos métodos e processos. O desejável é que, em conjunto com a Câmara, pudéssemos ter aqui um centro de excelência e de investigação nesta área e para todo o país.

IMG1518.JPGA localização do Centro será no Politécnico ou noutra estrutura?
Neste momento isso não está definido. O Politécnico tem recursos técnicos, o que não significa que não se tenha que fazer algumas atualizações no que respeita a equipamentos, pois possuímos laboratórios de engenharia mecânica, eletrotecnia, robótica e CAD. Espaços e laboratórios existem. Se se chegar à conclusão que o melhor local para acolher esse centro é o Politécnico, nós aceitamos isso como uma boa solução. Mas se não for esse o entendimento, não faremos dessa uma questão de finca pé. Uma coisa é certa, será sempre um elemento de suporte à estratégia formativa do IPG e às necessidades das empresas.

Até ao final de janeiro, as instituições de ensino superior poderão apresentar propostas para a criação de centros de investigação junto da Fundação para Ciência e Tecnologia (FCT). O IPG vai avançar com algum centro ou irá associar-se a outras instituições?
Não iremos avançar sozinhos. Politécnicos como o da Guarda podem ter muitos investigadores, mas serão sempre de áreas diferentes, pelo que teremos dificuldade em criar um núcleo extenso e forte com professores doutorados e que façam investigação. Por isso, definimos uma estratégia que passa por integrar outros centros de investigação sediados noutras instituições, garantindo um papel ativo nesses centros e, ao mesmo tempo, criar, sempre que possível, unidades de gestão no IPG de diferentes centros. Por exemplo, na área do turismo, será criado um centro de investigação que envolverá várias instituições, e nós teremos no Politécnico um polo, ou seja uma unidade de gestão desse centro, a qual acolherá docentes de investigadores dos politécnicos da Guarda, Castelo Branco e Viseu. A ideia é que possamos criar unidades de gestão de diferentes centros de investigação. Na área das engenharias temos aqui instalada uma unidade de gestão de um centro de investigação da UBI.
Nesta matéria temos que perceber que não temos dimensão para termos centros de investigação sozinhos. Sou mais adepto de integrar centros de investigação fortes e fazer parte de redes de parcerias fortes do que termos centros fracos e sem dimensão, até porque poderíamos vir a ter alguns dissabores. Atualmente, e muito bem, exige-se que quando os docentes do Politécnico da Guarda querem integrar um centro de outra instituição, o presidente do IPG tenha que dar essa autorização. Se eu decidisse que não assinava essa autorização com o argumento que esses docentes teriam que integrar um centro de investigação que viesse aqui a ser criado, poderia acontecer que esse centro não fosse acreditado, e que os professores ficassem privados de poder investigar. Isso seria mau para eles, mas também para a instituição.

Além do turismo, há outras unidades de gestão a instalarem-se no IPG?
Estamos a trabalhar nesse sentido, nomeadamente nas áreas da educação e da gestão.

No ano passado o Ministro do Ensino Superior falou num desafio para o Politécnico da Guarda, que designou como "Montanha do Conhecimento". Em que ponto é que se encontra esse projeto?
Há dois projetos em curso: a criação de um laboratório colaborativo, o COLAB Montanha, que está a ser desenvolvido em parceria com o Politécnico de Bragança, e que está a ser apreciado pela FCT; e a rede de investigação em montanha, que tem três projetos piloto, sendo que o da "Serra da Estrela" é liderado pelo Politécnico da Guarda. Esta rede já foi formalmente constituída e estamos a trabalhar no seu plano de atividades.

A criação do Geoparque da Serra da Estrela foi um dos desafios que o IPG lançou aos municípios da região. A candidatura já foi feita à UNESCO, para quando a sua aprovação?
A nossa expectativa é que a candidatura seja aprovada no outono deste ano, mas essa decisão até poderá ser feita mais cedo. Caso não se concretize a sua aprovação este ano, ela será feita na primavera de 2019.

Era uma forma ótima de terminar o seu mandato?
Sim, seria uma boa forma de terminar o mandato. Seria muito positivo deixar a semente lançada, para que quem vier a seguir a possa desenvolver e colher os frutos desta semente.

Neste processo, como é que analisa o envolvimento das autarquias e das próprias populações para a criação do geoarque?
Tudo aquilo que é novo e arrojado tem um processo de aprendizagem longo. Aquilo que o Politécnico e as autarquias fizeram foi acreditar nesta ideia, garantindo os apoios necessários. Foi muito gratificante chegar à última assembleia de parceiros e verificar o entusiasmo de todos, pois reconheceu-se o trabalho que foi efetuado. Este projeto tem vindo crescer e está ganhar vida. As pessoas acreditam nele, e as autarquias têm sido fundamentais para a sua concretização.

Mudando um pouco de assunto. No que respeita ao financiamento das instituições de ensino superior que avanços é que houve junto do Ministério?
Não houve evoluções desde dezembro. O Ministério comunicou reforços às instituições em dificuldades financeiras, e às outras indicou que as instituições que tinham saldos positivos que os gastassem, em vez de receberem os reforços financeiros a que teriam direito e que ficaram acordados. Depois disso e até hoje (dia 10 de janeiro) não houve qualquer evolução. O que se exige é uma decisão política por parte do Ministério das Finanças, pois o Ministério do Ensino Superior já assumiu que as instituições têm direito a essas verbas, independentemente de terem, ou não, saldos positivos. Temo que se esteja adiar essa decisão para o Governo não assumir os compromissos. Há vontade política, mas tem que haver decisão.

A questão do financiamento começa a ser transversal a todos os governos. Na sua perspetiva isso decorre do quê?
Há uma falta de estratégia para o ensino superior. O que verificamos é uma gestão do dia a dia. O que temos são alterações legislativas sucessivas, há novos desafios para as instituições, e temos um Estado que tem um bolo (financeiro) que, de ano para ano, é cada vez menor, e depois vai dividindo o mal pelas aldeias, sem nenhum critério. Cada vez mais instituições não têm o mínimo de financiamento para se manterem em funcionamento, pelo que chegam ao final do ano e têm que pedir reforços no orçamento. E isto sucede, e vai continuar a suceder com mais frequência, quanto menor for a instituição. As maiores têm mais capacidade de gerar receitas próprias, de recorrer a projetos de investigação de maior envergadura. As mais pequenas, onde o número de alunos não cresce, onde os custos fixos são mais elevados, e onde não há essa capacidade de gerar receitas próprias, terão mais dificuldades. Não consigo compreender como é que o Estado já não financia as despesas que as instituições de ensino têm com o pessoal. Não entendo como é que a ação social é paga com fundos comunitários. É um Estado, sem recursos, que está a viver de fundos comunitários, que um dia vão acabar, e a satisfazer necessidades que deveriam ser financiadas por si com fundos que não lhe pertencem. Não perspetivo nenhuma alteração significativa, no curto prazo. Se não houver reorganização no ensino superior, quer da rede, quer da oferta formativa, vamos passar cada vez mais dificuldades.

E depois vem a questão da desertificação…
É outro problema. Enquanto que há instituições que apenas precisam de abrir a porta para terem alunos, no interior do país isso não acontece. Temos que abrir a porta, construir caminhos e estabelecer pontes para que eles venham até nós. A procura de alunos estrangeiros é uma alternativa. No nosso caso tem permitido o funcionamento de alguns cursos. É uma forma transitória de atravessar este problema.

 
 
 
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