Bocas do Galinheiro
Vem aí o Mascarrilha
Muitas das
nossas brincadeiras de criança andavam à volta das coboiadas, e de
alguns heróis que na altura preenchiam o nosso imaginário: Buck
Jones, Cisco Kidd e, entre outros, claro, o Mascarilha. Aos
domingos à tarde era religiosa a espera por mais um episódio, com
dobragem em português do Brasil, com um sotaque que, hoje, será
difícil imaginar pior, ao nível de Pepe Legal e Babalu, Quick
Draw McGraw no original, de Hanna e Barbera, outros desenhos
animados dobrados a que assistíamos nesses gloriosos anos 60 do
século passado, era a nossa RTP uma criança. E, sorte a nossa, o
único canal, porque senão o dono do café onde acompanhávamos estes
momentos de delícia, oportunidade tivesse e o canal seria outro.
Graças a Deus que não havia mais nenhum. A troco de um baleizão,
adquirido com os cinco tostões duramente negociados com a entidade
paternal a troco de promessas vagas de bom comportamento futuro, lá
tínhamos direito a passar a tarde em frente ao televisor e ouvir o
glorioso "Hi-Yo, Silver Avante" (Away, na versão original), ao som
daquilo que só muitos anos mais tarde vim a saber que era a
abertura da ópera de Rossini "Guilherme Tell". Coisa estúpida,
pensei, toda a gente sabia que era a música do Mascarilha. Adiante.
Atravessando o écran a galope, arma em punho e disparando não se
sabe contra quem, não havendo nenhuma interrupção, caso raro na
altura, lá aparecia o nosso cavaleiro solitário montado no seu
cavalo Silver, veloz como a luz, e seu fiel amigo índio, Tonto, a
máscara preta cobrindo-lhe o rosto, enfrentando os maus e
defendendo os fracos, impondo a lei e a ordem no primitivo oeste,
mais uma vez o Mascarilha enfrentava o perigo! E assim foi por 221
episódios. Não sei quantos vi, mas cada um deles valia cada minuto
da sua duração.
Reza a lenda de Lone Ranger, de seu
nome John Reid, que um grupo de seis "Texas Rangers", que integrava
também o seu irmão, o capitão Dan Reid, sofreu uma emboscada da
quadrilha de Butch Cavendish, dizimando todo o grupo, sendo que
John, apesar de dado como morto, sobreviveu e foi salvo por um
índio que lhe tratou dos ferimentos. Esse índio era Tonto, um
Navajo que a família Reid havia salvo uns anos antes. Curado e de
boa saúde, John Reid com seu fiel e reconhecido amigo índio, decide
vingar-se daqueles que o atacaram e combater todos os fora-da-lei
que se atravessem no seu caminho, tomando a identidade de Lone
Ranger, usando a tal máscara preta e nas duas pistolas, balas de
prata, a sua imagem de marca.
The Lone Ranger, o famoso
Mascarilha, nasceu numa rádio de Detroit, da imaginação de George
Washington Trendle e pela pena do escritor Fran Striker (o criador
de The Green Hornet), em 1933, onde era protagonizado por Bruce
Bemmer. Depressa passou para a banda desenhada (distribuída em
Portugal pela saudosa Agência Portuguesa de Revistas) e depois para
a televisão e o cinema. Em 1938 aparece num primeiro serial de 15
episódios com o título de "The Lone Ranger" e com os actores Lee
Powell como mascarilha e o Chief Thundercloud no papel do índio
Tonto. Mas é com a série televisiva produzida pela ABC de 1949 a
1957, com por Clayton Moore (Lone Ranger) e Jay Silverheels (Tonto)
que o nosso herói, ou melhor, a nossa dupla de heróis atinge o seu
ponto alto (pelo meio John Hart fez alguns episódios como
mascarilha), o que teve como sequência lógica a adaptação da série
para cinema. A primeira em 1956, "The Lone Ranger" (O Homem da
Mascarilha), realizada por Stuart Heisler, e "The Lone Ranger and
The Lost City Of Gold" (A Cidade do Ouro, 1958), de Lesley
Selander, com Clayton Moore e Jay Silverheels, quem mais. Em 1981
William A. Fraker dirige "The Legend of the Lone Ranger" (A Máscara
do Ranger), com Klinton Spilsbury, Michael Horse e Christopher
Lloyd, este no papel do líder dos Cavendish, mas o filme foi um
fiasco.
Eis senão quando os responsáveis
pelos blockbusters, "Piratas das Caraíbas", o produtor Jerry
Bruckheimer e o actor Johnny Depp, pela mão do realizador Gore
Verbinski, lançam mão de uma versão século XXI do justiceiro
mascarado, com Depp como Tonto e Armie Hammer no papel de
Mascarilha/John Reid. Um filme que se prevê com muita aventura e
alguma comédia à mistura, marca de água dos recentes papéis do
pirata mais famoso do século. Com estreia prevista para Agosto, o
filme não anda longe da história original, chama-se mesmo "The Lone
Ranger", em português O Mascarilha, quem sabe o ressuscitar do
super herói e do seu fiel amigo, afinal a transversalidade de um
certo cinema americano de que por acaso, ou não, gosto muito.
Até à próxima e bons filmes!