Editorial
Entre a tradição e a renovação
Para o bem e para o mal, os sistemas educativos
europeus têm cumprido a tarefa de transmitir o saber através de um
conjunto de procedimentos, complexos e elaborados, por forma a que
os alunos se insiram na cultura do seu país e salvaguardem o seu
património cultural, cujo principal suporte é, obviamente, a
língua.
E este é um dos aspectos em que
se detecta o paradoxo de algumas políticas educacionais no seio dos
países que constituem a Comunidade Europeia. É indiscutível que uma
boa parte da história e da cultura dos últimos séculos são comuns à
generalidade dessas nações europeias. Mas não é menos verdade que
as tradições, a língua, os costumes e, até, as religiões constituem
uma rica diversidade. Logo, a cultura europeia revela-se como um
mosaico cujos componentes são a própria garantia da riqueza
cultural desta "união", já que esta riqueza se alicerça tanto em
valores de ressonância universal, quanto no património cultural e
linguístico de algumas pequenas regiões.
Reconhece-se que a dimensão
europeia da educação se objectiva, precisamente, neste tomar de
consciência da cultura própria da Europa, no contexto das suas
diversidades. Aceita-se, no terreno linguístico, que, a par do
ensino das línguas "maioritárias", se deve fomentar a aprendizagem
das línguas "minoritárias" e, mesmo, as de cunho mais "regional". E
são muitos os programas que se criaram para o apoio dos professores
e das escolas que quisessem adoptar uma estratégia cultural de
diversificação e de respeito pelas diferenças culturais.
Genericamente, é neste contexto
que surgem as continuidades e semelhanças da paisagem educativa
europeia. Todavia, neste mosaico cultural, emergem muitos e novos
elementos que irão modificar, pouco a pouco, aquela fisionomia, já
que vários desses fenómenos se encontram relacionados com a
mundialização das trocas e a acelerada globalização.
Desde as últimas décadas que a
cultura anglo-saxónica, sob as mais variadas formas (língua,
música, moda, hábitos alimentares...), corre o risco de se
transformar numa cultura hegemónica, face à diversidade europeia.
Mas é, sobretudo, face às novas tecnologias da informação e da
comunicação que a função educativa se encontra na emergência de uma
séria redefinição dos saberes e dos processos que ajudam à sua
transmissão.
A informatização de todos os
sectores de actividade, as auto--estradas da informação, as redes
sociais, as bases de dados digitais… colocam a educação e os
educadores face a novas fontes do saber, cuja natureza oscila entre
o que é o conhecimento e o que é a simples informação, entre os
"velhos" métodos de trabalho na sala de aula e o domínio escolar
dos mais recentes "tecnicismos", o que induz a busca de novas
estratégias de actuação, a procura de novas culturas profissionais
e a descoberta de mais aptos caminhos que aproximem os alunos da
aprendizagem dita formal.
Hoje, os sistemas educativos
europeus não poderão alhear-se de uma formação que incorpore a
oferta de informação e formação "digital", bem como as competências
necessárias à sua utilização e divulgação.
Este novo sintoma de
multiculturalismo, gerador de novas diversidades sociais e
culturais, carregam consigo, também, uma outra necessidade de
revisão e de redefinição do tradicional funcionamento dos sistemas
escolares, em geral, e, em particular, do desempenho dos
professores e dos educadores na sala de aula.
Ninguém ignora este desafio.
Porém, entre a tradição e a renovação há que ser muito prudente. É
que nunca deveremos esquecer que uma escola completamente
submergida pelo tecnicismo pode levar a esquecer que a principal
finalidade da educação continua a ser, em nosso entender, a procura
dos caminhos do humanismo.