Andreia Vale, pivô da CMTV
A jornalista que gosta de brincar com as palavras
Entra-nos em casa todos os dias, à hora do almoço,
na CMTV. Andreia Vale trata a câmera por tu e revela o que a atrai
na origem de muitas das palavras que usamos diariamente
«Da boca para fora» é o seu terceiro livro. Depois de um
livro sobre expressões, outro sobre superstições, agora é a vez de
explorar um sem número de palavras que utilizamos, quase sem
pensar, no dia a dia. Trata-se de um livro de cultura
geral?
Não. O livro é sobre coisas de que eu gosto. Neste caso, são
palavras. E o critério é, única e exclusivamente, meu. Eu tenho,
quase diariamente, uma espécie de brincadeira com os meus amigos -
que denominei «words i like» (as palavras de que eu gosto) - em que
partilho palavras que são do meu agrado. E da mesma forma que fiz
um livro sobre a origem das expressões, agora foi a vez de ir às
origens das palavras que dizemos da boca para fora. E para além de
serem palavras de que eu gosto, são palavras que utilizo e que me
soam bem. E também escolhi palavras que se referem a coisas que eu
odeio, por exemplo «borbotos».
Pelo feed back que lhe chega, existem muitas pessoas que
têm a mesma curiosidade sobre a raiz das palavras?
Sem dúvida. São pessoas parecidas comigo e que se perguntam a elas
próprias: «de onde raio vem esta palavra?», «o que é que isto
significa»? No outro dia, do nada, surgiu-me a palavra
«parcimónia», soou-me bem, e pus-me a investigar as origens.
Por outro lado, há uma palavra que nenhuma mulher deve usar, a
menos que seja mecânica, que é «brecagem». Eu adoro esta palavra.
Da mesma forma que adoro o nome «Frederica», apesar de não ter
nenhuma na família.
Mas também acaba por recuperar expressões que não utilizou
no primeiro livro…
Sim, algumas não tive oportunidade de colocar nesse livro, outras
nasceram do trabalho de pesquisa e outras foram-me aconselhadas por
leitores que me abordaram nesse sentido.
Como é que constrói o trabalho de pesquisa?
Vou tomando notas regulares, à medida que me surgem palavras ou
expressões que me interessam, e faço partilhas diárias nas redes
sociais com os meus amigos.
O gosto pelas palavras explica-se pelo facto de ser
jornalista de profissão?
Para começar eu «falo pelos cotovelos», como se costuma dizer. Sou
muito sociável a esse nível. Mas não vou negar que a minha
profissão influencia este gosto pelas palavras. Até porque seria
estranho que uma jornalista gostasse de…equações. No meu caso seria
impossível, até porque odeio matemática e sou péssima com
números.
Diante do ecrã tem de ter alguma parcimónia para não
recorrer a algumas palavras ou expressões que surgem no seu
livro?
Isso acontece porque, de alguma forma, os jornalistas,
especialmente os da TV, são «castrados» para não usarem expressões
populares, adágios ou expressões correntes, etc. E, como diz o
povo, o fruto proibido é o mais apetecido, pelo que aproveitei esta
oportunidade que tenho para brincar com as palavras e as expressões
e usá-las como se de uma piscadela de olho se tratasse.
O marcador que acompanha o livro convida o leitor a
escrever a sua palavra favorita. Eu escolhi «saudade». Qual é a
sua?
Acho que vou deixar o meu marcador em branco, mas confesso que
«saudade» é uma das minhas palavras favoritas. Até por motivos
pessoais, porque encontro-me, há três anos, numa relação à
distância e são naturais as saudades. Mas pelo lado engraçado, eu
diria que acho o máximo a palavra «fornicoque».
«Memes», «selfies», «LOL», «WTF», «emoji», «spam», «drone»
e «fixe». São algumas palavras que estão no livro e que normalmente
são associadas a uma faixa etária mais jovem. Pensa que este pode
ser um livro útil para os mais novos?
Admito que sim, mas os meus livros são como os legos: dos 5 aos
99. Tive a informação de avós que leram os meus livros anteriores
aos seus netos, mas penso que a ligação ao livro vai derivar do
gosto e da curiosidade que os potenciais leitores tenham pela
língua portuguesa e pelo léxico em geral.
Sempre quis ser jornalista?
Sim. Sempre tive um encanto pela televisão e pela vontade de
comunicar com as pessoas. O José Alberto Carvalho, que foi meu
professor de atelier de jornalismo de televisão, disse um dia que
«parecia que a câmera gostava de mim». É um bom elogio e de facto
eu sempre me senti à vontade diante de uma câmera, em direto ou
gravado.
Fundou a SIC-Notícias em 2000 e em 2013 foi fundar a CMTV.
O que recorda do nascimento de um e do outro
projeto?
Eu entrei na SIC-Notícias mal acabei a faculdade e foi, de facto,
muito especial. Éramos todos muito novinhos, mas tínhamos a
retaguarda dos colegas da SIC que já acumulavam muitos anos de
carreira. Na CMTV aconteceu mais ou menos o mesmo, com imensos
colegas que estavam a ter a sua primeira experiência profissional.
E porque já tinha sentido isso na pele, tive grande empatia com
estes colegas, «colando-me», de alguma forma, a eles.
Apresenta o noticiário da hora do almoço na CMTV. Como
reage quando tem de lidar com um «Alerta CM»?
Naturalmente. Eu gosto do sem rede, adoro um bom improviso e fui
feita para fazer improvisos. É um momento de muito stress, mas ao
mesmo tempo de desafio profissional. É onde eu me sinto melhor,
porque me permite ser criativa e «distribuir jogo», como se costuma
dizer. Se eu pudesse, tinha «Alertas CM» todos os dias, só não
gosto é daqueles que são muito maus.
«Fake news» é outra expressão que vem no livro. Aplicada
ao jornalismo da atualidade, como é que os profissionais e os
consumidores de informação se podem blindar contra
elas?
Não acreditando na primeira coisa que leem, cruzando fontes e
informações e mais do que um órgão de informação. E, em última
analise, se não tiverem a certeza, façam o trabalho de um
jornalista: pesquisem e perguntem.
CARA DA
NOTÍCIA
A paixão pelo jornalismo
Andreia Vale nasceu em Lisboa, em
1978. Licenciou-se na Escola Superior de Comunicação Social na
primeira turma de Jornalismo, para entrar, de imediato, como
estagiária, para o grupo de fundadores da SIC--Notícias, em 2000.
Depois de onze anos em Carnaxide, mudou-se para a CMTV, onde
apresenta o noticiário da hora de almoço. «Da Boca para Fora» é o
terceiro livro que escreve depois de «Puxar a brasa à nossa
sardinha» e «Cruz credo bate na madeira».
Nuno Dias da Silva
Jorge Nogueira | DR