Entrevista

Andreia Vale, pivô da CMTV
A jornalista que gosta de brincar com as palavras

DSC4789.JPGEntra-nos em casa todos os dias, à hora do almoço, na CMTV. Andreia Vale trata a câmera por tu e revela o que a atrai na origem de muitas das palavras que usamos diariamente

«Da boca para fora» é o seu terceiro livro. Depois de um livro sobre expressões, outro sobre superstições, agora é a vez de explorar um sem número de palavras que utilizamos, quase sem pensar, no dia a dia. Trata-se de um livro de cultura geral?
Não. O livro é sobre coisas de que eu gosto. Neste caso, são palavras. E o critério é, única e exclusivamente, meu. Eu tenho, quase diariamente, uma espécie de brincadeira com os meus amigos - que denominei «words i like» (as palavras de que eu gosto) - em que partilho palavras que são do meu agrado. E da mesma forma que fiz um livro sobre a origem das expressões, agora foi a vez de ir às origens das palavras que dizemos da boca para fora. E para além de serem palavras de que eu gosto, são palavras que utilizo e que me soam bem. E também escolhi palavras que se referem a coisas que eu odeio, por exemplo «borbotos».

Pelo feed back que lhe chega, existem muitas pessoas que têm a mesma curiosidade sobre a raiz das palavras?
Sem dúvida. São pessoas parecidas comigo e que se perguntam a elas próprias: «de onde raio vem esta palavra?», «o que é que isto significa»? No outro dia, do nada, surgiu-me a palavra «parcimónia», soou-me  bem, e pus-me a investigar as origens. Por outro lado, há uma palavra que nenhuma mulher deve usar, a menos que seja mecânica, que é «brecagem». Eu adoro esta palavra. Da mesma forma que adoro o nome «Frederica», apesar de não ter nenhuma na família.

Mas também acaba por recuperar expressões que não utilizou no primeiro livro…
Sim, algumas não tive oportunidade de colocar nesse livro, outras nasceram do trabalho de pesquisa e outras foram-me aconselhadas por leitores que me abordaram nesse sentido.

Como é que constrói o trabalho de pesquisa?
Vou tomando notas regulares, à medida que me surgem palavras ou expressões que me interessam, e faço partilhas diárias nas redes sociais com os meus amigos.

O gosto pelas palavras explica-se pelo facto de ser jornalista de profissão?
Para começar eu «falo pelos cotovelos», como se costuma dizer. Sou muito sociável a esse nível. Mas não vou negar que a minha profissão influencia este gosto pelas palavras. Até porque seria estranho que uma jornalista gostasse de…equações. No meu caso seria impossível, até porque odeio matemática e sou péssima com números.

Diante do ecrã tem de ter alguma parcimónia para não recorrer a algumas palavras ou expressões que surgem no seu livro?
Isso acontece porque, de alguma forma, os jornalistas, especialmente os da TV, são «castrados» para não usarem expressões populares, adágios ou expressões correntes, etc. E, como diz o povo, o fruto proibido é o mais apetecido, pelo que aproveitei esta oportunidade que tenho para brincar com as palavras e as expressões e usá-las como se de uma piscadela de olho se tratasse.

O marcador que acompanha o livro convida o leitor a escrever a sua palavra favorita. Eu escolhi «saudade». Qual é a sua?
Acho que vou deixar o meu marcador em branco, mas confesso que «saudade» é uma das minhas palavras favoritas. Até por motivos pessoais, porque encontro-me, há três anos, numa relação à distância e são naturais as saudades. Mas pelo lado engraçado, eu diria que acho o máximo a palavra «fornicoque».

«Memes», «selfies», «LOL», «WTF», «emoji», «spam», «drone» e «fixe». São algumas palavras que estão no livro e que normalmente são associadas a uma faixa etária mais jovem. Pensa que este pode ser um livro útil para os mais novos?
Admito que sim, mas os meus livros são como os legos: dos 5 aos 99. Tive a informação de avós que leram os meus livros anteriores aos seus netos, mas penso que a ligação ao livro vai derivar do gosto e da curiosidade que os potenciais leitores tenham pela língua portuguesa e pelo léxico em geral.

Sempre quis ser jornalista?
Sim. Sempre tive um encanto pela televisão e pela vontade de comunicar com as pessoas. O José Alberto Carvalho, que foi meu professor de atelier de jornalismo de televisão, disse um dia que «parecia que a câmera gostava de mim». É um bom elogio e de facto eu sempre me senti à vontade diante de uma câmera, em direto ou gravado.

Fundou a SIC-Notícias em 2000 e em 2013 foi fundar a CMTV. O que recorda do nascimento de um e do outro projeto?
Eu entrei na SIC-Notícias mal acabei a faculdade e foi, de facto, muito especial. Éramos todos muito novinhos, mas tínhamos a retaguarda dos colegas da SIC que já acumulavam muitos anos de carreira. Na CMTV aconteceu mais ou menos o mesmo, com imensos colegas que estavam a ter a sua primeira experiência profissional. E porque já tinha sentido isso na pele, tive grande empatia com estes colegas, «colando-me», de alguma forma, a eles.

Apresenta o noticiário da hora do almoço na CMTV. Como reage quando tem de lidar com um «Alerta CM»?
Naturalmente. Eu gosto do sem rede, adoro um bom improviso e fui feita para fazer improvisos. É um momento de muito stress, mas ao mesmo tempo de desafio profissional. É onde eu me sinto melhor, porque me permite ser criativa e «distribuir jogo», como se costuma dizer. Se eu pudesse, tinha «Alertas CM» todos os dias, só não gosto é daqueles que são muito maus.

«Fake news» é outra expressão que vem no livro. Aplicada ao jornalismo da atualidade, como é que os profissionais e os consumidores de informação se podem blindar contra elas?
Não acreditando na primeira coisa que leem, cruzando fontes e informações e mais do que um órgão de informação. E, em última analise, se não tiverem a certeza, façam o trabalho de um jornalista: pesquisem e perguntem.

 

CARA DA NOTÍCIA

A paixão pelo jornalismo

Andreia Vale nasceu em Lisboa, em 1978. Licenciou-se na Escola Superior de Comunicação Social na primeira turma de Jornalismo, para entrar, de imediato, como estagiária, para o grupo de fundadores da SIC--Notícias, em 2000. Depois de onze anos em Carnaxide, mudou-se para a CMTV, onde apresenta o noticiário da hora de almoço. «Da Boca para Fora» é o terceiro livro que escreve depois de «Puxar a brasa à nossa sardinha» e «Cruz credo bate na madeira».

Nuno Dias da Silva
Jorge Nogueira | DR
 
 
Edição Digital - (Clicar e ler)
 
 
 
 
 
 
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