PEDRO LOURTIE EX-SECRETÁRIO DE ESTADO
Educação em debate nacional
Pedro Lourtie, ex-secretário de Estado do Ensino
Superior, professor catedrático do Instituto Superior Técnico e um
dos principais responsáveis pela implementação da Declaração de
Bolonha em Portugal, teve a responsabilidade de apresentar o livro
Políticas e Políticos da Educação.
Numa análise que procurou enquadrar
as entrevistas e o seu conteúdo, publicados nesta obra, Pedro
Lourtie começou por afirmar que "o livro retrata, através das
entrevistas, temas que estiveram em debate no período em apreço, de
1998 a 2010. Naturalmente que não os trata da forma sistemática
como um livro de autor teria a obrigação de o fazer, na medida em
que o critério para as entrevistas foi decidido num contexto da
publicação da Ensino Magazine e não da feitura de um livro".
"No livro encontrei, como seria
inevitável, muitas posições de que discordo, outras com que
concordo, afirmações que considero não terem suporte na realidade e
outras que creio fundamentadas", adianta. No entender de Pedro
Lourtie "é importante que posições contraditórias sejam registadas
e possam servir estímulo ao debate de ideias. Ainda que o tempo
venha a demonstrar que algumas afirmações eram infundadas. Por
exemplo, numa entrevistas, anterior à divulgação dos resultados do
PISA 2009, é afirmado que os resultados portugueses são maus e que
os próximos seriam ainda piores. O tempo encarregou-se de desmentir
a afirmação".
Pedro Lourtie diz que algumas das
entrevistas revelam "uma característica da opinião corrente e
publicada em Portugal, que retrata o debate nacional, é que não é
moda dizer bem, a não ser do passado. Está tudo pior, no passado
era muito melhor, mesmo quando os dados objectivos desmentem essa
afirmação".
Alguns entrevistados colocam a
questão da autoridade dos professores, afirmando que se perdeu e
recordando o passado em termos positivos. "Pessoalmente tenho uma
ideia muito diferente da autoridade dos professores do passado. Fiz
o meu ensino primário e secundário nos anos 50 e início de 60 do
século e milénio passados. Frequentei escolas em Luanda, Lisboa e
Porto. Conheci várias culturas de escola, porque as havia, e tive
muitos professores. Uns eram bons professores, com autoridade
própria, resultado das suas atitudes, como também os há hoje. Assim
como conheci aqueles cuja autoridade advinha exclusivamente de um
sistema autoritário e que o usavam para compensar a sua fraqueza.
Um sistema em que, se se tinha o azar de ser considerado culpado,
independentemente de haver qualquer fundamento, a capacidade de
defesa era diminuta".
Pedro Lourtie prossegue: "ontem,
como hoje, os professores são pessoas, com as suas qualidades e
defeitos. E há escolas em que se verificam problemas sérios, mas
serão mais aquelas em que não os há. Mas só os problemas são
notícia. Não se pode ignorar os problemas onde existem, mas não se
pode generalizá-los, como se fossem o dia-a-dia de todas as
escolas".
O ex-secretário de Estado do Ensino
Superior destacou o prefácio de Luciano de Almeida. "A par dos
dados históricos, com a aproximação ao presente há uma visão do
autor sobre a evolução do sistema educativo, com particular ênfase
no ensino politécnico. O autor foi Presidente do Instituto
Politécnico de Leiria e do CCISP, mas também as temáticas que
envolvem o politécnico, e que na viragem do milénio estavam muito
acesas, estão muito presentes nas primeiras entrevistas. Ou seja, o
final do prefácio encadeia bem com as primeiras entrevistas".
Na sua intervenção, Pedro Lourtie
dividiu o livro tem três partes: "o prefácio escrito por Luciano
Almeida; um primeiro lote de entrevistas em que o ensino superior,
em particular politécnico, é o tema central; e um segundo lote de
entrevistas em que o protagonista é o ensino não superior. As
entrevistas estão organizadas cronologicamente e os temas
dominantes em cada um dos lotes correspondem a temas controvertidos
no período respectivo", disse.
Um tópico dominante no primeiro
lote de entrevistas é o do sistema binário e das missões de
universidades e politécnicos. "Uma polémica", que no entender de
Pedro Lourtie, entretanto se esmoreceu, seja porque outras
preocupações se sobrepuseram, seja por se considerar que o debate
não tem actualmente utilidade prática".
No entender daquele responsável,
"este é um tema que não é fácil de tratar, mas de que é importante
conhecer os argumentos avançados por quem defende diferentes
caminhos. Considero que a classificação binária de posições, a
favor ou contra o sistema binário é redutora. Como o próprio
sistema binário o é. A polarização da discussão e do sistema em
apenas duas opções, sim ou não, branco ou preto, mascara
provavelmente todo um contínuo e cambiantes de posições.
Manifestar-se a favor de uma ou outra das duas opções é mais do
domínio da escolha de campo numa batalha, do que da construção do
futuro".
Pedro Lourtie acrescenta: "os
argumentos que podem ser avançados não são intemporais, não há
solução perfeita independentemente do contexto. Assim como é mais
fácil de ver os inconvenientes da solução que se tem do que daquela
que se não tem".
Para o ex-secretário de Estado do
Ensino Superior, "o livro deve ser encarado como um contributo para
a compreensão de posições sobre o sistema educativo, sem se esperar
que todas as posições estejam equitativamente representadas. Ao ler
as entrevistas fui concordando, em alguns casos, discordando
noutros, irritando-me por vezes. Foi o caso quando li a defesa do
chumbo como método pedagógico ou como questão de justiça. Para mim,
defender o chumbo como solução é como defender que o Sol se move em
torno da Terra, no chamado movimento aparente do Sol. Pode parecer
mas não é".
A concluir Pedro Lourtie recorre a
alguns excertos da entrevista efectuada a David Justino,
ex-ministro da Educação:
"Insiste-se muito no registo de
insatisfação, mas as críticas não são necessariamente
fundamentadas. Hoje toda a gente discute educação como quem discute
futebol. Na verdade, não discutem, porque falam sem saber. As
pessoas não estudam, não analisam e reproduzem o que lêem nos
jornais e ouvem na televisão."
"A opinião pública entretém-se a
chafurdar naquilo que é acessório, ao sabor das notícias dos
jornais, e dos casos da professora que tirou o telemóvel à aluna,
do bullying, etc. Muitas das pessoas que hoje falam mal das novas
gerações porventura já se esqueceram do que é que eram."
"Insurjo-me muito contra essa
frase feita de «que no meu tempo é que era» …Quando eu era aluno a
maior parte da população era analfabeta."
"O país precisa de assumir
colectivamente uma atitude construtiva e o ponto de partida é
definir claramente o que é que queremos."
No entender de Pedro Lourtie, "as
mudanças de ministros e, com eles, de políticas, é pouco saudável
para o sistema. Sujeito a safanões, não estabiliza. O problema é
que cada um se propõe definir a sua solução estável para futuro, a
boa, diferente da anterior".