Cortar a direito e o direito de cortar
As instituições de ensino portuguesas,
em especial as universitárias e politécnicas, enfrentarão no
próximo ano o mais difícil das últimas duas décadas. Com os
orçamentos reduzidos significativamente, com parte das receitas
próprias a serem cativas pelo Estado, e com o dever de continuarem
a qualificar o maior número de cidadãos portugueses, a tarefa não
será fácil.
Universidades e Politécnicos já
referiram, por mais que uma vez, que estão solidários com a crise
económica que o país atravessa. O problema é que os últimos anos já
foram vividos em crise e, para 2012, exige-se às instituições de
ensino e a toda a sociedade mais sacrifícios, alguns dos quais
brutais que dificilmente contribuirão para movimentar a economia ou
dar esperança a quem também é solidário com o combate à crise do
país.
Muitas crises são aproveitadas como
oportunidades e como instrumentos de mudanças. O perigo das
decisões tomadas sob o efeito 'ante-traumático' de uma recessão ou
de uma forte crise financeira, é o de se cortar a direito com o
facto da crise garantir a quem governa o direito de cortar.
Significa isto que qualquer decisão que venha a ser tomada no
âmbito da reorganização da rede de ensino superior (não só no que
respeita a instituições, mas também às vagas disponibilizadas nos
mais variados cursos) deve ser tomada com conhecimento profundo da
realidade do País.
Hoje, e ninguém terá dúvidas disso,
pode afirmar-se que as assimetrias entre o litoral e o interior são
menores porque foram criadas instituições públicas de ensino
superior na faixa entre Trás-os-Montes e Alto Douro e o Algarve.
Foram essas instituições que tornaram o país mais habilitado, que
garantiram o acesso a esse ensino qualificado a milhares de jovens
que de outra forma não teriam posses económicas para prosseguir os
seus estudos. São essas instituições que conseguem criar sinergias
com a sociedade civil e as empresas, que criam massa crítica nas
suas regiões. São elas que fixam pessoas (directa ou
indirectamente) no interior e que evitam que milhares de jovens e
famílias se transfiram para as já sobrelotadas principais cidades
do país.
Cortar a direito em tempo de crise
com a justificação de que é preciso poupar e que com menos
instituições o país ficará mais saudável até pode ser bem visto
pela generalidade dos portugueses. Mas é um erro de dimensão
medonha e de resultados desastrosos para Portugal. Até porque uma
parte significativa das instituições não dão prejuízo ao Estado, ao
contrário do que sucede com muitas das parcerias público-privadas e
empresas do Estado.
Encerrar instituições significa
voltarmos ao passado onde só pode estudar quem tem dinheiro. Não é
assim que funciona o mundo nem a Europa e não é assim que os
portugueses querem que funcione o nosso país. Portugal só será
competitivo se tiver a sua população qualificada. Não há outro
caminho. O Ministro da Educação e da Ciência sabe disso, como sabe,
melhor que ninguém, da importância das parcerias que se venham a
estabelecer entre as diferentes instituições de ensino. E essa sim
poderá ser uma solução benéfica para todos.
Mas numa altura em que há menos candidatos ao ensino superior,
há que intervir também na questão das vagas e dos cursos. Também
aqui terá que haver coragem política para que as universidades e os
politécnicos se assumam como verdadeiros baluartes da coesão
territorial...