Bocas do Galinheiro
Bacall e não só
Já começa a ser um lugar-comum falar do luto no
cinema. A verdade é que estamos de luto outra vez. Demasiadas vezes
nos últimos tempos, diga-se. Da última crónica até ao texto que têm
na frente, abalaram nomes tão importantes como, desde logo, Lauren
Bacall, no passado 12 de agosto, na sequência de um avc. Tinha 89
anos. Aquela que era conhecida por "The Look", por aquele olhar
descarado, que brilhou desde "Ter ou não ter" (1944), de Howard
Hawks, onde prendeu Humphrey Bogart pelo assobio: "You know how to
whistle, don't you, Steve? You just put your lips together and...
blow", para mais à frente rematar "If you want anything...just
whistle!". Foi o primeiro filme dela, e o começo de um grande amor
e de um dos casamentos mais glamoroso de Hollywood, que terminou
com a morte de Bogart em 1957. Com Hawks, voltaram a contracenar em
em "The Big Sleep" (À Beira do Abismo,1946), uma adaptação da
novela policial de Raymond Chandler, com argumento em que colaborou
William Faulkner e que se tornou uma das grandes fitas do filme
negro.
Foi a mulher de Hawks que indicou
Bacall ao marido depois de a ver numa capa da Harper's Bazaar.
Tinha 19 anos, aquela voz grave que a distinguiu de muitas pequenas
na altura e o tal olhar, de fazer inveja até a Marlene Dietrich.
Numa carreira cheia de êxitos, constam filmes como para além dos
dois com Hawks, "Ter ou não Ter" e "The Big Sleep", "Dark Passage"
(O Prisioneiro do Passado,1947), de Delmar Daves, também com
Bogart, "Key Largo" (Paixões em Fúria,1948),de John Huston, com
Bogart e Edward G. Robinson, "Young Man With a Horn" (Duas
Mulheres, Dois Destinos,1950), de Michael Curtiz, com Kirk Douglas
e Doris Day, "How to Marry a Millionaire" (Como se Conquista um
Milionário, 1953) de Jean Negulesco, com Marilyn Monroe, "Murder on
the Orient Express" (Um Crime no Expresso do Oriente,1974), de
Sidney Lumet, numa parada de estrelas de Ingrid Bergman a Albert
Finney, passando por Anthony Perkins, Vanessa Redgrave, Richard
Widmark e mais um longo etc, porque não dá para enumerar todas, ou
"Dogville" (2003), de Lars von Trier, com Nicole Kidman.
Nascida Betty Joan Perske em Nova
Iorque, tinha 89 anos. Em 1997 foi nomeada para um Oscar, na
categoria melhor atriz secundária em "The Mirror Has Two Faces", de
Barbara Streisand, onde entra também Jeff Bridges. Não ganhou mas
arrebatou o Globo de Ouro nesse ano. Em 2010, recebeu um Óscar
honorário pelo reconhecimento de uma rica carreira e a sua
relevância nos anos de ouro de Hollywood, nas décadas de 40 e 50 do
século passado, e que culminou no seu último filme "The Forger",
(2012) de Lawrence Roeck.
Antes, a 19 de julho, com 86 anos,
faleceu James Garner, ator que começou a ser conhecido nas
televisões americanas pelas séries "Maverick" e "The Rockford
Files", esta última nunca exibida no nosso país, mas cuja passagem
pelo cinema o ligou a grandes filmes, desde logo em "A Grande
Evasão" (1963), de John Sturges, em que contracenava, entre outros
com Steve McQueen, Charles Bronson, James Coburn e Richard
Attenborough, também falecido recentemente mas de que falaremos
outro dia, um filme inspirado em factos reais sobre a fuga de
prisioneiros aliados de um campo alemão durante a II Guerra
Mundial, à adaptação ao grande écran em 1994, numa realização de
Richard Donner do filme "Maverick", Mel Gibson e Jodie Foster, um
trio de jogadores que no velho oeste faziam do jogo, ou da batota,
a sua vida, ou mais recentemente em "Space Cowboys" (2000), de
Clint Eastwood, sobre um quarteto de ex-astronautas que foram
preteridos na ida à lua mas que, perante a eminência de uma
catástrofe aeroespacial embarcam finalmente rumo ao espaço numa
missão da NASA para resgatarem um foguetão soviético do tempo da
guerra fria cuja queda não pode acontecer. Uma bem-humorada fita do
mestre Eastwood em que o reverendo Garner, tal como os restantes,
se divertem à brava. Pelo meio papéis relevantes em
"Victor/Victoria" (1982), de Blake Edwards, Julie Andrews, "O
Romance de Murphy" (1985), de Martin Ritt, com Sally Field que lhe
valeu uma nomeação para o Oscar, "Grand Prix" (1966), de John
Frankenheimer, uma das primeiras abordagens em longa metragem ao
circo da Fórmula 1, ou "Herói Precisa-se" (1964), de Arthur Hiller,
uma sátira anti-militarista com Julie Andrews e Melvyn Douglas.
Herói da guerra da Coreia, ainda se destacou em "O Diário da Nossa
Paixão" (2004) de Nick Cassavetes e "The Ultimate Gift" (2006), de
Michael O. Sabjel. Depois de um avc em 2008 praticamente não havia
notícias de Garner, até agora.
Por fim uma palavra para Robin
Williams. Desapareceu a 11 de agosto, com 63 anos. Não vibrei por
aí além com "O Clube dos Poetas Mortos" (1989), de Peter Weir,
talvez me reveja mais em "O Estranho de Mundo de Garp" (1982),
George Roy Hill, "O Rei Pescador" (1991), de Terry Gilliam ou mesmo
" Hook" (1991), de Steven Spielberg, " Casa de Doidas" (The
Birdcage, 1996), de Mike Nichols ou "O Bom Rebelde" (1997), de Gus
van Sant. Robin Williams era um comediante, sem rede, dos que eu
gosto. Pregou-nos uma valente partida. Não merecíamos. Deixou-nos,
mas não devia. Terei que voltar a ele noutra oportunidade.
Até à próxima e bons filmes!