Análise ao livro
Contributos para a História do Sistema Educativo
Começamos agradecendo a honra que nos
concederam de intervir nesta ocasião tão relevante, para comentar a
presente obra da autoria de João Ruivo e João Carrega
(coordenadores) que vem na sequência do livro "Políticas e
Políticos da Educação" editado em Março 2011.
Pouco tempo decorreu… muitas
mudanças se verificaram, outras concepções, outros protagonistas,
outras ideologias, outro ambiente na sociedade portuguesa…refira-se
a insegurança provocada no sistema educativo, em consequência de
vários factores dos quais se destaca a decisão inexorável de
reduzir os custos da educação, incluindo o financiamento da
ciência.
Mas algo ficou imutável,
indiferente às atitudes e propósitos de quem mantém o primado da
decisão política em vários planos e patamares… ou seja, a
perenidade da Educação, ela própria o elemento decisivo no chamado
progresso da espécie humana nas múltiplas dimensões que a
caracterizam e nesta conformidade, as oscilações da vontade de quem
se sente momentaneamente protagonista, não belisca a importância da
Educação… apenas consegue, ou não consegue, atrasar a sua
interacção com as sucessivas gerações que dela dependem.
A obra que hoje faz o encontro connosco,
segue a forma utilizada anteriormente, apresentando entrevistas a
responsáveis, intervenientes e líderes de opinião do fenómeno
Educação, proporcionando um efeito de proximidade a todos os
títulos notável, que o "Ensino Magazine" conseguiu levar a cabo com
o sucesso que francamente reconhecemos e mais do que isso
agradecemos.
Fica assim caracterizada uma época
de encontros e desencontros, de sentimentos muitas vezes
contraditórios entre quem decide, quem observa, quem interpreta e
investiga e quem executa, ou tenta executar, no dia a dia, os
ditames da Educação, com maior ou menor sucesso, soe dizer-se.
Constitui por isso um testemunho de
inegável e extraordinário valor, representando um documento
histórico, sociológico e sobretudo uma base segura para inspirar
quem venha a seguir, proporcionando os elementos que permitem
ajudar a não cometer os erros do passado seja o passado que for, no
tempo, no espaço, ou na trajectória de cada um.
(...)
A obra inicia-se com um prefácio à
1ª edição da autoria do professor
Luciano de Almeida que permite ao leitor alcançar uma ideia
concreta sobre a evolução das políticas de educação em Portugal.
Aponta o atraso estrutural existente e a ausência de uma estratégia
nacional. Trata-se de um documento imprescindível para quem quiser
conhecer, apreciar, ou trabalhar a problemática da Educação em
Portugal, com os avanços e recuos, tentativas frustradas ou não que
o passar do tempo evidencia e inexoravelmente reclama.
Permitam que enfatize a referência
à reforma do sistema educativo protagonizada pelo professor Veiga
Simão em 1973 cujos efeitos perduraram até muito recentemente, pois
dificilmente se poderá encontrar depois de Veiga Simão algo tão
envolvente e profundo. Todos os que no passado se preocuparam ou
que no presente se preocupam com a educação muito lhe devem, ou
seja os que dela dependem que afinal somos todos nós.
Temos depois a oportunidade de apreciar
a opinião de Eduardo Marçal Grilo que nos premeia com a sua
habitual clarividência e experiência como ministro da Educação,
traçando uma visão sobre os diferentes níveis de ensino,
mencionando algo que em nossa opinião traduz um dos mais graves
problemas que tem sido apanágio da acção de todos os governos, ou
seja que é muito difícil na política assumir a Educação como "a
prioridade…"
Satisfaz-nos registar a opinião
abalizada de um riquíssimo conjunto de ex-ministros da educação,
espelhando as suas ideias esclarecidas, convicções e dificuldades
encontradas no exercício dos seus mandatos. Mencionamos Augusto
Santos Silva (a ciência faz-se em todo o mundo), Júlio Pedrosa
(avaliação e planeamento estratégico) Pedro Lynce (procura de novas
formas de financiamento), David Justino justificando a ausência de
visão de futuro para a Educação. Lançou a obra "Difícil é
educá-los" contribuindo com este ensaio para uma discussão sobre o
sistema educativo. Mostra não existir visão estratégica para o que
se pretende para o sector… ao investimento na educação, não
corresponde a qualidade que dele se espera. Mariano Gago, com a sua
longa experiência, estabelecendo metas para os níveis de formação
da população portuguesa, importância de acordos e parcerias
institucionais, assim como a reorganização e estatuto da carreira
do ensino superior. Maria de Lurdes Rodrigues, as escolas vão
mudar, na gestão, formação contínua, incremento de cursos de cariz
profissional.
Torna-se curioso verificar que da
opinião esclarecida de cada uma das individualidades, torna-se
difícil, no seu conjunto, segregar algo que corresponda a uma
política nacional de Educação no nosso país, entendida acordada e
sucessivamente seguida por todos os intervenientes responsáveis, na
vigência dos seus mandatos.
Também, neste contexto, a opinião
de Nuno Crato, difícil é educá-los… defende investimento mais
eficiente na Educação, insiste na formação de professores (os
professores são heróis na batalha da educação, afirmou...), cultura
do rigor e avaliação permanente…
Foi sem dúvida uma ideia feliz
ouvir a opinião de individualidades da sociedade não orgânica, o
que se considera fundamental num documento desta natureza, pois
constituem um teste às políticas oficiais, transportando assim, de
alguma forma, o sentimento dos portugueses que estão longe das
estruturas de decisão e que afinal nos abarca a todos. Está assim
presente o testemunho de pessoas como Eduardo Lourenço, José Barata
Moura, Francisco José Viegas Odete Santos, Garcia Pereira, José
Gomes Ferreira, Luís Nazaré, Paulo Morais, Sérgio Godinho, Carlos
do Carmo, Mega Ferreira…
Outras pessoas foram também envolvidas,
as quais estamos habituados a reconhecer como líderes de opinião e
que constantemente influenciam muitos de nós ou pelo menos alguns,
em diferentes planos de audiência…. Marcelo Rebelo de Sousa, Padre
Vitor Melícias, Guilherme de Oliveira Martins, Vasco da Graça
Moura, Bagão Felix, Sobrinho Simões, Eduardo Lourenço, Eduardo
Catroga, Silva Lopes, Fernando Rosas, João Lobo Antunes, Mira
Amaral, Pedro Lourtie, Isabel Moreira, Marques Mendes, Campos e
Cunha, Carlos Fiolhais
Bom! Chegamos ao fim da consulta
desta obra e qual a sensação com que ficamos? Em primeiro lugar que
os intervenientes foram bem seleccionados. Cobrem a quase
totalidade da das idiossincrasias da população portuguesa. Em
segundo lugar ficamos com a certeza que o conjunto das intervenções
permitem uma análise completa do que é do que tem sido a
problemática da Educação em Portugal e é por isso um documento
fundamental… depois disto, falta elaborar uma síntese da qual
resulte uma política da Educação que seja digna da perenidade,
importância e transversalidade da Educação e não algo que sirva de
arma de arremesso dos partidos políticos, os quais não têm
sistematizado na prática aquilo que admitem na teoria e no
discurso, ou seja que a Educação não é apenas uma prioridade mas
sim, a prioridade, que em boa verdade se situa acima, bem distante,
de qualquer outra.
E terminamos dizendo, rebuscando algo
que tivemos já oportunidade de afirmar noutra ocasião mas que
consideramos adequado neste importante acontecimento:
"A Educação no sentido lato,
reserva para si o enorme privilégio de fazer a distinção entre o
que se entende por Nação e o que define o País, especialmente nos
momentos de infortúnio como os que hoje caracterizam a nossa
sociedade. Através da perenidade da Educação, tudo se filtra, a
informação que pode ou não conduzir ao conhecimento e este algumas
vezes à sabedoria, a cultura que transporta no seu âmago a milenar
trajectória das sucessivas gerações, a arte e a literatura, que
pintam as cores do belo, do sofrimento, dos estados de alma. O
País, preocupado com a economia, as finanças, com os equilíbrios
espúrios de quem manda e de quem vai mandar, com as conjunturas e
obediências, consegue em determinados períodos da História, violar
os pilares da sociedade, logrando inverter o processo natural da
hierarquia dos valores. São exemplos, a tentativa quase
irresistível de se pretender subalternizar a Educação, colocando-a
entre duas tenazes que a comprimem, a teologia do mercado e a
instrumentalização política, económica e financeira".
Leopoldo J. M. Guimarães (Reitor aposentado da Universidade Nova de Lisboa)
Texto escrito segundo a antiga ortografia
Paulo Goulart