Entrevista

Maria João Rosa, jornalista e pivô da TVI24
«É preciso ter sangue frio quando há imprevistos»
MJ_Rosa_2.jpgA franja é a sua imagem de marca e o cinema a sua paixão. Maria João Rosa é um dos rostos da TVI24 que diariamente informa os portugueses sobre a atualidade nacional e internacional.
É licenciada em Comunicação Social e Cultural. O jornalismo foi sempre a carreira que sonhou seguir?
Por acaso, não. O meu sonho de infância era o cinema e queria ser realizadora. Mas quando acabei o 12º ano, achei que precisava de mais bagagem cultural antes de ir para o Conservatório. Aí iria aprender a fazer filmes, mas precisava de ter mais "histórias" para contar. Foi por isso que escolhi a licenciatura de Comunicação Social e Cultural, na Universidade Católica, por me parecer muito abrangente e completa. Ao mesmo tempo, fiz também um curso de História e Estética do Cinema, no IADE. Acontece que, quando acabei a licenciatura, recebi como prémio (por ter sido a melhor aluna do meu ano) um estágio remunerado na TVI. Era um protocolo que havia na altura e achei que seria uma boa experiência. Acabou por ser muito mais do que isso e foi aí que me apaixonei por fazer televisão. Em seis meses aprendi imenso e, em pouco tempo, já estava a editar as minhas peças, os meus "pequenos filmes", que tinha o privilégio de mostrar a um público enorme. A TVI gostou de mim e fiquei nos quadros. Fiz reportagens diárias, grandes reportagens, fui pivô e, a partir de 2009, pude especializar-me em Cinema, com o arranque do "Cinebox", na TVI24. Em 2019, aceitei o desafio de passar a ser pivô a tempo inteiro, posição que ocupo atualmente.
Como é ser pivô em tempos de pandemia?
Foi e continua a ser uma responsabilidade redobrada. Sobretudo, durante o Estado de Emergência. Numa altura em que literalmente muitos jornalistas arriscaram a vida, ao irem diariamente trabalhar nas redações, nos hospitais, no terreno, porque alguém tinha de o fazer para manter o resto do país informado. Porque havia demasiadas dúvidas e equívocos sobre a Covid-19, sobre o que cada um devia fazer para se proteger e travar a pandemia. Porque havia (e ainda há) demasiada incerteza sobre emprego, apoios do Estado, meios de sobrevivência, planos para o futuro. Porque, fechados em casa, muitos portugueses só tinham os meios de comunicação social e as redes sociais como janelas para o mundo, como pontes de contacto com os outros. A comunicação social tem, mais do que nunca, um espírito de missão nestes tempos. E um pivô é, em televisão, o primeiro contacto dos espetadores com a informação.
Como se desenrola o seu dia de preparação antes de entrar no ar?
Começa pelo menos duas horas antes de entrar no ar. Assim que chego, vou logo para a maquilhagem, para estar pronta a entrar no ar a qualquer momento, caso haja alguma notícia importante de última hora que obrigue a interromper a emissão prevista. Maquilhagem e cabelos demoram entre 30 e 40 minutos a fazer (por ser mulher, os pivôs homens demoram cerca de 10 minutos ou menos). De seguida, sento-me ao computador ao lado do editor do jornal que vou apresentar, que a essa hora já tem o alinhamento do jornal adiantado, e começo a rever as propostas de pivô (que cada jornalista escreve, como proposta de texto para o pivô da sua peça). Altero o que entender, seja por uma questão de conteúdo, seja de estilo. Preparo os lançamentos para os diretos já previstos e os momentos de destaque dos jornais. Tudo isto é feito com alguma pesquisa pelo meio, sobre cada assunto. Quando as peças já estão prontas, é sempre útil o pivô vê-las primeiro (mas, muitas vezes, ficam prontas mesmo em cima da hora de irem para o ar e nesses casos não é possível). Quando há entrevistas ou debates em estúdio, é também nesta altura que os preparamos. Finalmente, 5 a 10 minutos antes do jornal começar, entro no estúdio para colocar o micro, a escuta, confirmar que estou a ouvir a régie, que o teleponto está no alinhamento certo, etc.
Cria-lhe alguma ansiedade os momentos prévios à entrada na emissão? Como é estar, por vezes, quase sem rede, dependente do que a régie diz no auricular? É preciso ter nervos de aço?
É preciso ter sangue frio quando há imprevistos. E há sempre imprevistos. Alguma ansiedade há sempre e é bom que haja, mantém o pivô focado no que está a fazer. Mas é importante que os últimos momentos antes de entrar no ar sejam de calma e concentração. Depois, quando surgem problemas e imprevistos (como falhar o teleponto, peças que não arrancam, notícias de última hora sobre as quais ainda pouco se sabe) o ideal é tentar fazer tudo em "câmara lenta": falar pausadamente, para pensar bem no que se vai dizer e fazer a seguir. Há sempre um computador na mesa do pivô, onde é possível pesquisar informação de última hora. E, é claro, há sempre o apoio da régie, que nos dá informação ao ouvido (embora seja preciso concentração para falar para a câmara e ouvir a régie a falar connosco ao mesmo tempo).
Escreveu no seu Instagram que «os jornais são o manual de instruções para este mundo assustador em que vivemos». É possível fazer informação credível, fidedigna e equilibrada quando a luta pela conquista de audiências é diária?
Sempre. O que não significa que seja fácil. O mais importante é ter em mente que estamos a falar para o espetador e tentar dizer da forma mais informativa, mas também apelativa, o que achamos que ele quer saber, o que lhe é mais útil ou desperta maior interesse. Não devemos ter a pretensão de educar, embora também o façamos, mas o primeiro objetivo é informar de forma sintética, dar as ferramentas a quem nos vê, para que tirem as suas conclusões sobre o mundo que nos rodeia. A luta pelas audiências é um facto, trabalhamos numa empresa de comunicação, mas não tem de implicar o sacrifício da nossa missão informativa. E chegar ao maior número de pessoas possível, é também informar mais pessoas.
Neste momento, encontra-se mais no estúdio e menos em trabalho de reportagem. Ir ao terreno é o género jornalístico que mais aprecia? Alguma reportagem que a tenha marcado até hoje?
Passei muito mais tempo da minha carreira a fazer reportagem do que a ser pivô. Gosto bastante do trabalho de reportagem e depois de fazer a edição das peças. Numa fase em que fiz grandes reportagens, marcaram-me várias, mas posso dar o exemplo de uma que fiz no Oceanário de Lisboa, onde conseguimos gravar imagens inéditas do nascimento de uma lontra do Pacífico, que mais tarde foram mesmo usadas num documentário da "National Geographic". Quando me especializei em cinema, adorei fazer a cobertura dos Óscares em Hollywood e do Festival de Cannes, várias vezes. Entrevistar figuras como Quentin Tarantino e Woody Allen, por exemplo, foram momentos altos para mim.
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É cada vez maior o número de jornalistas e pivôs femininas. É um reconhecimento do mérito do sexo feminino ou, de alguma forma, uma concessão à ditadura da imagem e da beleza?
A ditadura da imagem existe sempre, em qualquer meio audiovisual (mais para as mulheres, é verdade que sim) e temos de saber viver com ela sem sacrificar o que é mais importante. Mas penso que, nos últimos anos, temos vivido um bom período para o reconhecimento do mérito e dos direitos das mulheres, bem como uma maior aceitação da diversidade da imagem. As pessoas começam a perceber que não precisamos todas de encaixar nos mesmos padrões para termos uma boa imagem. Dito isto, penso que ainda falta muito para haver total paridade relativamente a reconhecimento profissional, exigências de imagem e, claro, remunerações e oportunidades profissionais para as mulheres na televisão, em Portugal e não só.
Em 2009 tornou-se coapresentadora e editora do "Cinebox", o magazine de cinema da TVI24. Nos contactos que manteve com dezenas de estrelas de cinema, qual foi a entrevista lhe deu mais prazer?
O que já referi numa pergunta anterior: entrevistar alguns dos meus realizadores preferidos, como o Tarantino e o Woody Allen, só para referir alguns nomes mais conhecidos. Cobrir os Óscares a partir do Dolby Theatre e estar na passadeira vermelha foi um privilégio, assim como os muitos anos de cobertura do Festival de Cannes. Para quem adora cinema, é uma experiência incrível.
Já confessou que gostaria de ser realizadora de cinema. O que é que a atrai?
O cinema, simplesmente. Sempre me apaixonou desde criança, desde o tempo em que o meu padrasto tinha uma sala de cinema, onde cheguei a ter filmes exibidos só para mim. O meu desejo era trabalhar nessa área e daí querer realizar os meus próprios filmes. Mas a possibilidade de trabalhar em televisão surgiu primeiro e tornou-se numa paixão igualmente grande.
Como já referiu, esteve presente em grandes festivais, como o de Cannes, e inclusive já participou numa cerimónia dos Óscares, em Los Angeles. Explique-nos como se desenrola o processo para chegar até perto de um ator ou atriz consagrado?
É tudo muito controlado, quer pelos festivais, quer pelos "publicists" das estrelas. As entrevistas decorrem naquilo a que no meio se chamam "junkets", eventos extremamente organizados que juntam jornalistas do mundo inteiro. Há uma ordem para as entrevistas e somos, literalmente, cronometrados para fazer a entrevista a uma estrela, muitas vezes só temos cinco ou sete minutos. Por isso, é crucial irmos bem preparados. A mesma coisa nos Óscares, tudo é super controlado e programado com a organização do evento, meses antes de acontecer.
A indústria do cinema também está a sofrer com a pandemia. O receio das pessoas em deslocar-se a sítios públicos pode levar a um reforço da tendência do incremento do consumo de cinema nas plataformas digitais em casa e à queda do consumo do cinema em sala?
Penso que sim, mas essa já era uma tendência anterior à pandemia. O cinema em sala tem perdido público progressivamente na última década. Depois desta fase excecional da pandemia passar, as salas de cinema terão de ser criativas para chamar os públicos. O 3D e o IMAX durante uns anos foram trunfos úteis, mas terão de surgir outros para que os cinemas sobrevivam tal como os conhecemos. Pelo menos os cinemas maiores e multiplexes, os mais pequenos e com públicos de nicho irão sempre manter-se, penso eu.
Uma pergunta para concluir: a sua franja é, de alguma forma, a sua imagem de marca e traço distintivo?
É totalmente a minha imagem de marca! Muita gente me fala da franja e gosto de saber que marca a diferença. Além disso, acho que traz um bocadinho de fantasia e originalidade para o mundo, normalmente tão sério, das notícias.
CARA DA NOTÍCIA
A paixão pela «sétima arte»

Licenciada em Comunicação Social e Cultural pela Universidade Católica Portuguesa, Maria João Rosa associa ao seu percurso académico o Curso Livre de História e Estética do Cinema, no IADE. Em 1997 começa a carreira de jornalista na redação da revista Media XXI. Em 2002 entra para a redação da TVI e sete anos depois, com o arranque da TVI24, torna-se pivô dos blocos de informação das madrugadas, e desempenha funções como editora e coapresentadora do "Cinebox", magazine de cinema do TVI24. Desde o ano passado está em exclusivo na apresentação dos noticiários do canal de informação. As suas paixões são o cinema, as viagens e a escrita.
Nuno Dias da Silva
José Manuel Marques
 
 
Edição Digital - (Clicar e ler)
 
 
 
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