Entrevista

Ana Patrícia Carvalho, pivô da SIC-Notícias
A notícia não escolhe hora laboral

ana_patricia.jpgUma das caras mais conhecidas do canal de informação da SIC defende que o «espírito proativo» deve estar sempre presente na atitude dos jovens que ambicionam ser jornalistas.

Em criança sonhava ser jornalista ou bailarina, mas um problema físico fê-la pender para a primeira atividade. Sente-se realizada com a sua escolha profissional?
Sem dúvida. Fiz a escolha certa e acho que é visível o quão feliz e realizada sou como jornalista.

Acumula 12 anos de experiência na profissão. Sente saudades da reportagem ou não troca o lugar de pivô por nada deste mundo?
Já vou a caminho dos 13 anos de SIC e felizmente tenho tido oportunidades ao longo dos anos. Tenho agarrado todos os desafios com o maior profissionalismo e a ambição é fazer sempre mais e melhor. Para se ser pivô é imprescindível ser também bom no terreno, em reportagem.  Estou tranquila em qualquer das funções, mas sei que como pivô a minha margem de progressão é ainda grande e é nisso que estou focada nesta altura.

Confessa que se sentiu em pânico quando lhe propuseram a apresentação do "Jornal da meia noite". Pode-se dizer, no seu caso, que primeiro estranha-se e depois entranha-se?
Claro que sim! O "Jornal da meia noite" tornou-se uma marca, uma referência. O "pânico" revela que estou consciente da responsabilidade de assumir esse lugar e da aposta que foi feita. É bom sentir a confiança dos telespetadores e fazer tudo para passar a mensagem da forma mais clara possível.

Quem aparece na televisão tem a sua imagem muito exposta. Como é que lida quando a reconhecem ou se interrogam «esta cara não me é estranha…?
As pessoas que o fazem são sempre muito simpáticas e é bom sentir o carinho e o reconhecimento de quem me diz que vê religiosamente o jornal, que tem acompanhado o meu percurso e crescimento.  Confesso também que nas folgas e à "civil", nem sempre é fácil reconhecer-me. Sou muitoooo discreta!

Como é o seu dia de preparação para o "Jornal da meia noite", desde que acorda até quando as luzes se acendem e começa a ler o teleponto?
Leio sempre os jornais online quando acordo e vejo as principais notícias que marcam o dia. Depois chego à redação por volta das 15 horas ou 17 horas, dependendo dos jornais que estou a apresentar. Vejo com o coordenador o planeamento da noite. Os convidados, possíveis entrevistas, diretos, reportagens que vão ser feitas... A partir daí, é corrigir os pivôs, ler muito, pesquisar mais.  Passar pela maquilhagem e pelos cabelos e aguardar pelo «3, 2, 1, estás no ar»! Depois, há dias em que todo o alinhamento feito ao longo da tarde, muda em dois minutos por causa de um última hora. Sou rapariga de breaking news.

Que noticia gostaria de dar em direto?
A cura definitiva para o cancro!

Temos quatro canais de notícias 24 horas em Portugal. A luta pelas audiências está muita presente na construção de um boletim informativo?
Temos que estar atentos à concorrência, mas não somos reféns disso. No entanto, é óbvio que quando delineamos um jornal ou uma emissão especial queremos fazer bons resultados e boas audiências. É um objetivo diário continuarmos na liderança e sermos a referência e escolha dos telespetadores.

Vivemos, nas palavras de Mário Vargas Llosa, na «civilização do espetáculo». De que forma a vertente do infotainment que, aqui e ali, vai contagiando o fluxo noticioso pode ser contraposta com uma abordagem equilibrada e de bom senso?
O jornalismo não pode nem deve ser sensacionalista. Tem que ser rigoroso, factual e isento. Apesar disso, as notícias mais ligeiras e positivas também fazem falta e nesse caso o jornalismo pode também ser mais informal. Menos cinzento. Desde que respeite a ética jornalística, os valores e bom senso que nos deve caraterizar.

Investigações em profundidade e de serviço público, como a SIC apresentou sobre o "Luanda Leaks", são o caminho a seguir?
As investigações jornalísticas são um trunfo. Sobretudo quando são bem feitas e sustentadas como as reportagens feitas pela SIC no âmbito do "Luanda Leaks". O jornalismo tem essa função. Denunciar factos, provas, lançar o debate, questionar. Sempre.

Dá aulas no ISEG e na ETIC. Que disciplinas leciona?
Jornalismo e apresentação de televisão.

Não é novidade dizer que o jornalismo está em crise, tanto o modelo de negócio, como os próprios órgãos de comunicação. Concorda com o apelo do Presidente da República para que o Estado intervenha no auxílio aos títulos em dificuldades?
Acho que devem ser estudadas medidas diretas e indiretas para apoiar os meios de comunicação. Estamos a falar de um pilar fundamental da democracia.  

Sobre a profissão de jornalista, costuma dizer-se que se sabe a que horas se entra, mas não se sabe a que horas se regressa a casa. Sente que estas novas gerações estão suficientemente mentalizadas para esta lógica de exigência e dedicação total?
Espero que estejam... porque a realidade é mesmo essa e a notícia não escolhe hora laboral. É impressionante como, perante um breaking news, os jornalistas se encaminham para a redação de forma voluntária para noticiar tudo e anunciar os desenvolvimentos em primeira mão. Esse espírito proativo tem que estar presente.

É licenciada em Ciências da Comunicação, na vertente jornalismo. A cada vez mais difícil empregabilidade no meio pode levar a que muitos jovens desmobilizem de seguir esta carreira?
Acho que devemos sempre seguir os nossos sonhos e trabalhar muito. Persistência e resiliência são palavras chave. Às vezes temos que ouvir um «não» e dar um ou dois passos atrás... mas a sorte dá sempre muito trabalho e várias horas de dedicação.

Moderou no início de fevereiro um painel no Fórum Educação e Mudança, subordinada ao tema da transformação digital. Em que medida é que o novo paradigma digital está a transfigurar o modo como se comunica e como circula a informação?
A SIC tem bem presente essa aposta no digital. A internet é cada vez mais uma ferramenta de pesquisa, fonte de informação e mais imediata. Devemos tirar o maior proveito dessas ferramentas tecnológicas e das competências digitais como fatores de mudança para uma educação e informação de melhor qualidade. Tendo sempre um olhar crítico em relação aos conteúdos de forma a identificar e combater as fake news.

Uma pergunta final, com uma incursão pelo lado mais lúdico da sua vida. É praticante regular de kickboxing. É este o seu escape ou também uma forma de defesa pessoal?
Começou por ser uma forma de defesa pessoal e acho que todos deveríamos ter estes conhecimentos. Passou depois a ser terapêutico. Uma forma de manter a calma e tranquilidade perante o caos e de libertar o peso da "mochila" e das informações que carrego. Não consigo ficar indiferente às notícias que dou diariamente: é uma espécie de ioga para canalizar energias boas.

 

CARA DA NOTÍCIA

A pivô da meia noite

Ana Patrícia Carvalho, 34 anos, nasceu no Barreiro, distrito de Setúbal. É jornalista da SIC desde 2007 e apresenta de forma regular o "Jornal da meia da noite" na SIC-Notícias e as edições da noite ao fim de semana. É licenciada em Ciências da Comunicação, vertente de jornalismo, pela Universidade Independente e pós-graduada em Comunicação e Jornalismo Desportivo no ISLA - Escola de Estudos Universitários do Real Madrid. Frequentou, também, os cursos de rádio e televisão no Cenjor. É docente no Instituto Superior de Economia e Gestão de Lisboa e na Escola de Tecnologias, Inovação e Criação.

Nuno Dias da Silva
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