Entrevista

Leopoldo Guimarães, presidente da Comissão Consultiva da Futurália
Pressão da sociedade exige respostas

leopoldo-guimaraes.JPGA Futurália 2012 é já em Março. Depois da experiência do ano passado, enquanto presidente da Comissão Consultiva, o que espera desta edição?

Espero fundamentalmente que a edição 2012 prossiga na senda do sucesso alcançado nas edições anteriores. Todavia, desejamos que acrescente algo na sua configuração dinâmica, aproximando cada vez mais os diferentes actores que intervêm nas infindáveis dimensões que a Educação alberga. Partimos da premissa que quaisquer que sejam as opções que se vão tomando, todas elas se inscrevem numa trajectória cujo fim nunca se atinge. O passado justifica o presente mas não define integralmente o futuro. 

A qualificação dos portugueses é apontada como uma das soluções para tornar o país mais competitivo. Isso está a ser conseguido?

 Num mundo que pensávamos estar organizado, ou seja, o mundo tecnologicamente avançado não tem tido capacidade de resolver os problemas mais candentes das nossas sociedades contemporâneas, que se tornaram reféns do império da tecnologia. No seu crescimento hegemónico, a tecnologia vai condicionando a trajectória civilizacional, num mundo de enormes desequilíbrios, potencialmente gerador de conflitos multilaterais que por vezes são disfarçados por razões de natureza étnica, religiosa ou outra. Constituem exemplos flagrantes da preponderância argumentativa da intervenção da tecnologia na problemática da segurança das nações, consumir menos energia na produção de bens transaccionáveis, contrariar o espectro da degradação do ambiente, ou ainda equilibrar tecnologicamente o avanço do terrorismo, especialmente por parte dos países detentores de tecnologia avançada. 

Isso repercute-se na educação?

 A repercussão destes factores na Educação, é evidente. No entanto, os tempos da Educação não são compatíveis com os tempos que caracterizam a evolução tecnológica, em resposta à pressão da sociedade, nos seus aspectos políticos e económicos. Por isso se abre um fosso que infelizmente se vai alargando.

Caberia à Educação no seu conteúdo mais lato contribuir de forma relevante para equilibrar este fenómeno. Não o tem feito tanto como deveria! Antes pelo contrário, tem cedido à cultura da avaliação apenas unidireccional, contribuindo assim para servir a chamada teologia do mercado, que tende a centrar a sua perspectiva, sobre bases economistas e orçamentais.

Embora confrontados com as exigências de curto termo impostas pela necessidade de aumentar os índices de competitividade, de produtividade, não poderemos descurar os aspectos ligados à formação humanista dos futuros cidadãos interventores na política, cultura, ciência, na tecnologia…. Algo está a ser feito nesse sentido, projectando-se na adesão de muitos sectores da sociedade ao compromisso civilizacional com o equilíbrio educação/formação que começa na infância e se estende até ao fim da vida de cada um de nós. Mas não chega, teremos que fazer mais. 

De que forma a Futurália pode contribuir para que jovens e menos jovens descubram o seu futuro?

 É exactamente esse um dos argumentos mais importantes que justificam a Futurália. A crise e o desemprego crescente, podem provocar algum descrédito na importância da educação, situação que a verificar-se seria sem dúvida dramática, pelo que deve ser imediatamente contrariada com todas as forças e argumentos passíveis de serem reunidos. E isso só se consegue com o recurso a uma informação com base no conhecimento organizado e competente e apresentado de forma motivadora, como se pretende conseguir no âmbito das diversas manifestações que compõem o certame Futurália. 

Em tempos de crise, cabe cada vez mais às famílias escolherem parte do futuro dos seus filhos. A Futurália neste aspecto também desempenha um papel importante, apostando no esclarecimento e na informação a essas gerações?

 É outra das vertentes que se manifestamente se pretende valorizar, rodeando-a de aspectos mais incisivos apelativos e interessantes. A geração dos pais viveu tempos diferentes, rodeada de outros desafios e ambientes, na altura tão importantes para eles como as novas circunstâncias são agora para os seus filhos. Querem o melhor para eles mas a informação disponível é tanta e por vezes tão dispersa e tão pouco escrutinada, que o aconselhamento familiar exige rodear-se de maiores cuidados e tempo disponível, o que nem sempre é possível conseguir por razões que bem se conhecem. A ideia de consagrar na Futurália um papel relevante destinado aos pais permite contribuir para contrariar aquele efeito. 

Hoje a internacionalização das instituições de ensino superior marca a agenda de muitas universidades e politécnicos. Na sua perspectiva de que forma é que essa internacionalização deve ser feita e quais as vantagens que daí podem advir?

 A importância da internacionalização, no seu conceito estratégico mais lato, representa um factor que nos tempos que correm não levanta dúvidas nem discussão. A forma que reveste a sua execução na prática pode no entanto mostrar deficiências e por vezes insuficiências que devem ser assumidas. O acesso a alguns dos programas internacionais em curso, mostra uma face muito positiva e consistente como é exemplo o programa Erasmus. A oferta de formações em língua inglesa em áreas determinantes criteriosamente seleccionadas constitui um caminho a percorrer com insistência.

A ligação estrutural de instituições do ensino superior, em academias com maior poder de intervenção no âmbito internacional, deve ser fortemente encorajada.

A organização de cursos em parceria com instituições estrangeiras pode e deve ser um desígnio estratégico. Concomitantemente, as instituições do ensino superior, para melhor cumprirem os seus objectivos de compromisso com a nação, exigem maior flexibilidade na gestão, não só utilizando melhor a autonomia de que já dispõem, mas também verem aliviadas as amarras, as que lhes são por vezes desnecessariamente impostas pelos órgãos de soberania, designadamente os ligados às finanças públicas. 

A reorganização da rede de ensino superior é um tema já antigo, mas pouco debatido de forma clara e objectiva. De que forma se pode reorganizar a rede, garantindo a coesão territorial do país e o acesso ao ensino superior à maioria dos portugueses?

 É do domínio público que a oferta actual do ensino superior, mostra sinais preocupantes de grande dispersão e de alguma inconsistência. As designações dos cursos são muitas vezes escolhidas por critérios ligados à preocupação das instituições de tornarem as suas ofertas curriculares atractivas, dando satisfação a uma procura que se tem mostrado particularmente condescendente para com as imagens promocionais de determinadas áreas temáticas.

A relação entre o nome e o conteúdo de alguns cursos apresenta-se frequentemente desajustada: Uma mesma denominação pode dar abrigo a perfis de formação muito heterogéneos e designações diferentes podem corresponder a perfis muito próximos. Daqui resulta uma opacidade perniciosa quer para os candidatos ao ensino superior, quer para os próprios empregadores.

Afigura-se que a reorganização da rede passa também por dois procedimentos. O primeiro leva a uma consagração das designações das formações reduzindo-as a um número que corresponda a uma oferta coerente, compreensível por todos os sectores intervenientes e potencialmente interessados. O segundo desembocará na formação de academias através da junção (não significa fusão) de instituições próximas, permitindo o desenvolvimento de estratégias de ofertas curriculares integradas, obedecendo a uma economia de esforços, a uma clarificação pelo menos a nível regional e a um aumento do poder de intervenção em todos os campos de actuação.

 
João Vasco
 
 
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