Editorial
Formação para toda a vida?
Um dos aspectos que ressalta da
mais recente produção em matéria educativa oriunda dos organismos
da União Europeia, reporta-se a um novo entendimento da formação de
docentes, no sentido de os preparar para assumirem a mudança
permanente como uma das condicionantes do seu percurso
profissional. Creio que, quanto a essa afirmação, existe um lato
consenso.
Segundo as recomendações divulgadas, a necessidade da melhoria da
formação inicial dos docentes não deve esconder a sua função
certificante para o exercício da docência, entendendo-a, todavia,
como ponto de partida para a formação permanente. Isto é: a
formação deve tornar-se contínua, dado que vivemos momentos de
precoce desactualização, também ela permanente.
Porém, para ser verdadeiramente contínua, a formação inicial deve
ser considerada como condição necessária, mas não imperativamente
suficiente para o desenvolvimento da profissionalidade docente. Há
mesmo quem a catalogue como o primeiro passo para a
desprofissionalização.
Assim sendo, o que se deve exigir de um sistema de formação de
professores é que procure corresponder, simultaneamente, ao
desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes,
reconhecendo-se que, cada vez mais, esse desenvolvimento se reparte
por diferentes etapas: a do formando candidato a professor, a da
indução - que corresponde aos primeiros anos de carreira, e a do
professor em exercício, já com alguma experiência profissional,
partilhada entre pares.
Este triplo entendimento tem beneficiado, infelizmente, de mais
produção teórica do que de correspondentes medidas práticas, pelo
que quase que nos atreveríamos a considerar que estamos perante um
dos grandes mitos das ciências da educação, o qual tem acompanhado
os investigadores no decurso das últimas quatro décadas.
Considera-se que o professor deve ser formado, durante a formação
inicial, para ter uma grande capacidade de adaptação. Que deve ser
sujeito a uma formação plástica e em banda larga que lhe permita
enfrentar os ventos de mudança científica, tecnológica, social e
cultural, que ocorrem a um ritmo exponencial. Com isso pretende-se
não comprometer a inovação e a renovação desejadas, e consideradas
condições indispensáveis à melhoria da qualidade de ensino e da
eficácia organizacional das escolas.
Daí a importância da aprendizagem ao longo de toda a vida, da
aprendizagem permanente. Daí a responsabilidade que todos aqueles
que se encontram envolvidos na educação têm em descobrir que também
eles são aprendizes. E este facto releva a principal mudança a que
nos referíamos: da educação para a aprendizagem permanente. O que
pressupõe uma mente que interroga, uma atitude dinâmica e uma
capacidade para continuar a reformular o nosso próprio entendimento
das coisas e das nossas convicções pessoais.
Entendida neste contexto, a formação ao longo do percurso
profissional deverá fundamentar-se na necessidade e exigência da
alteração de atitudes, mentalidades e competências profissionais e
pessoais, com vista a um melhor desempenho da prática lectiva,
tendo como horizonte a consequente melhoria da aprendizagem e o
desenvolvimento integral dos alunos. Alunos esses que são, afinal,
a única razão porque ainda existem escolas e professores.
Resta saber até que ponto todos os intervenientes no sistema
educativo estão receptivos a assumir e aceitar a decisão de passar
do que se diz, ao que faz. Ou, melhor, ao que deveria ser feito. Já
que nesta matéria, e no que respeita ao sistema educativo
português, poucas experiências significativas alteraram a percepção
de que, em termos de custos e eficácia, a formação permanente,
quantas e quantas vezes, não tem passado do estatuto mediano de um
incontornável jogo de mútuos equívocos.