Pedro Guerra, comentador do «Prolongamento»
A BTV é um case study entre os canais de clubes
O seu lema é «quem se mete com o
Benfica, leva!» O diretor de conteúdos da BTV, provavelmente o
comentador mais controverso do momento, fala das origens do seu
benfiquismo e promete continuar a «denunciar» e a «desmontar as
teses» dos adversários do clube da Luz.
Depois de
incursões como jornalista e na assessoria de imprensa, entrou no SL
Benfica, onde é desde o ano passado, diretor de conteúdos da BTV.
No que é que este canal difere dos canais dos rivais, o Porto Canal
e a Sporting TV?
Creio que a BTV destaca-se não só
pela capacidade de inovação e de aposta no rigor informativo, mas
também pela aposta na juventude. A BTV espelha bem aquilo que é o
Sport Lisboa e Benfica e os princípios que o clube defende -
lealdade, transparência, fair play, humildade, solidariedade e
respeito pelo adversário. Além disso, a BTV tem a virtude de ser
dirigida por personalidades que nunca se consideram satisfeitas com
o trabalho realizado, havendo a preocupação de fazer sempre mais e
melhor para servir os seus telespectadores. O Porto Canal é um
projeto interessante, mas de âmbito regional. Quanto à Sporting TV
é, neste momento, infelizmente, um meio de comunicação que mais
parece vocacionado para atacar os adversários de uma forma que
considero inaceitável e que devia levar à intervenção da Entidade
Reguladora da Comunicação Social.
Em
concreto, que competências estão atribuídas ao diretor de conteúdos
de um canal como a BTV?
Basicamente, tem a ver com a
escolha dos conteúdos, a definição de programas e também dos
convidados desses programas.
Crê que o
facto de ter detido durante duas épocas o exclusivo da Premier
League e desde o ano passado as ligas de França e Itália, para além
de outros conteúdos extra-futebol, levaram a que a tendência para a
clubite, natural nestes canais de clube, fosse mitigada?
Creio que sim. A BTV cresceu
imenso fruto da transmissão das Ligas Inglesa, Italiana e francesa.
O trabalho desenvolvido pelos jovens profissionais da BTV tem sido
admirável e confesso que tem sido um desafio entusiasmante. Tenho a
certeza que a BTV não seria a mesma sem estes três desafios e,
sobretudo, os jogos em casa da nossa equipa principal de
futebol.
Já foi
divulgado que os jogos do Benfica na Luz vão continuar, mais um
ano, na BTV. De que forma é que o canal, existente desde 2008, e o
primeiro do mundo a transmitir os jogos em direto e exclusivo da
equipa profissional de futebol do próprio clube, contribuiu para a
estratégia desportiva e comercial do clube que nos últimos três
anos foi bem sucedida?
A BTV é um verdadeiro "case
study" no âmbito dos canais de clube de todo o mundo. A transmissão
dos jogos em casa das duas principais equipas de futebol do Sport
Lisboa e Benfica (principal e B) é uma das imagens de marca do
canal. A forma como a BTV e os seus funcionários e colaboradores
responderam a este desafio abona muito acerca da capacidade dos
seus profissionais. O rigor informativo, a forma independente e
objetiva como essas transmissões decorreram, têm decorrido e vão
continuar a decorrer são bem esclarecedoras que os receios iniciais
não faziam sentido. Têm sido constantes os elogios de responsáveis
de outros clubes, sobretudo os mais diretos rivais do Sport Lisboa
e Benfica. Quem não se lembra de um jogador do Benfica ter sido
penalizado por causa de uma transmissão da BTV com a divulgação de
uma imagem que acabou por ser fatal para Enzo Pérez? Quem não se
lembra dos elogios que são feitos quando os adversários do SL
Benfica têm bons desempenhos competitivos ou quando marcam golos de
belo efeito? Esta é uma das imagens de marca da BTV - o rigor
informativo. Somos, seguramente, mais do que um canal de um clube.
Quanto à importância da BTV na estratégia comercial do clube, ela é
por demais evidente. Mas creio que temos sabido separar sempre e
bem as águas. A BTV não é dirigida apenas aos benfiquistas, mas
temos como grande preocupação, naturalmente, os sócios e adeptos do
nosso Clube. Queremos estar onde estão os benfiquistas.
Considera-se, como lhe chamou o jornal digital, "Observador", o
«comentador desportivo mais temido da televisão»?
Nada disso! É apenas uma opinião
do "Observador". Faço o meu trabalho e tento defender, como posso e
sei, o clube do meu coração.
"Alma
Benfiquista" é o nome do livro que lançou há poucas semanas. Para
quem ainda não leu, o livro fala mais do clube, mais do adepto ou
mais de polémicas?
O livro visa apenas dar a
conhecer um pouco dos bastidores de uma gestão de excelência e
tenta explicar como foi possível, no espaço de uma década, fazer
renascer o maior clube português, não só do ponto de vista
desportivo, mas também económico. Trata-se de um trabalho notável
de uma grande equipa, liderada por Luís Filipe Vieira, e no qual é
sempre destacado isso mesmo - o trabalho do coletivo.
Lembra-se
do dia da sua vida em que teve, pela primeira vez, a consciência
que tinha escolhido o Benfica como o clube do coração?
Claro que lembro! Os relatos
radiofónicos que ouvia em Angola dos jogos do Benfica e, sobretudo,
das performances daquele que considero o melhor jogador de sempre,
Eusébio, levaram-me a fazer a escolha certa.
«Quem se mete com
o Benfica, leva!», é o seu lema. É a frase, inspirada no célebre
«quem se mete com o PS, leva», de Jorge Coelho, que norteia
todas as suas intervenções públicas, mesmo sabendo, num ou noutro
caso, que pode não ter razão?
Foi apenas uma forma "carinhosa"
de tentar explicar a forma como vivo e sinto o Sport Lisboa e
Benfica. Creio que o clube é, muitas vezes, atacado de forma
injusta, impiedosa e com muita maldade. A ignorância e a má fé de
muitos comentadores acerca do SL Benfica, e sobretudo os ataques
provenientes daqueles que se apresentam como falsos independentes,
levam-me a denunciá-los e a desmontar as suas teses. Sei muito bem
de onde é que elas vêm e acho que é meu dever combater esses
senhores que há muitos anos enganam muita gente sob a capa de uma
falsa independência e isenção.
Admite
que o tom inflamado de certos debates no "Prolongamento" possa
contribuir para insuflar o ódio nos adeptos e criar um clima
propício à tensão e violência no fim de semana dos jogos?
Admito apenas em tese. Mas não o
faço conscientemente! O "Prolongamento" é apenas um programa de
debate entre três adeptos fervorosos, que defendem os respetivos
clubes. Admito que, por vezes, os excessos possam dar outra imagem
do programa. Mas eu acho que o futebol deve ser paixão, alegria e
festa. Longe de mim fomentar o sentimento de ódio. Eu não odeio
ninguém! Para mim, os adeptos do FC Porto e do Sporting são apenas
adversários e acreditem que tenho respeito por eles e por todos os
nossos adversários. Aliás, o respeito pelo adversário é um dos
princípios mais sagrados do Sport Lisboa e Benfica.
Não se
cansa de elogiar Paulo Portas, ex-presidente do CDS e ex-diretor do
«Independente», e Luis Filipe Vieira, presidente do Benfica, que
consigo trabalharam e trabalham. Para além da confiança que em si
depositaram, que características destaca em ambas
personalidades?
Paulo Portas e Luís Filipe Vieira
têm muito em comum. São apaixonados por aquilo que fazem, trabalham
mais e melhor do que os outros e a sua dedicação às causas em que
acreditam fazem deles dois vencedores. E têm outra característica
que aprecio - ambos conseguem fazer das derrotas oportunidades para
serem ainda melhores do que eram. Aliás, os resultados de ambos são
conhecidos e provam isso mesmo.
O
presidente do Benfica está no poder há praticamente 13 anos. Acha
que Luis Filipe Vieira pode eternizar-se na liderança do clube da
Luz, como Jorge Nuno Pinto da Costa, no FC Porto?
Não sei responder. O que eu sei é
que o Sport Lisboa e Benfica tem no seu presidente um dos seus
maiores ativos, como agora se diz na linguagem
económico-financeira. Considero-o o maior presidente da história do
clube. Acho mesmo que Luís Filipe Vieira pode ser considerado o
Cosme Damião dos tempos modernos. Apesar de Cosme Damião, como é
sabido, nunca ter aceitado ser presidente do clube. Mas todos
sabemos que ele foi a alma do Sport Lisboa e Benfica. Luís Filipe
Vieira conseguiu revolucionar o clube, reformando-o. Espero que ele
se recandidate este ano e que cumpra, pelo menos, mais um mandato.
O clube não pode passar sem ele. Sinto-o e a massa associativa e
massa adepta do clube pensa o mesmo. Veja-se o resultado da última
Assembleia Geral do Sport Lisboa e Benfica - o Orçamento do Clube
para 2016/17 foi aprovado com a maior votação de sempre - quase
93%.
Bruno de
Carvalho e Jorge Jesus têm sido dois dos seus principais focos. Ao
primeiro chamou de «pirómano», ao segundo acusou-o de «traidor».
Este assestar de baterias do Dragão para Alvalade deve-se apenas ao
enfraquecimento desportivo do FC Porto?
Nada disso. FC Porto e Sporting
são dois grandes clubes, dois adversários poderosos e temíveis.
Tenho muito respeito por estas duas instituições. Apenas não me
revejo na forma como são dirigidas hoje, na conduta de alguns dos
seus dirigentes e, sobretudo, na postura do atual treinador do
Sporting, que se portou de forma incrível com o Sport Lisboa e
Benfica após seis anos de ligação ao clube. Talvez pelo facto do
Sporting ter sido mais competitivo este ano e de ter lutado até ao
fim pela disputa do campeonato nacional se tenha falado mais do
Sporting esta época.
O debate
sobre a formação é sempre o mesmo: quem forma mais, quem forma
melhor e quem vende mais caro. A contratação de Renato Sanches pelo
Bayern de Munique indicia que o CampusCaixa do Seixal é,
atualmente, o melhor viveiro de talentos de Portugal?
Os números falam por si. Olhemos
para as convocatórias para as seleções da formação e o que é que
constatamos? O Sport Lisboa e Benfica é o clube com mais atletas
convocados. Seja nos Sub-15, nos Sub-16, nos Sub-17, que venceram
brilhantemente o Europeu em Baku, nos Sub-18, nos Sub-19, que vão
disputar o Europeu na Alemanha, e agora nos Sub-20 que estiveram no
prestigiadíssimo Torneio de Toulon, em França. Pelo sexto ano
consecutivo o Sport Lisboa e Benfica é o clube com mais jogadores
convocados para as diversas seleções nacionais. O caso do Renato
Sanches é um bom exemplo da forma como se trabalha naquela que é
considerada, neste momento, como a melhor Academia de Futebol do
Mundo. Isto sem pôr em causa o trabalho desenvolvido pelo FC Porto
e pelo Sporting, claro! Quanto a quem vende mais caro, nem vale a
pena falar muito. Os números dizem tudo! Felizmente, hoje em dia os
jovens talentos do Benfica não precisam de sair do clube para
chegarem ao topo do futebol português!
Filipe
Santos Costa chamou-lhe no livro sobre o "Independente - A
máquina de triturar políticos" o «tituleiro emérito». Que titulo, à
Pedro Guerra, daria ao estado do futebol português?
Foi uma simpatia do autor do
livro! Quanto a um título para o futebol português… talvez «A
Grande Ilusão», inspirado num filme de Jean Renoir, de 1937. Esse
filme retrata episódios durante a Primeira Guerra Mundial e a forma
como num campo de prisioneiros, na fronteira franco-alemã, as
dificuldades obrigaram a que homens inimigos se tenham unido, tendo
prevalecido os gestos de solidariedade às razões de ordem política
e até de nacionalidade. Acho que o futebol português precisa disso
mesmo - união de todos e todos juntos a remarem para o mesmo
lado.
Nuno Dias da Silva
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