Opinião

Novo Acordo Ortográfico
Língua Portuguesa em Macau

li changsen.jpgApós várias tentativas de se unificar a ortografia da língua portuguesa, a partir de 1º de Janeiro de 2009 passou a vigorar no Brasil e em todos os países da Comunidade de países de Língua Portuguesa (CLP) o período de transição para as novas regras ortográficas que se finaliza em 31 de Dezembro de 2012. Trata-se de uma novidade de relevante significado em Macau.

O Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa é um tratado internacional assinado em 16 de Dezembro de 1990, em Lisboa, por representantes oficiais de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe, com a presença de uma delegação de Galiza. Em 2004, depois de sua independência, Timor Leste aderiu ao acordo. Esse acordo é resultado de negociações iniciadas em 1980 entre a Academia de Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Mesmo com 10 anos de negociações, estudos, pesquisas e troca de informações o texto final do acordo, como era esperado, não obteve consenso.

Devido à presença portuguesa em Macau por mais de 400 anos, o governo deste território sempre seguia as normas de ortografia aplicada em Portugal antes da transferência do poder administrativo à República Popular da China. Na sequência do Decreto-Lei n.º101/99/M, de 13 de Dezembro, que regulamenta as línguas oficiais de Macau, o Governador de Macau determinou as normas da ortografia da língua portuguesa com a publicação do Decreto-Lei n 103/99/M.


Artigo único

(Ortografia da língua portuguesa)

Até à publicação de novas normas, a ortografia da língua portuguesa rege-se pelo regime previsto no Decreto-Lei n 35 228, de 8 de Dezembro de 1945, que aprovou o acordo de 10 de Agosto de 1945, resultante do trabalho da Conferência Interacadémica de Lisboa, para a unidade ortográfica da língua portuguesa, cujos instrumentos, elaborados em harmonia com a Convenção Luso-Brasileira de 29 de Dezembro de 1943, foram publicados no Boletim Oficial de Macau n.º 36 do Dia 7 de 2 Setembro de 1946.

Desde a fundação da RAEM, não há nenhuma legislação sobre a ortografia da língua portuguesa, implicando que o documento jurídico de 1945 continua a reger as normas de ortografia até hoje em Macau. O Acordo Ortográfico de 1945 é uma convenção ortográfica assinada em Lisboa em 6 de Outubro de 1945 entre a Academia de Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Este acordo, ligeiramente alterado pelo Decreto-Lei n.º 32/73, de 6 de Fevereiro, estabelece as bases da ortografia portuguesa para todos os territórios portugueses (que à data do acordo e até 1975 eram Portugal e as colónias portuguesas - na Ásia e África) e o Brasil.

Por seu turno, o Decreto 35.228, de 8 de Dezembro de 1945 está composta por uma introdução mais cinco artigos, explicitou os princípios de fixação para a grafia da língua portuguesa, fixada a data de 1 de Janeiro de 1946 para sua entrada em vigor. Entretanto, nunca parou a polémica sobre o acordo ortográfico durante meio século, por causa de divergências diversas. Agora, os países lusófonos concordaram finalmente com a aplicação do novo acordo ortográfico da língua portuguesa, através de repetidas negociações.

A entrada em vigor do novo acordo ortográfico corresponde às necessidades da época em que a tecnologia de informática teve um incrível desenvolvimento e a globalização tornou-se um entendimento comum de toda a humanidade. A nova ortografia da língua portuguesa dará mais facilidade aos contactos entre os seres humanos, nomeadamente no seio da CPLP, e também trará novas perspectivas para a mesma poder incrementar os intercâmbios em todas as áreas com o resto do mundo, inclusive a República Popular da China.

Por causa da grande diferença das culturas e das estruturas da língua, a maior parte de chineses não conhecem muito bem o significado do termo "ortografia" na cultura ocidental. De facto, entretanto, a China também viveu por um longo período de reforma das regras da língua chinesa escrita de caracteres clássicos para caracteres simplificados em meados do século passado. Neste sentido, o Novo Acordo Ortográfico da língua portuguesa tem o mesmo valor com o Projecto de Simplificação dos Caracteres da língua chinesa, aprovado na 23ª reunião plenária do Conselho de Estado em 28 de Janeiro de 1956.

Porém, a caminhada da simplificação dos caracteres chineses não foi nada fácil. Depois de entrada em vigor do projecto de simplificação, o documento sofreu três vezes de actualização, até Maio de 1964 em que foram simplificados 2,238 caracteres chineses. Por outro lado, a divulgação do projecto foi mais difícil nas regiões remotas carenciadas de condições pedagógicas de base. Por isso, a aplicação do Novo Acordo Ortográfico da língua portuguesa poderá enfrentar as mesmas dificuldades, apesar de ser muito menos do que o caso da língua chinesa, que trouxe até hoje muitas polémicas em Hong Kong, Macau, Taiwan e mesmo na China Continental.

Macau não tem vinculação com Portugal nem com outros países lusófonos, mas a Lei Básica da RAEM determina uma posição especial a Macau na política linguística. Segundo o Artigo no 9 da referida Lei, a língua portuguesa constitui uma das línguas oficiais da RAEM. Neste contexto, Macau pode não ser signatário do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, mas deve respeitar as estipulações do Novo Acordo, pois além de facilitar os contactos com os países da língua portuguesa, a aplicação do novo acordo em Macau demonstrará o estrito cumprimento da Lei Básica e a maior atenção à comunidade portuguesa.

Sendo o português uma das línguas oficiais da RAEM, o governo de Macau deverá tomar uma posição explícita, ainda que não haja vínculo a Portugal nem aos países lusófonos. É lógico que Macau vai seguir a mesma política, apesar de passos lentos, pois até agora e pelo menos para várias dezenas de anos do futuro, a língua portuguesa foi, é e será uma língua jurídica e administrativa de influência na vida social de Macau. Como primeiro passo, as instituições de ensino da língua portuguesa têm que divulgar a nova ortografia e introduzi-lo nas aulas de língua portuguesa.

Como uma instituição que tem curso de língua portuguesa, nomeadamente com sua ESLT de mais de cem anos de história na formação de tradutores e intérpretes, o IPM sempre presta atenção às normas da língua de Camões. Para coordenar todos os trabalhos académicos e de cooperação entre a China e os países lusófonos, foi criada no ano passado a Comissão para Ensino e Investigação da Língua Portuguesa no IPM. Perante esta nova situação da língua portuguesa, a CEIP declara oficialmente ao público que o IPM apoiará sem reserva o Novo Acordo Ortográfico e adoptará medidas prontas para introduzir o novo acordo no ensino da língua portuguesa.

O IPM apela a todas as instituições de ensino médio e superior e de administração pública ligadas à língua portuguesa da RAEM que adoptem medidas uniformizadas para respeitar o Novo Acordo Ortográfico, a fim de facilitar os contactos com o mundo lusófono, em benefício à cooperação e aos intercâmbios cultural, económico, comercial, jurídico e administrativo da China com os países da língua portuguesa via Macau. O facto também tem significado para cumprir a Lei Básica da RAEM e manter a continuação da política de Um País e Dois Sistemas.

Li Changsen
Doutor de História e Professor Coordenador do Instituto Politécnico de Macau
 
 
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