Investigação no Minho analisa discurso
Parlamento mais agressivo
Os debates da Assembleia da
República (AR) são alvo de uma espiral de agressividade verbal,
quer no tipo quer na frequência, o que é transversal a todas as
bancadas. O alerta é de Aldina Marques, professora do Departamento
de Estudos Portugueses e Lusófonos da Universidade do Minho, que
analisa os discursos no Palácio de São Bento há duas décadas.
Alguns deputados chegam a cultivar
essa agressividade com insultos ad hominem, acusando o adversário
de "mentiroso", por exemplo. Assunção Esteves, tal como os seus
antecessores na presidência da AR, "permite bastante tolerância"
aos deputados para construírem o discurso. "As consequências são
intervenções mais agressivas, embora não transgressoras dos códigos
parlamentares".
O Regimento prevê a defesa da
honra, que é usada raramente nestes casos. Aldina Marques considera
que alguns líderes da oposição têm adotado esta prática mais
"musculada", de confrontar o adversário, a que não será alheia a
tensão política criada pelo contexto de crise. "É também por aqui
que se constrói a anti-imagem dos políticos, a descredibilização da
classe política tem origem, também (mas não só), nos discursos que
eles próprios constroem", refere a docente da Universidade do
Minho.
O tom agressivo é particularmente
visível nos apartes, em que há mais liberdade de linguagem e não
são considerados interrupções, elucida Aldina Marques. De forma
sistemática surgem aí a ironia, o sarcasmo, as provocações, para
além dos típicos coros de suporte ao orador - "muito bem, apoiado"
- de colegas de bancada. "Falar é poder, é um exercício de
influência", anui a linguista, "daí que os deputados parlamentares
e os membros do Governo tentem subterfúgios para prolongar por mais
uns segundos que seja o uso da palavra".
A disponibilização recente dos
debates da AR em suporte audiovisual permite-lhe avaliar agora
parâmetros como gestualidade, mímica ou a expressão do olhar, para
encontrar sentidos implícitos e explícitos. "Claramente, o discurso
parlamentar é um género específico, muito diferente, por exemplo,
dos que têm lugar nos congressos partidários ou em contexto
eleitoral", diz Aldina Marques, que dedicou a tese de doutoramento
ao tema "Funcionamento do Discurso Político Parlamentar -
organização enunciativa no Debate da Interpelação ao Governo"
(2000).