Entrevista

Rui Costa, ciclista
«Um português à conquista do Tour»

Rui Costa1.jpgA poucos dias do início da Volta a França, Rui Costa fala sobre as suas ambições na mais importante prova velocipédica do mundo e do sonho que seria chegar a Paris vestido de amarelo. 

Estamos a poucas semanas do início da Volta a França, que principia a 7 de julho em Utrech, na Holanda. Quais as suas perspetivas para uma corrida em que, ao contrário dos outros anos, está a apostar forte, tendo mesmo prescindido da Volta à Suiça, prova que ganhou três vezes?

Antes de mais obrigado pela oportunidade que me dão de falar com os adeptos do ciclismo em Portugal. Eu não estou a apostar mais nem menos no Tour, apenas fiz uma pequena alteração de calendário para testar em que forma física chego à Volta à França. A minha preparação para as corridas é sempre a mesma, treinos fortes de montanha e o calendário idêntico. Vamos lá ver como corre. Apenas posso prometer o meu melhor.

É sabido que o ciclismo é uma modalidade que conta com muitos imponderáveis. Quedas, um dia mau, o ano passado abandonou devido a uma bronquite, etc. Dava-se por satisfeito com um lugar nos 10 primeiros e uma vitória de etapa no Tour?

O ano passado, comecei a segunda semana com bronquite e continuei em competição por mais uma semana. O meu estado de saúde agravou para uma broncopneumonia e fui mesmo obrigado a desistir, caso contrário podia estar a por em risco a minha carreira ou até a minha própria vida. Se eu ficaria feliz com um top 10? Sem dúvida que sim. Se ficaria feliz com uma vitória de etapa? Muito. Se fossem as duas juntas? Seria fantástico, mas difícil de conciliar.

O Tour deste ano tem sete etapas de montanha, cinco finais no topo, um contra relógio individual e um contra relógio por equipas. Em termos teóricos o traçado encaixa nas suas características?

O Tour encaixa sempre nas características de trepadores, corredores pequenos e leves que passem melhor as montanhas, que é onde se faz a diferença na montanha. Eu não sou trepador, nem rolador nem sprinter. Sou um corredor que se defende em todos os terrenos, mas não sou especialista em nenhum deles. Por isso, é difícil saber até que ponto posso um dia estar na discussão de uma grande volta tão dura como é a Volta a França.

A regularidade é uma das suas características. Ocupa, atualmente, o 9.º lugar do ranking da UCI. Aos 28 anos sente que está no seu período de maior maturidade desportiva e na plenitude física e psicológica? 

Sem dúvida que me sinto a evoluir um pouco de ano para ano e me sinto mais seguro psicologicamente. Mas esta modalidade também depende da sorte e isso não se consegue controlar em nenhuma idade ou em qualquer condição física.

Transferiu-se este ano dos espanhóis da Movistar para os italianos da Lampre. Como chefe de fila confia na qualidade da sua equipa para o trabalho que tem de fazer para si?

Claro que sim, temos uma equipa muito boa e muito forte. Juntos daremos o nosso melhor para fazer o melhor resultado possível no Tour.

Rui Costa4.jpg

Para quem não sabe, como descreveria o dia de um ciclista numa grande prova, como o Tour, o Giro ou a Vuelta, desde que acorda até que se deita?

Resumidamente é um dia stressante...uma correria. Despertamos e vamos logo tomar o pequeno-almoço. Depois passamos cerca de cinco horas em prova. Terminamos por volta das 17 horas a competição. Entre massagem e jantar está terminado o nosso dia. Não sobra tempo para mais nada..

Em sonhos já sonhou chegar a Paris de camisola amarela ou esse objetivo é mais real do que se pensa?

É o sonho de todos os ciclistas, visto que o Tour é a nossa competição mais importante. Mas para já não passa disso mesmo, de um sonho.

Joaquim Agostinho conserva o estatuto de português com o melhor desempenho no Tour com dois terceiros lugares. Nasceu dois anos depois da morte de Agostinho, tragicamente falecido, depois de uma queda na Volta ao Algarve. Daquilo que sabe e que leu, que traços destaca do que ainda é considerado o melhor ciclista português de todos os tempos?

A principal característica que destaco é a sua força. Tinha uma força bruta impressionante e nada lhe metia medo. Um grande senhor que eu admiro e tento seguir as suas pisadas.

O dia mais feliz da sua carreira desportiva foi a vitória no mundial de estrada de Florença, em 2013. Trocava um triunfo no mundial de estrada por uma medalha nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro?

É uma resposta difícil. O melhor mesmo é tentar outra medalha e não ter que escolher (Risos).

É incontornável falarmos de doping. O caso Lance Armstrong está ainda muito presente, apesar dos controles serem frequentes em treino e corrida e do passaporte biológico. Para quando uma modalidade limpa, credível e livre de batoteiros?

O ciclismo é a modalidade com mais controlos anti-doping. Mesmo assim, segundo as últimas estatísticas, o ciclismo não está no top das modalidades com mais casos de doping. Pelo que sei, nem em Portugal nem a nível internacional. Mas, infelizmente, os media apontam o dedo sempre na mesma direção e sem razão. Arrisco-me a dizer que nos dias de hoje, a nossa modalidade é das mais limpas de todo o desporto. O que há muitos anos atrás era regra no ciclismo, hoje representa uma exceção. No ciclismo já se mudaram as mentalidades. O próximo passo será mudar as mentalidades dos jornalistas.

Rui Costa3.jpgPorventura muitas pessoas não sabem, mas os prémios ganhos no ciclismo, especialmente nas grandes provas são a dividir por todos os elementos da equipa. É preciso representar uma equipa da elite do ciclismo para ser bem remunerado?

Sem dúvida que no escalão World Tour somos muito melhor remunerados. Além disso, existem os prémios das vitórias e sim, dividimos os prémios pelos colegas e auxiliares que trabalham todos juntos para que um possa ganhar.

Uma pergunta de educação para concluir. Houve tempos em que os ciclistas pouca ou nenhuma formação tinham. Entretanto, o panorama mudou, estes atletas são, globalmente, pessoas informadas, recorrem às novas tecnologias para melhorar a sua performance e têm um discurso fluído.  Em que medida é que este novo perfil do ciclista moderno contribui para melhorar o desempenho em estrada?

Eu confesso que não sou o melhor exemplo, mas tento melhorar dia a dia. O bem falar e agir, é sem dúvida importante para deixar um bom exemplo para os mais jovens que nos seguem e de modo a passar uma boa imagem deste desporto que tem vindo a crescer ano após ano.

Nuno Dias da Silva
Direitos Reservados
 
 
Edição Digital - (Clicar e ler)
 
 
Unesco.jpg LogoIPCB.png

logo_ipl.jpg

IPG_B.jpg logo_ipportalegre.jpg logo_ubi_vprincipal.jpg evora-final.jpg ipseutubal IPC-PRETO