Quem gosta de ir à escola?
Nos últimos anos temos vindo a assistir
a um desenvolvimento significativo dos estudos que nos permitem
conhecer as razões que levam os professores a atingirem estádios de
"mal-estar", "desencanto" e "stress" profissionais, e muitos são os
estudos de elevada credibilidade que revelam precisamente esses
sintomas e efeitos do desgaste ou erosão profissionais.
É que, em boa verdade, todos sabemos, e já o repetimos até à
exaustão, que a formação de professores, enquanto processo que visa
a mudança, correrá sempre o risco de encontrar resistências. Umas,
catapultadas por determinados "períodos" psico-profissionais que os
docentes atravessam. Outras, resultantes das políticas educativas,
da estrutura organizativa da escola, do estatuto regulador da
carreira, e (porque não?), do próprio processo como essa formação
foi levada junto dos docentes, de modo mais ou menos
impositivo.
Não é menos verdade que, mesmo quando a adesão a iniciativas
inovadoras é voluntária, a ausência de finalidade de alguns
projectos de reforma (pontuais ou estruturais), a ausência de
avaliação do processo e dos produtos realizados, a política "do
alterar, pelo alterar", também têm contribuído para o
"desinteresse", o "afastamento" e até a "resistência" de muitos dos
docentes que, à partida, se galvanizaram nesses projectos.
Infelizmente, são demasiados os casos em que os professores se
encontravam em ciclos da carreira de desinteressada dádiva ao
sistema, à escola e aos alunos, e que os levaram a optimizar o seu
investimento pessoal, uma e outra vez, até que o desencanto os
contaminou, inesperadamente. Acresce ainda que o sistemático
retomar de promessas incumpridas de verdadeira descentralização do
sistema educativo, e a negação de se atribuir mais poder de decisão
aos professores e às escolas, também têm contribuído para que a
resistência se enquiste no sistema, transformando as sinergias
naturais em processos de entropia, por vezes incontroláveis.
À falta de poder e de controlo dos professores, no que respeita ao
seu trabalho, transformando-os em simples executores de decisões
tomadas por hierarquias distantes e sem rosto (a partir das quais
as "ordens" se tornam impessoais e difusas, e em que as
responsabilidades se diluem), tem conduzido à progressiva
desprofissionalização dos professores.
E atribui-se essa situação a muitos factores: o cansaço físico e
moral, a falta de reconhecimento social do papel dos docentes, a
falta de protecção perante o vandalismo e a violência com que
acrescidas vezes se deparam nas escolas, a falta de recursos, os
horários inadequados à sua função formadora, a escassa formação
para gerir novos programas, a pressão dos pais e outros agentes
sociais, a intensificação da atribuição de novas tarefas e funções,
a perda do seu estatuto remuneratório….
Esta desprofissionalização, que alastra em boa parte dos sistemas
educativos europeus, é uma das razões apontadas para a criação de
um progressivo clima de mal-estar nos sistemas educativos. Pelo que
é necessária alguma clarividência para conhecer os factores que
fazem peculiar o acto educativo, reconhecendo-se a necessidade de
procurar as causas estruturais que condicionam essas situações
vivenciadas pelos docentes, já que os professores devem ter
expectativas ajustadas às suas possibilidades.
Apesar dos êxitos e dos fracassos se alternarem na sua actividade,
os docentes deveriam manter expectativas positivas e o entusiasmo
que os faz correr ao encontro de novos caminhos e da utopia,
mantendo a força das ilusões, apesar dos fracassos circunstanciais.
E até porque não se mudam instituições sem mudar as práticas que as
produzem no dia-a-dia.
Daí que todas as iniciativas que ajudem a promover a auto-estima
dos docentes e o seu bem estar profissional se revelem
indispensáveis para combater o desalento que grassa em boa parte
das nossas escolas e que se arrisca a minar, irremediavelmente, o
sistema educativo português.