primeira coluna
É preciso saber ouvir o povo
A reorganização da rede de ensino em
Portugal, aliada às medidas de austeridade já anunciadas, está a
deixar marcas na escola pública. Uma escola que se quer a tempo
inteiro e que, no ensino obrigatório, deve ser gratuita para todas
as crianças e jovens portugueses ou a residirem no nosso país.
Na escola pública vive-se hoje um clima de medo e de falta de
esperança. Os alunos sentem isso, os professores e os funcionários
também, o mesmo sucede com os pais e encarregados de educação.
Não há avaliação dos professores como a realizada noutros tempos
próximos, mas há a ameaça da mobilidade especial, dos
mega-agrupamentos, e do encurtamento das atividades
extracurriculares no 1º ciclo. Um 1º ciclo que este ano voltou a
ter exames nacionais de 4º ano, os quais na língua portuguesa viram
litoralizado o discurso narrativo nos textos apresentados (no país
real há muitas crianças que nunca viram o mar, nem foram à praia,
do mesmo modo que há muitas outras que nunca viram a neve), que
transportaram os alunos para as escolas sede de agrupamento (uma
lógica que não convenceu pais nem alunos), e que deu a maioridade a
crianças de 9 e 10 anos, as quais assinaram um termo de
responsabilidade em como não levavam para dentro da sala o
telemóvel. Não leiam nestas palavras alguma oposição da minha parte
aos exames nacionais. Sou daqueles que defendem a realização de
exames nacionais, mas entendo que não seria necessário tanto ruído
à sua volta.
Mas a reorganização da rede de ensino pode atingir também
universidades e politécnicos. É assim porque não há dinheiro, nem
há alunos, dizem muitos dos que defendem a teoria que é a fechar
serviços que o país progride. Não, não tem que ser assim, digo eu.
A maioria das instituições de ensino superior não contribuiu para o
défice, tem conseguido alocar nos seus orçamentos elevadas verbas
provenientes de receitas próprias que não as do Estado. Tem
conseguido, através de projetos de investigação, ou de inovação,
fundos comunitários. Mas tem, acima de tudo, qualificado o país,
dando-lhe uma coesão territorial que mais nenhumas outras
instituições conseguirão dar.
Governar não é uma tarefa fácil e tomar decisões numa altura
como a que agora atravessamos também não. Mas há um ditado
democrático que deve imperar em todos os momentos, sejam eles
fáceis ou difíceis. Deve saber-se escutar o povo. E hoje, mais que
nunca, importa saber ouvir também os de dentro, tendo sempre a
certeza de que ninguém vai beneficiar com o fecho do que quer que
seja…