Opinião

‘Pedagogia (a)crítica no Superior’ (XXI)
(In)visibilidade editorial

FotoLSouta2015peq.jpg«Vale a pena ler livros novos?»

(José Pacheco Pereira, Público, 15/11/14)

 

«Não está tudo já escrito e reescrito com qualidade já testada e com real ligação com o que de mais indispensável existe na nossa história cultural?» Esta é a pergunta central do artigo de Pacheco Pereira que me serviu para epígrafe. Responder afirmativamente seria admitir «o fim da história» (F. Fukuyama, 1989), só que agora no campo da literatura e da ensaística. Escrever constitui um impulso humano, uma necessidade intelectual que impele, aqueles que a sociedade chama 'escritores', a partilhar com os outros, os leitores sem nome e sem rosto. Essa gente que subscreve a afirmação de José Jorge Letria na entrevista a este jornal (Fevereiro de 2017, p. 5): «Quanto mais lemos, mais livres somos.» O genuíno acto da escrita é a emanação da liberdade e, por isso mesmo, imune a pressões, designadamente, as da academia e da tutela, mais preocupadas com «avaliações puramente quantitativas ou bibliométricas» (A. Nóvoa, 2014).

Entre a trintena de companheiros e amigos, que quase enchiam aquela sala sóbria, ladeada de esculturas de pedra de Vergílio Domingues, no 1º andar de um edifício clássico reconvertido em Galeria de Exposições, o Prof.S. alegrou-se ao ver quatro ex--estudantes que frequentaram uma das escolas superiores daquela cidade, mas em diferentes cursos e em diferentes anos (não iam em grupo, não se conheciam). Foram seus alunos, num só semestre. Depois disso, pouco mais contacto teve com eles. Hoje reencontra-os, homens e mulheres maduros, casados, confiantes e empenhados nas suas carreiras profissionais (fotografia, ensino, animação). O que os levara ali, num fim de tarde de sábado chuvoso?

Nestes ritualizados momentos - apresentação de livros -, que os escritores tanto valorizam e em que tanto se empenham, a comparência de colegas e amigos é encarada como uma forma de solidariedade editorial e também de reforço das relações pessoais (quantas vezes interrompidas pelas vicissitudes da vida) e só depois vem a aquisição do mais recente livro da pessoa com quem se partilha(ou) «dias comuns» (familiares, profissionais ou literários). O Prof.S. fica grato a todos e a cada um. Disso dá conta na altura de autografar a obra, personalizando a escrita em função do destinatário. Também aqui, revela a sua aversão à burocracia de amanuense, traduzida no 'chapa oito' do «com estima e consideração». Mas foram aquelas quatro inesperadas presenças, os seus ex-alunos (a quem nem convite enviou!), que mais o tocaram. Falou com cada um, e naqueles breves momentos, procurou satisfazer a sua curiosidade, questionando-os sobre os tempos do pós-curso. Eles, em contrapartida, fizeram questão em relembrar-lhe (em palavras simpáticas e não de circunstância) os tempos lectivos do docente cuja pedagogia os marcou. O Prof.S. está bem ciente que «[c]ada dia se publica mais. Cada dia se lê menos.» (A. Nóvoa, 2014). Todavia, acreditava que aqueles quatro estavam ali por livre vontade, desejosos de manifestar apoio mas igualmente ávidos de novas leituras.

Quanto aos jornalista, nem vê-los. Há muito que a imprensa deixou de ter suplementos literários e profissionais especializados na cultura do papel impresso (sobrevive o JL e pouco mais). As prioridades dos media são de outra ordem: a política, a economia, o futebol. E assim, a 'agit prop reconfigurada' (como o Prof.S. chama às newsletters do seu instituto), que só divulga o que vem na comunicação social escrita, não dirá uma palavra sobre o novo livro deste seu «colaborador». Porque não vão além do clipping que, a maior parte das vezes, selecciona um texto apenas porque traz uma referência formal ao instituto ou a uma das escolas mas onde não há nada de substantivo sobre os mesmos. Paradoxo: as escolas superiores precisam das publicações dos seus docentes como de pão para a boca pois elas são a maior 'garantia da qualidade' institucional e tal é crucial na 2ª fase do processo de avaliação e certificação que agora se iniciou (centrado já não nos cursos mas no funcionamento das universidades e dos politécnicos e suas unidades orgânicas). Só que a política editorial destes gabinetes de comunicação e imagem, que deviam ajudar a dar visibilidade a essa produção do corpo docente, fica-se, comodamente, pela divulgação do que lhes remetem as empresas de clipping. Como se não houvesse vida para lá dos jornais!

Luís Souta
Este texto está redigido segundo a “antiga” e identitária ortografia
luis.souta@ese.ips.pt
 
 
Edição Digital - (Clicar e ler)
Unesco.jpg LogoIPCB.png

logo_ipl.jpg

IPG_B.jpg logo_ipportalegre.jpg logo_ubi_vprincipal.jpg evora-final.jpg ipseutubal IPC-PRETO