primeira coluna
Retenções e reflexões
Isabel Alçada,
ex-ministra da Educação, defende que os cerca de 380 milhões de
euros que o Estado português gasta devido às retenções de alunos,
poderiam ser investidos para se criar "um modelo de prevenção para
apoiar os alunos e as famílias". No seu entender, "as retenções
deveriam ser uma exceção e não uma regra".
As declarações Isabel Alçada
merecem reflexão e devem ser vistas como um ponto de partida para
aquilo que a escola trabalha, para as responsabilidades que os
alunos e as suas famílias devem assumir e para o que a sociedade
deseja de si própria. Quero com isto dizer que, tal como revela o
atual ministro da tutela, Portugal deve encontrar caminhos para
reduzir a elevada taxa de alunos com retenções no seu percurso
escolar.
"Em Portugal mais de 30% dos jovens
com 15 anos já apresentam uma retenção no seu percurso escolar e
ainda demasiados deles, demasiados de nós, apresentam mais do que
uma retenção". As palavras são de Tiago Brandão Rodrigues, o atual
ministro da Educação, que não se conforma com o facto de Portugal
estar entre os "três países da OCDE que apresentam maior taxa de
retenção entre as mais de sete dezenas de países ou economias que
este relatório analisa, quase triplicando a taxa média da OCDE, que
ronda os 13%".
Ou seja, o país tem um caminho que
deve ser percorrido pela escola, enquanto instituição, mas também
pelos seus alunos, professores e pela comunidade familiar e
académica. Os alunos devem perceber que estão na escola para
aprender, para se tornarem homens e mulheres qualificados, capazes
de enfrentar um mundo que está cada vez mais em mudança e que é
imprevisível. É evidente que a história não é tão linear e que
neste processo de ensino-aprendizagem e sucesso há muitos
condicionantes, alguns dos quais externos.
Aos professores compete ensinar. E
quanto difícil é ser--se professor. As dificuldades são muitas.
Turmas grandes; a sua figura fragilizada perante a sociedade
(quando deveria ser valorizada); burocracia em excesso (há reuniões
para tudo e por nada e ainda para mais alguma coisa; excesso de
documentos); a que acresce uma falta de educação, cada vez mais
crescente, por parte de alunos e das suas famílias; desencanto dos
professores pela profissão docente (também o há) o que prejudica o
processo de ensino; e também alguma falta de profissionalismo
(felizmente aparenta ser residual), dificuldade de adaptação aos
tempos digitais, etc.
Neste triângulo surgem ainda as
comunidades familiar (os contextos são cada vez mais
diversificados, a família tradicional tem vindo a perder terreno)
que devem ter a capacidade de educar, acarinhar e quando necessário
atuar; e académica onde os caminhos e as ideias se cruzam com o
intuito de melhorar o que está menos bem, e que a própria tutela,
ou órgãos diretivos, deveriam incentivar e às vezes moralizar.
Se houvesse uma varinha mágica que
triturando tudo isto, melhorava tudo, já há muito tempo que os
problemas estavam resolvidos. Mas não há. Importa por isso refletir
e agir. Refletir sobre o que foi e o que pode ser feito para que,
num contexto em que a exigência e a disciplina nunca sejam postas
em causa, o número de retenções diminua. Certamente que os tais 380
milhões de euros poderiam desatar muitos nós. No entanto, muito do
que tem que ser feito não passa apenas pela escola: passa também
pela casa de cada um.