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Bocas do Galinheiro
Uma boa dose de Spaghetti Western

butterfly-spaghetti-western-heroes copy.jpgQuando um dia destes fui ao Cine Teatro Avenida assistir a "Django Libertado", de Quentin Tarantino, foi como regressar ao mítico "galinheiro" de há 30 e tal anos atrás quando os dominavam as preferências e eram reis e senhores, mais tarde substituídos pelas fitas de artes marciais, primeiro de Bruce Lee (ainda um dia a ele voltaremos, porque o merece) mas dos seus derivados de série Z, alguns misturando os dois estilos, como um tal "Kung-Fu no Oeste Selvagem", realizado por Yeo Ban Yee, que só conheço da folha da Filmitalus, uma distribuidora especializada nestes géneros, bem como do peplum e, claro que a seguir a abril de 74, das pornochonchadas made in Italy, mas, também da reposição de alguns marcos das coboiadas mediterrânicas como seja a chamada trilogia dos dólares, de Sergio Leone.

Iniciada com "A Fistfull of Dollars" (Por Um Punhado de Dólares, 1964) uma adaptação livre de "Yojimbo", de Akira Kurosawa, com Clint Eastwood no papel do forasteiro que chega a San Miguel, uma pequena cidade mexicana onde reinam dois bandos rivais e que muitos tiros e mortes depois, não só fica rico como limpou a cidade dos dois bandos, era dada visibilidade a um género que apesar de não ser novo na Europa, já havia vários western filmados na Alemanha e em Espanha, mas, diga-se, não tão bons como os de Leone. A projeção internacional do spaghetti western, continua pela mão deste realizador com "For a Few Dollar More (Por Alguns Dólares Mais, 1965) e "The Good, The Bad and the Ugly (O Bom, o Mau e o Vilão, 1966), sempre com Clint Eastwood e, elemento fundamental, a música de Ennio Morricone, outro ícone do género. Daqui para a frente o crescimento deste Oeste, que medrou na Cinecittà e nos arredores de Almeria, foi exponencial, tal como as estrelas que dele emergiram, como Giuliano Gemma e o seu Ringo, em "Uma Pistola Para Ringo", 1965 e "O regresso de Ringo", 1965, ambas de Duccio Tessari, Lee Van Cleef, o temido Sabata, em "Day Of Anger" (Gigantes em Duelo, 1967), de Tomnino Velerii, também com Gemma, Sartana, visto em "Sartana Reza Pela Tua Morte", 1968, de Gianfranco Parolini, com Giani Garko e Klaus Kinski, um frequentador habitual como mau na fita nestes filmes e, lá chegámos, "Django", 1966, interpretado por Franco Nero, com realização de Sergio Corbucci que, intencionalmente, pretende fugir à linha iniciada por Leone e cria um anti-herói que troca o poncho de Eastwood por um casacão da União e que entra na cidade arrastando um caixão de onde, mais tarde, sairá uma metralhadora. Apesar dos vários western que protagoniza, incluindo "O Mercenário", 1968, também de Corbucci, Franco Nero fica para sempre ligado ao personagem de Django, e não é por acaso que Tarantino dá este nome ao seu anti-herói de "Django Libertado".

Em 1858, no Oeste selvagem, EUA, três anos antes da Guerra Civil americana em que o tema da escravatura é recorrente, o Dr. King Schultz (Christoph Waltz), dentista e caçador de recompensas, compra o escravo Django (Jammie Foxx), que tenciona libertar em troca de um pequeno favor: ajudá-lo a encontrar, os irmãos Brittle, assassinos com a cabeça a prémio, mortos ou vivos. Depois de conseguido o feito, os dois acabam aliados e Schultz decide ajudar o ex-escravo a encontrar Broomhilda (Kerry Washington), a jovem esposa de quem perdeu o rasto algum tempo antes, quando foram vendidos em separado. Até que, percorrendo um longo caminho, chegam à enorme plantação do poderoso e cruel Calvin Candie (Leonardo Di Caprio), rico herdeiro à custa de trabalho escravo, em cuja plantação vive a rapariga. Porém, para que seja possível resgatá-la, quais Siegfried, eles terão de lutar, não apenas contra Candie e os seus capatazes, como também contra preconceitos profundamente enraizados, nomeadamente de onde menos esperariam, de um velho negro, submisso, mas manipulador do dono, numa breve mas marcante interpretação de Samuel L. Jackson.

Escrito e realizado por Tarantino, o filme é uma torrente de situações inesperadas, com um ritmo alucinante, entrecortado aqui e ali por alguns gags, como seja a cena caricata dos percursores do Klu Klux Klan, parodiados, no sentido exacto do termo, até à morte, à volta com os capuzes brancos com os buracos para os olhos a não lhes deixarem ver nada. Como de antologia é também o cameo de Franco Nero, que ao perguntar a Jamie Foxx, como se chama este responde "Django, mas com o D mudo", ao que Franco Nero responde, uma vez que o personagem original era seu, com um simples "Eu sei!". Nada a acrescentar. Sabendo-se da paixão de Tarantino pelo cinema, desde que trabalhou num clube de vídeo, vendo avidamente, entre outros, os western de Sergio Leone, não admira pois que nos seus filmes perpassem claras citações de velhos clássicos e de géneros apelidados de menores, como seja neste caso os spaghetti western!

Até à próxima e bons filmes!

Luís Dinis da Rosa
 
 
Edição Digital - (Clicar e ler)
 
 
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