1ª Coluna

Cortar a direito e o direito de cortar

João CarregaAs instituições de ensino portuguesas, em especial as universitárias e politécnicas, enfrentarão no próximo ano o mais difícil das últimas duas décadas. Com os orçamentos reduzidos significativamente, com parte das receitas próprias a serem cativas pelo Estado, e com o dever de continuarem a qualificar o maior número de cidadãos portugueses, a tarefa não será fácil.

Universidades e Politécnicos já referiram, por mais que uma vez, que estão solidários com a crise económica que o país atravessa. O problema é que os últimos anos já foram vividos em crise e, para 2012, exige-se às instituições de ensino e a toda a sociedade mais sacrifícios, alguns dos quais brutais que dificilmente contribuirão para movimentar a economia ou dar esperança a quem também é solidário com o combate à crise do país.

Muitas crises são aproveitadas como oportunidades e como instrumentos de mudanças. O perigo das decisões tomadas sob o efeito 'ante-traumático' de uma recessão ou de uma forte crise financeira, é o de se cortar a direito com o facto da crise garantir a quem governa o direito de cortar. Significa isto que qualquer decisão que venha a ser tomada no âmbito da reorganização da rede de ensino superior (não só no que respeita a instituições, mas também às vagas disponibilizadas nos mais variados cursos) deve ser tomada com conhecimento profundo da realidade do País.

Hoje, e ninguém terá dúvidas disso, pode afirmar-se que as assimetrias entre o litoral e o interior são menores porque foram criadas instituições públicas de ensino superior na faixa entre Trás-os-Montes e Alto Douro e o Algarve. Foram essas instituições que tornaram o país mais habilitado, que garantiram o acesso a esse ensino qualificado a milhares de jovens que de outra forma não teriam posses económicas para prosseguir os seus estudos. São essas instituições que conseguem criar sinergias com a sociedade civil e as empresas, que criam massa crítica nas suas regiões. São elas que fixam pessoas (directa ou indirectamente) no interior e que evitam que milhares de jovens e famílias se transfiram para as já sobrelotadas principais cidades do país.

Cortar a direito em tempo de crise com a justificação de que é preciso poupar e que com menos instituições o país ficará mais saudável até pode ser bem visto pela generalidade dos portugueses. Mas é um erro de dimensão medonha e de resultados desastrosos para Portugal. Até porque uma parte significativa das instituições não dão prejuízo ao Estado, ao contrário do que sucede com muitas das parcerias público-privadas e empresas do Estado.

Encerrar instituições significa voltarmos ao passado onde só pode estudar quem tem dinheiro. Não é assim que funciona o mundo nem a Europa e não é assim que os portugueses querem que funcione o nosso país. Portugal só será competitivo se tiver a sua população qualificada. Não há outro caminho. O Ministro da Educação e da Ciência sabe disso, como sabe, melhor que ninguém, da importância das parcerias que se venham a estabelecer entre as diferentes instituições de ensino. E essa sim poderá ser uma solução benéfica para todos.

Mas numa altura em que há menos candidatos ao ensino superior, há que intervir também na questão das vagas e dos cursos. Também aqui terá que haver coragem política para que as universidades e os politécnicos se assumam como verdadeiros baluartes da coesão territorial...

 
 
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