Isabel Stilwell
“As mulheres são difíceis de entender”
Escritora e jornalista, Isabel Stilwell é autora de
três romances históricos de sucesso, sobre três rainhas de
Portugal, publicou vários romances infantis, alguns escritos em
parceria com os filhos, e um Guia para Ficar a Saber ainda Menos
sobre as Mulheres. É directora do Jornal Destak, foi directora da
Revista Notícias Magazine e sempre colaborou com a imprensa
escrita. Em entrevista, por email, fala da paixão pelos romances
históricos e do programa de rádio Dias do Avesso, na Antena 1. A
dividir a autoria e a apresentação de Dias do Avesso, com o
psicólogo Eduardo Sá, é também do avesso que analisa as
relação entre homens e mulheres, os desafios que o jornalismo
enfrenta e os livros.
É autora dos romances históricos "D.
Amélia"; "Filipa de Lencastre";"Catarina de Bragança", chancela da
Esfera dos Livros, e uma apaixonada confessa por este género
literário. Em que ponto da sua história pessoal se começa a traçar
esta paixão?
Aconteceu
por acaso. Não o gosto por ler romances históricos, que esse vem da
adolescência, mas a coragem de escrever um romance histórico. São
as coisas que mais admiramos, as que menos nos atrevemos a fazer, e
nunca me tinha passado pela cabeça que fosse capaz de uma aventura
destas, mas um dia fui a uma reunião na Esfera dos Livros e à saída
vi na prateleira biografias dos nossos reis escritas por
"estrangeiros", espanhóis, franceses, ingleses, e protestei "Era o
que faltava entregarmos assim o nosso património de bandeja. Eu
escrevo um...". Os editores mandaram-me sentar de novo, e ali mesmo
decidimos que ia tentar. O nome de Filipa de Lencastre surgiu logo
ali, porque às vezes o impulso é mais acertado do que muita
reflexão - depois quando pensei no que acabava de dizer
(coisa que me acontece muitas vezes...), percebi que fazia todo o
sentido: Filipa de Lencastre é a única rainha de Portugal que
nasceu inglesa, e tal como a minha mãe vinha de Lancashire, veio
para Portugal para casar, e teve oito
filhos...
As mulheres da História de Portugal têm
sido as grandes protagonistas das histórias dos seus livros. Porque
escreve sobretudo sobre mulheres?
Tendo começado pela única
rainha inglesa que Portugal teve, fazia sentido (e a sugestão foi
do Bispo do Porto, o senhor D. Manuel Clemente), escrever sobre a
única rainha portuguesa que Inglaterra conheceu. Em seguida, fazia
cem anos do fim da Monarquia e fazia todo o sentido escrever sobre
a última rainha de Portugal. Um dia hei-de escrever sobre um homem,
embora reconheça que deve ser mais fácil compreender a cabeça das
mulheres...
Divide com o Psicólogo Eduardo Sá o
programa de rádio da Antena1,"Dias do Avesso". Qual é o balanço que
faz do programa?
Acabámos de editar um livro
com os programas escolhidos entre os primeiros mil programas, e o
balanço é mais do que positivo. Como nos disse um dia um ouvinte,
os pontos de Arraiolos e outros vêem-se se estão bem feito, se
estão direitos, quando se vira a peça do avesso. Acho que o Eduardo
Sá consegue virar as coisas do avesso, como nunca as vimos, para
confirmarmos como devem ser de facto... Além do mais, cada programa
dá-me um prazer infinito, porque o Eduardo diz mata, e eu digo
esfola, num espaço de imensa liberdade, que só é possível graças à
aposta que a Antena 1 tem feito em nós.
É a autora do livro "Guia para Ficar a
Saber Ainda Menos Sobre as Mulheres". As mulheres são mesmo
difíceis de entender?
Claro que são, por isso é que
são tão interessantes! Nem que seja porque não há duas iguais,
embora se consiga encontrar - para as coisas importantes, um mínimo
denominador comum. Mais do que genético, é certamente resultado de
uma educação onde o príncipe montado num cavalo branco continua a
prevalecer...
Na sua opinião, qual é o melhor conselho
que se pode dar a um homem, quando o assunto são as
mulheres?
Surpreende-la. O cérebro
humano é muito inteligente e não gosta de repetições. Um homem que
não é capaz de adivinhar os desejos de uma mulher, e antecipar-se a
eles, está condenado... senão à morte, pelo menos ao tédio. É muito
fácil que os homens (e as mulheres) se tornem preguiçosos nas
relações, achando que no dia em que juntaram os trapinhos tudo
ficou definitivamente arrumado. Enganam-se, e se dormirem na forma,
em breve estarão a dormir noutro lado, porque elas vão acabar por
lhes por as malas à porta. Mas acredito nas relações para sempre,
como nos contos de fadas, desde que ninguém ache que elas são para
sempre, e lute por elas todos os dias.
Escreveu livros infantis em co-autoria
com os seus filhos. Como é escrever a duas
mãos?
Escrevemos a duas e a três
mãos, porque As Histórias para Contar em Minuto e Meio, foram
escritas por mim, pelo Francisco e pela Madalena - e já vão no III
volume. A primeira experiência foi, de facto, só com a Ana, e
muito, muito divertida. Uma conta brutal de telefone foi o ponto de
partida do primeiro, Diário de uma Mãe, Diário de uma Filha, em que
analisamos várias questões do ponto de vista de uma mãe e de uma
adolescente (a Ana tinha então 14 anos). Foi um projecto comum, que
se repetiu num livro seguinte, É Meia Noite, Não Chove e Ela ainda
Não Está em Casa, em que eu era a mãe e ela a voz dos filhos - uma
mãe que reivindicava férias e décimo terceiro mês (era antes da
Troika!).
A sua infância encaminhou-a no sentido
dos livros?
Tenho a certeza de que sim. A
minha mãe lia-me muito, os meus irmãos liam-me imenso, e até quando
já estava na faculdade, o meu irmão Peter leu-me os três volumes do
Senhor dos Anéis. Não há nada melhor do que um bom livro, e
descobri-o muito cedo, e espero nunca me esquecer... .
O que é que um romance tem de ser, para
ser um bom romance?
Um romance histórico? Tem que
ter história, emoção, intriga, respeitando sempre uma grelha de
fundo de verdade. Aproxima-nos do nosso passado, que se torna vivo,
e não uma lição da escola, em que os personagens são mitos, santos
que não saem do altar, e que por isso mesmo parecem não ter nada a
ver connosco. Num romance histórico, os costumes e os hábitos podem
ser muito diferentes dos nossos, mas a essência humana dos
personagens permanece imutável. São esse personagens que ficam
connosco.
Quais são os grandes desafios que o
jornalismo enfrenta actualmente?
Recursos económicos. Uma
comunicação social livre precisa de ser economicamente saudável,
porque se não o for é muito permeável a pressões exteriores. Quando
um produto de media é credível, os leitores reconhecem-no logo, e
dão-lhe a sua confiança. Ao saber que um produto tem a confiança
dos leitores e chega até eles, torna-se atractivo para os
anunciantes, que querem veicular a sua informação - informação,
note-se, que é importante para o leitor, e que desde que
devidamente assinalada como publicidade só pode ser uma mais valia.
Ao pagar para anunciar um meio de comunicação torna-se
economicamente equilibrado, e tem mais condições para manter a sua
independência, para investigar mais, para ser capaz de denunciar
mais coisas, e lutar por mais causas. À primeira vista pode parecer
complicado, mas não é. Esta crise não ajuda os meios de comunicação
social, mas a grande maioria dos jornalistas mantém a coluna
vertebral e fazem um bom trabalho. Ah, só mais uma coisa, quando as
pessoas apontam o dedo a este ou aquele programa, a este ou aquele
jornal, fingindo-se muito escandalizadas com o seu conteúdo
medíocre, esquecem-se que se não virem, se não comprarem, acabam
rapidamente, ou seja são em grande parte responsáveis pela sua
existência.
Qual seria o acontecimento que gostaria
de poder noticiar, por estes
dias?
Todos os acontecimentos que
revelassem que as pessoas encontraram saídas para a crise. Ideias,
projectos, estilos de vida que nasceram das dificuldades que todos
atravessamos, e que provam que termos menos não significa ficarmos
de braços cruzados, à espera que o Estado, o governo, as
instituições tomem conta de nós. Queria noticiar, também, todos os
projectos de solidariedade que revelam que há gente fabulosa, capaz
de passar por cima dos seus medos e do seu conforto, para ajudarem
os outros. Todos os dias fico espantada com a generosidade e a
coragem de tanta gente.
Já se pode falar num próximo
livro?
Espero ter um romance
histórico nas livrarias no próximo ano. Quanto ao resto, é
segredo...
Carlos Ramos / Verso da Kapa