Opinião

Educação
Educação: das opiniões às políticas

drodrigues[1].jpgA Educação é um sector transversal da sociedade; isto é, todas as pessoas já estiveram ou vão estar na sua vida a ela ligadas ou como alunos, pais, familiares, professores, formadores, etc.  É pois natural que seja um dos sectores sociais onde mais opiniões são quotidianamente emitidas. À semelhança da Saúde (e do futebol…) quase todas as pessoas se sentem habilitadas para opinar e dizer que "se fosse eu" faria isto ou aquilo, ou então que "o grande problema da Educação é…".  Quem trabalha em Educação deve sentir-se valorizado por colaborar num sector que tem tamanha relevância social e que se desenrola tão perto da vida de tanta gente.

Actualmente temos como responsável do Ministério da Educação uma personalidade que sempre tornou claro o seu pensamento sobre a Educação. O ministro Nuno Crato, ainda antes de o ser, tornou-se uma referência na discussão sobre Educação no nosso país. E a sua relevância foi tanto maior quanto as suas opiniões foram pobremente debatidas pela comunidade da Educação. A resposta às suas opiniões, frequentemente polémicas, e propostas de acção foi inexistente ou muito débil (apesar dele se queixar que perdia amigos quando opinava sobre Educação).  E dou dois exemplos evidentes: quando se referiu ao "eduquês" que se fala nos departamentos de ensino superior obteve uma débil resposta destes departamentos e quando em Aveiro nas jornadas do PSD disse que era preciso acabar com o Ministério da Educação a reacção foi meramente informativa e não de debate.

Temos assim um ministro da Educação que, de uma forma frontal, assumiu um conjunto de posições sobre "o estado da Educação" que talvez não tenha paralelo na nossa história recente.  Estávamos habituados a conhecer as opiniões dos ministros da Educação depois de eles serem nomeados e através de sibilinas interpretações dos seus discursos.  Não é o caso e, neste aspecto, honra lhe seja feita.

Mas (ah os "mas"…) o que é uma aparente vantagem pode (sublinho, pode) acarretar alguns inconvenientes. O facto do actual ministro ser tão opinativo sobre as Ciências da Educação, sobre a avaliação, sobre os programas, sobre os exames, sobre a didáctica das escolas, sobre o uso da calculadora, etc. etc., poderá, talvez, implicar alguns contratempos.  E citaria dois:

1.As opiniões tão claras e afirmativas sobre todos estes assuntos podem diminuir a margem de manobra que o ministro tem para conduzir as políticas educativas. Senão vejamos um exemplo: se ao considerar o programa de Português desadequado (ver "Pùblico" de 7.8.2011) qual a discussão possível com os especialistas de desenvolvimento curricular da Língua Portuguesa e de Linguística? O facto do ministro poder trabalhar na sua qualidade de político não especialista com os especialistas na matéria talvez ficasse mais facilitado se ele não se tivesse pronunciado tão categoricamente sobre os programas.

2. Por outro lado, é óbvio que as opiniões devem influenciar a política mas parece também aceitável que a política é muito mais do que o plasmar das opiniões de um governante em directivas e decretos-lei. Tem sido recorrente a opinião de políticos que depois de saírem da governação afirmam que muitas coisas se passaram e ficaram incólumes independentemente da sua opinião.

Estamos pois na expectativa da forma como se irá passar a transição da opinião para a política em Educação. Ao contrário de muitos, não espero que a "máquina do Ministério" submerja o pensamento do ministro, do partido e governo que o apoiam: mas também não espero que o Ministro se sinta de tal forma fidelizado às opiniões que teve como comentador que isso possa diminuir a sua capacidade de diálogo, de negociação e de influência num sistema em que a resposta nunca é rápida mas tem de ser clara e geradora de consensos.

Todas as indicações que temos tido sobre o bom senso e compromisso do ministro indicam que ele não deixará de fazer uma distinção clara entre o que é a sua opinião e o que é mais necessário e essencial ser feito para melhorar a qualidade que todos almejamos para o nosso sistema educativo. O conjunto de estruturas que podem apoiar, informar e fundamentar decisões essenciais no campo da Educação (Comissão de Educação da Assembleia da República, Conselho Nacional de Educação, comunidade científica, associações, sindicatos, etc.) aí estarão para, juntamente como o ministro Nuno Crato encontrar as soluções mais criativas e sólidas para a Educação portuguesa continue a ser um dos sectores em que, nas últimas décadas, foi possível fazer maiores progressos no nosso país.

David Rodrigues
Professor Universitário/ Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
 
 
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